O portal Memórias da Ditadura é um espaço de divulgação e troca de propostas didáticas desenvolvidas pelos professores sobre o regime militar no Brasil. Sabemos que os professores têm desenvolvido propostas interessantes nesse sentido.
Compartilhe aqui seu trabalho e estimule outros professores a trabalhar de forma significativa esse período tão importante da nossa História e que tem tantas relações com os dias atuais. Para tanto, preencha o formulário a seguir com o detalhamento da proposta realizada com os alunos.
Os festivais da canção (1965-1972)
Pode-se dizer que o nascimento da MPB passou pelos festivais de música, promovidos por emissoras de TV, como a Record e a Globo, de 1965 a 1972. Em vez de chegar ao público pelo rádio, a música entrava na casa das pessoas pela televisão e só depois pelo disco. Os festivais acabaram se transformando em palco político. Com o surgimento da Tropicália e o uso de metáforas para protestar contra o regime, a censura passou a controlar os festivais, que eram parte importante do entretenimento durante o período. Informalmente foi criada a categoria dos “campeões verdadeiros” e os “morais”, aqueles cujas músicas viraram hinos sem ter vencido.
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As telenovelas – entre o melodrama e a crítica social
A telenovela diária surgiu em 1963 como uma forma de entretenimento da televisão brasileira. Mas, no início, ela pegou emprestados elementos da radionovela, e as atuações eram muito teatrais. Foi em 1968, com Beto Rockfeller na TV Tupi, que se iniciou a era “moderna” da telenovela. Foi a primeira a utilizar a realidade social como matéria inspiradora. Os personagens usavam gírias e evitavam a impostação teatral das falas.
Em 1970, a TV Globo assumiu o gênero e apostou em algumas inovações técnicas e dramáticas, com o sucesso de Irmãos Coragem, de Janete Clair, a primeira novela brasileira a ser gravada em cidade cenográfica. Elas passaram a ser vistas pelos militares como um meio para formar a opinião pública. A audiência chegava a quase 80% dos televisores.
Com o crescimento da TV como veículo de massa, os textos também passaram a ser censurados. Apesar de serem marcadas pelo melodrama, as novelas acabavam veiculando os conflitos sociais e de classe, ainda que de maneira escondida. Havia também outros formatos de teledramaturgia, mais elaborados, como os Casos Especiais, escritos por Oduvaldo Vianna Filho, o Vianinha, importante dramaturgo comunista que trabalhou na TV Globo.
O Jornal Nacional estreou em setembro de 1969, com a função de servir à chamada “integração nacional”, nome dado pelos militares ao objetivo político de criar uma rede de comunicação e transportes em nível nacional. Foi o primeiro telejornal transmitido ao vivo em rede. O tom formal e frio, com informações que interessavam diretamente ao regime, deu ao jornal o apelido de “porta-voz da ditadura”. Todos os textos e reportagens gravadas passavam pelos fiscais da censura. Nenhuma notícia considerada agressiva à ditadura ia ao ar.
João Figueiredo e Roberto Marinho
Do outro lado, o jornalismo da Band era considerado progressista para a época. A emissora, inaugurada com equipamentos modernos em 1967, investia numa grade sem comerciais e com debates políticos. Nos anos 1970, seu jornalismo se destacou, sobretudo na cobertura de eventos internacionais. A emissora também apresentou musicais com grandes nomes da MPB de esquerda, como Chico Buarque, Elis Regina e Milton Nascimento.
Outras referências importantes no jornalismo crítico foram o Globo Shell Especial, que posteriormente mudou de nome para Globo Repórter, e o jornalismo praticado pela TV Cultura. As reportagens nesses programas eram focadas nos problemas sociais e nos contrastes e desigualdades que o desenvolvimento econômico criava.
Os anúncios e slogans da ditadura militar eram propagados pela televisão. A dupla Dom & Ravel, criou a música “Eu Te Amo, Meu Brasil” e era comum tocarem hinos ufanistas, como “Este é um país que vai pra frente” do grupo Os Incríveis. Slogans como “Brasil: Ame-o ou deixe-o!”, “Brasil: Ame-o”, e “Quem não vive para servir ao Brasil, não serve para viver no Brasil”, eram propagados através de objetos e em adesivos nas janelas dos automóveis. Ao vencer o tricampeonato mundial de futebol, em junho 1970, no México, o Brasil assistiu a uma das maiores campanhas publicitárias de massa de sua história. No tricampeonato brasileiro, surgiu o hino “Pra Frente Brasil”, de autoria de Miguel Gustavo, usado até hoje.
A concessão da TVS foi dada a Silvio Santos durante o governo Figueiredo. Logo depois, o apresentador criou um programa para divulgar os feitos do governo. O miniprograma A Semana do Presidente foi transmitido por mais de vinte anos, mostrando os eventos aos quais o presidente havia comparecido nos dias precedentes. Era uma espécie de boletim de divulgação dos atos do governo, custeado pelo Estado. No regime militar, foi usado como mais um recurso para estimular o ufanismo e aumentar a popularidade do governo.
Os programas populares de auditório: Chacrinha, Silvio Santos e Flávio Cavalcanti
Esses programas, que a princípio eram regionais, tiveram um crescimento durante o regime militar e passaram a ser retransmitidos em rede nacional. Os apresentadores ocupavam um papel importante no entretenimento televisivo. Para se ter uma ideia dessa abrangência, o programa Silvio Santos, por exemplo, chegou a ter oito horas de duração, em 1968, e pico de 40,4% de audiência, em 1969, equiparando-se à transmissão da chegada do homem à Lua, que teve 41,4%. Os apresentadores eram vigiados de perto pelos censores e raramente temas políticos entravam em cena.
Entre 1989 e 1990, a transmissão do Jornal Nacional na TV Globo foi invadida diversas vezes pela transmissão de um grupo de resistência de esquerda, cujos nomes ainda estão em segredo até hoje. A chamada “TV Pirata” protestava contra o poder da empresa de Roberto Marinho. Eram mostradas imagens do empresário, e no off, uma voz falava sobre resistência. Em um dos programas, eles ensinavam os procedimentos para montar uma rádio livre. As ações tinham 15 minutos, o tempo necessário para o sinal não ser rastreado.
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Amaral Netto, o repórter
Deputado por oito vezes, Amaral Netto foi apresentador de um programa na TV Globo que exaltava o regime militar. O programa de documentários apresentava em tom ufanista grandes obras, como a hidrelétrica de Itaipu e a rodovia Transamazônica, e ainda mostrava regiões longínquas, exaltando o folclore dos lugares. Era o programa mais oficial da ditadura que existia na TV brasileira.
A TV foi a arma utilizada pelo governo militar para alcançar a integração nacional, e ela se valeu desse poder para se desenvolver. Aliada estratégica, a Rede Globo desempenharia um papel fundamental na consolidação do regime no Brasil. Entre 1965 e 1982, o grupo de Roberto Marinho passou de detentor de uma única concessão de televisão, no Rio de Janeiro, à condição de quarta maior rede de TV do mundo. Isso foi possível com a ajuda do governo militar, que fez vista grossa à entrada de capital estrangeiro na empresa, o que era proibido por lei. O acordo com o grupo Time Life possibilitou uma ajuda financeira importante para a criação do modelo Globo de programação e a definição da estética televisiva do país.
Em 1969, a Globo se tornou pioneira na transmissão via satélite do lançamento da nave espacial Apollo IX. Em julho, transmitiu a chegada do homem à Lua (missão Apollo XI), devido ao desenvolvimento tecnológico da Embratel, que vendeu o link à emissora. Esse acontecimento teve uma audiência de 41% dos televisores ligados.
De 1971 a 1973, a TV Globo adaptou os equipamentos e treinou os técnicos para a utilização de cor na imagem. O padrão visual se diferenciou das outras emissoras, apresentando logotipos e belas paisagens do país, distanciando-se da realidade de miséria em alguns estados. O investimento para “colorir” as imagens era oneroso para as outras emissoras, o que deixou a Globo de novo à frente.
A primeira transmissão a cores aconteceu em 1972, na Festa da Uva de Caxias do Sul, pela TV Globo. Porém levou anos até que toda a programação da emissora chegasse a ser colorida. A Bandeirantes foi a única que acompanhou a Globo nesse sentido. A Globo se consolidou como líder nacional, no início dos anos 1970, com 36 filiadas e centenas de estações retransmissoras pelo país, com apenas sete anos de vida.
Matéria do Jornal do Brasil sobre a transmissão a cores
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Em 1966 foram decretadas as normas da censura na TV pelo Departamento Federal de Segurança Pública. Nessa época, já existiam 2,3 milhões de aparelhos televisivos no país. Um dos episódios mais marcantes foi a proibição da exibição da peça “Romeu e Julieta”, encenada pelo Ballet Bolshoi, que seria transmitida pela TV Globo em 1976. O ministro da Justiça do governo Geisel, Armando Falcão, afirmou que o Bolshoi, por ser uma companhia russa, e a Rússia fazer parte da União Soviética, poderia apresentar uma leitura comunista da tragédia de Shakespeare e proibiu a transmissão que já havia sido anunciada.
A Fundação Padre Anchieta, do governo do Estado de São Paulo, foi criada em 1968 para gerenciar a TV Cultura, comprada de Assis Chateaubriand. Em 1969, entrou no ar a emissora pública, com o objetivo de aprimoramento educativo e cultural dos telespectadores, com jornalismo de qualidade e programas que não buscavam conseguir audiência a qualquer custo.
Inicialmente com quatro horas diárias de programação, a TV Cultura já preenchia os requisitos de emissora pública educativa, exibindo teleaulas, documentários, e peças de teatro. No mesmo ano, entrou no ar um programa visto como vanguarda até para os dias de hoje: uma espécie de “terapia em grupo” de jovens na televisão, apresentado pelo psiquiatra Paulo Gaudencio. O Jovem Urgente discutia o desenvolvimento sexual e foi proibido pelo governo militar.
O noticiário da TV Cultura buscava explicações mais abrangentes sobre problemas do cotidiano e mostrava a realidade social brasileira. Em 1975, o diretor de jornalismo Vladimir Herzog foi preso. Os militares iriam interrogá-lo por fazer parte do Partido Comunista. Logo depois, divulgaram que Herzog teria se suicidado na cadeia, fato que levou anos para ser corrigido: ele foi torturado e morto pelos militares.
Paulo Gaudêncio apresenta o Jovem Urgente
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Após dez anos no ar, a TV Excelsior fechou as portas em 1970. A emissora fez modificações preciosas para a nova linguagem da TV, além de oferecer altos salários. Inovou com a programação horizontal, ou seja, a repetição do mesmo programa no mesmo horário em dias diferentes, e a vertical, com uma sequência de programas pensada para que o telespectador não mudasse de canal.
Foi também importante na resistência ao manter no ar o Jornal de Vanguarda, rompendo com a linguagem tradicional e introduzindo vários locutores e comentaristas no estúdio – e até bonecos – rompendo com o insosso jornalismo televisivo da época. O jornal sucumbiu ao AI-5 e a emissora desapareceu dois anos depois. Em 1970, depois de sofrer um incêndio, o governo aproveitou a fase difícil da emissora e cassou a concessão.
A TV Tupi teve a concessão cassada pelo governo militar em julho de 1980. Os motivos variaram para cada uma das afiliadas, mas foram apontados problemas financeiros e administrativos, e dívidas com a Previdência Social, como justificativas principais. Foi o então presidente Figueiredo quem assinou o decreto que extinguiu a primeira emissora de televisão da América Latina, do empresário Assis Chateaubriand, criador dos Diários Associados.
A concessão foi repartida entre Silvio Santos (SBT) e Adolfo Bloch (Manchete). O SBT deslanchou graças aos empreendimentos paralelos desenvolvidos com o apoio da TV, como a realização de concursos e jogos. A Manchete repetiu o destino da Tupi: apesar de ter tido algum sucesso em telenovelas e minisséries, como Pantanal e Dona Beija, acabou afogada em suas próprias deficiências administrativas, e se viu incapaz de enfrentar a Globo pelas fatias do mercado publicitário.
O Repórter Esso foi o primeiro noticiário de radiojornalismo do Brasil que não se limitava a ler as notícias recortadas dos jornais, já que as matérias eram enviadas por uma agência internacional de notícias dos Estados Unidos. A primeira transmissão ocorreu na Rádio Nacional do Rio de Janeiro, em 28 de agosto de 1941, iniciando a cobertura do Brasil na Segunda Guerra Mundial. Foi nesse programa que o deputado Rubens Paiva fez o famoso discurso contra o golpe, no dia 1º de abril de 1964. O último programa no rádio foi em 1968.
O governo militar criou um programa de ensino à distância chamado Projeto Minerva. O programa entrou no ar pela primeira vez no dia 4 de outubro de 1970. O objetivo era solucionar os problemas educacionais com a implantação de uma cadeia de rádio e televisão educativas para a massa, utilizando métodos e instrumentos não convencionais de ensino. Como tudo era controlado, o governo determinou horários obrigatórios para a transmissão de programas educativos. Os programas pretendiam preparar alunos para os exames supletivos de Capacitação Ginasial e Madureza Ginasial, estudantes que não tinham condições de frequentar um curso preparatório. O Projeto Minerva foi mantido até o início dos anos 1980, apesar das severas críticas e do baixo índice de aprovação – 77% dos inscritos não conseguiram obter o diploma.
Até a década de 1960, algumas rádios ainda faziam radionovelas, conseguindo resistir até os primeiros anos de 1970, quando o gênero acabou de vez. O crescimento da televisão e a migração da verba publicitária explica em parte o abandono do gênero. Grande parte dos atores famosos das radionovelas, como Mário Lago e Paulo Gracindo, migraram para a TV. De 1956 a 1969, ficaram famosas novelas criadas por Janete Clair como Perdão Meu Filho, Vende-se um Véu de Noiva, Amar Até Morrer e Irmãos Coragem. Muitos escritores de radionovelas, como Dias Gomes e Oduvaldo Vianna, eram ligados ao Partido Comunista Brasileiro.
Marco no radiojornalismo paulista nos anos 1960 e 1970, Vicente Leporace criou e apresentou o programa O Trabuco durante 16 anos na Rádio Bandeirantes. O formato consistia na leitura diária das notícias veiculadas nos principais periódicos do país, seguidas de comentários e críticas sobre elas. O teor dessas observações era sempre ácido e com acentuado conteúdo cômico. O radialista deixava claro, que os comentários e críticas eram de sua inteira responsabilidade, o que acabou por torná-lo um sujeito popular e com forte postura de defensor das classes menos favorecidas.
Criado no governo de Getúlio Vargas com o nome de Programa Nacional, foi ao ar pela primeira vez em 1934. Em 1938, ganhou o nome de Hora do Brasil e se tornou obrigatório para todas as rádios das 19 às 20 horas. Em 1971, por determinação do presidente Médici, o nome mudou para A Voz do Brasil. No ar até hoje, o programa de uma hora destaca as atividades da presidência da república, do legislativo e do Tribunal de Contas da União (TCU). Durante o período militar foi mais um programa que destacava as grandes obras e a ideia de “milagre econômico”, colaborando para o marketing do regime.
O programa, que ficou no ar entre 1955 e 1974, se dedicava a dramatizar os crimes publicados pelos jornais no dia anterior. O radioteatro tinha narração de Leonardo de Castro. No elenco, merecem destaque também Muíbo César Cury e Ronaldo Baptista. No campo policial, repórteres especializados se encarregavam de narrar histórias de crimes. Na própria Bandeirantes, José Gil Avilé, o Beija-Flor, foi pioneiro no estilo.
Criada em 1962, a Rádio Marconi de São Paulo era conhecida como a rádio dos trabalhadores. A partir de 1964, priorizou o jornalismo, com duras críticas ao regime militar. O radiojornalista Orpheu Salles foi preso no primeiro dia do golpe. Frequentemente os agentes do Dentel invadiam o estúdio, detinham os funcionários e deixavam a rádio fora do ar, até que os donos conseguissem uma liminar para voltar a operar. A partir de 1968 deixou de fazer críticas ao governo e à polícia e, em 1973, foi lacrada pelo governo Médici. Foi nela que, em 1968, o jovem repórter Gil Gomes narrou um caso de agressão sexual no edifício da rádio e descobriu assim sua vocação para o jornalismo policial. Nesse dia, a rádio teve audiência recorde.
Sucessor de O Trabuco, o jornal manteve a cobertura combativa frente à ditadura. À época das greves sindicais, a rádio Bandeirantes era a única que transmitia o então líder sindical Lula ao vivo. As outras não se arriscavam, apresentavam apenas entrevistas gravadas. Foi ainda um marco do jornalismo radiofônico opinativo e um dos programas de maior longevidade do rádio brasileiro.
O programa humorístico, ancorado por Wilton Franco, estreou em 1950, na Rádio Nacional, e ali permaneceu até 1967. Ele apresentava os quadros humorísticos, supostamente passados nos apartamentos de um edifício residencial fictício, onde moravam as personagens. Tinha no elenco os atores Paulo Gracindo, Lúcio Mauro, entre outros.
Com o nascimento das rádios FM no Brasil, foi criada a era dos disc-jockeys, ou seja, dos locutores que cativavam a população e tocavam música. Um dos exemplos mais marcantes da época é o carioca Big Boy, que adiantou o movimento ainda na rádio AM, a Mundial (que se tornaria a rádio de maior audiência entre o público jovem). Seu “hellocrazypeople!”, a maneira irreverente como saudava os ouvintes, tornou-se marca registrada de um estilo próprio, descontraído, diferente da voz impostada dos locutores de então. Nos bailes “da pesada”, promovidos em diversos lugares da cidade, como o Canecão e clubes do subúrbio, Big Boy apresentava as principais novidades da música pop. Nos anos 1970, ele ajudou a divulgar para o público brasileiro a explosão da black music e do funk no exterior.
João Goulart e o comício na Central do Brasil (13 de março de 1964)
Desde a renúncia de Jânio Quadros, o Brasil vivia um momento político tenso. O mandato de João Goulart mexeu em interesses da elite, ao trazer à pauta questões como a reforma agrária e o petróleo brasileiro. Durante o comício, que reuniu 150 mil pessoas no Rio de Janeiro, o presidente assinou decretos declarando sujeitas à desapropriação as propriedades subutilizadas. Falou-se ainda em reforma urbana e ficou determinada a tomada de refinarias de petróleo em favor da Petrobrás. Assuntos que faziam arrepiar as classes média e alta brasileiras. O cenário para o golpe estava montado. O comício foi transmitido pelo rádio – ainda na época o principal veículo de comunicação nacional – e pela TV.
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O golpe – Carlos Lacerda
O general Mourão Filho partiu de Juiz de Fora com tanques rumo ao Rio de Janeiro. Soldados tomaram as ruas e prenderam políticos, sindicalistas e estudantes. O então governador do Estado da Guanabara, Carlos Lacerda, um dos líderes civis do golpe militar de 1964 se refugiou no Palácio da Guanabara e transmitiu via rádio um possível golpe comunista, exatamente o contrário do que acontecia. Nesse áudio ele fala que os brasileiros precisavam libertar o país da ameaça comunista, ajudando, assim, a criar o pano de fundo para o golpe militar.
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O discurso de Rubens Paiva
Na madrugada do dia 1º de abril de 1964 (com o golpe militar em andamento desde o dia anterior), Rubens Paiva, deputado federal por São Paulo, fez um apelo ao vivo pela Rádio Nacional, em defesa da legalidade do presidente João Goulart. O discurso se tornou histórico pela coragem do deputado de criticar abertamente o golpe em andamento.
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Quando assumiu, o governo militar usou o poder de cassação de concessões em benefício do regime. A Rádio Nacional e a Mayrink Veiga, do Rio de Janeiro, foram as primeiras a sofrer com as mudanças. A primeira foi ocupada por militares um dia após o golpe e 36 de seus funcionários foram demitidos. A Mayrink Veiga saiu do ar por três semanas, voltou por alguns meses com posição política totalmente alterada, até ter a concessão retirada definitivamente em novembro do mesmo ano. Algumas rádios católicas como a 9 de Julho, de São Paulo, também foram lacradas.
Tomada da Rádio Nacional e leitura de manifesto de Carlos Marighella
Às oito e meia da manhã, no dia 15 de agosto de 1969, um destacamento de doze guerrilheiros da Ação Libertadora Nacional(ALN) invadiu a estação transmissora da Rádio Nacional, em Piraporinha, perto de Diadema (SP). O grupo interrompeu a ligação com o estúdio e transmitiu uma gravação em que Carlos Marighella lia um manifesto. Na meia hora em que a estação esteve sob o controle da ALN o manifesto foi lido mais de uma vez.
Os noticiários quase não veiculavam notícias sobre a guerrilha do Araguaia, uma das mais expressivas reações armadas contra o regime militar, organizada pelo Partido Comunista do Brasil (PC do B), no sul do Pará. Com todas as rádios do país e os demais meios de comunicação sob censura, as rádios paraenses e a população se mantinham informadas sobre a guerrilha através da Rádio Tirana, da Albânia. Os militares censuravam qualquer informação que pudesse passar a ideia de que os guerrilheiros estavam bem organizados e armados. Como eles roubavam bancos para comprar armas, a imprensa local não podia noticiar os assaltos a bancos. Depois, essas notícias foram liberadas, mas com uma condição: que não fosse divulgada a quantidade de dinheiro roubada. Os poucos repórteres do rádio que se atreveram a ir contra as ordens militares foram presos na região.
Em 1965, os militares criaram o sistema Embratel, que seria responsável pela modernização das telecomunicações, e, em 1976, o Sistema Radiobrás, que centralizava o controle das emissoras do governo federal em todo o país. O Ministério das Comunicações e a Delegacia Nacional de Telecomunicações (Dentel) liberaram milhares de canais de rádio e de televisão, a fim de possibilitar a formação de uma rede nacional de telecomunicações de alcance continental (com conteúdo pró-governo).
A rádio FM começou a operar no Brasil durante o governo militar, em 1970. Enquanto o radiojornalismo era estabelecido na rádio AM, a FM ficou conhecida por ter abrangência mais local. As rádios eram orientadas a tocar música, principalmente em inglês, para evitar problemas com a censura (que bania diversas músicas nacionais). A FM se expandiu, roubando audiência das emissoras AM, também devido à qualidade do som, mais apropriada para escutar música. Essas emissoras se tornaram veículos voltados ao entretenimento e ao lucrativo negócio musical, que patrocinava programas e emissoras.
A implementação de projetos de História de forma geral, mas especificamente do período da ditadura, integrada com a perspectiva da educação em direitos humanos, deve priorizar não apenas fatos, mas emoções e sentimentos. É preciso garantir que os estudantes se envolvam com as temáticas abordadas.
Por isso, o portal disponibiliza conteúdos em diferentes linguagens e documentos históricos, para que os estudantes não apenas absorvam informações, mas também adquiram suficiente espírito crítico para analisar textos, vídeos, áudios, imagens, obras de arte, no contexto em que foram produzidos. Também para que desenvolvam argumentos, estabelecendo relações entre as ideias e os eventos históricos, em um diálogo entre passado e presente, problematizando questões que, embora atuais, tenham surgido ou aconteçam em diferentes tempos históricos. E tudo isso não acontece se os estudantes não forem protagonistas de suas aprendizagens.
Assim, é importante que os diferentes projetos realizados em sala de aula proponham a produção dos alunos, envolvam tarefas de pesquisa e coloquem o jovem como protagonista de um conhecimento a ser produzido, ou seja, que ele investigue e construa posicionamentos sobre o tema com base nas fontes. O resultado dos trabalhos também pode ser divulgado no portal ou em blogs, abrindo diálogo com a comunidade extraescolar.
A seguir, algumas orientações sobre como encaminhar produções dos alunos:
Em 2014, completaram-se 50 anos do golpe civil-militar que instituiu um regime ditatorial no país. Esse período tem sido rememorado em diversos filmes, livros, documentários e atos para contestar as arbitrariedades da ditadura. O governo federal criou a Comissão Nacional da Verdade para apurar os crimes cometidos contra os opositores do regime.
Apesar de haver muitas iniciativas para recuperar a memória daquele período, o Brasil ainda desconhece muito dessa história. As novas gerações sabem pouco e muitas vezes de forma parcial sobre um período tão intenso e que deixou tantas marcas na vida de muitos brasileiros.
Se a população de forma geral não conhece sua história recente, a situação é ainda pior quando identificamos a precariedade com que o assunto é tratado na educação básica, que tem como responsabilidade garantir o estudo da História do Brasil para a formação da cidadania. Os livros didáticos, por melhores que sejam, são muito limitados como fonte de informação, abordam o assunto de forma superficial e só nas últimas páginas, quando geralmente não sobra mais tempo no ano letivo.
As escolas precisam e merecem ter acesso a um material de qualidade e completo sobre esse capítulo da história de nosso país. E é para isso mesmo que existe este portal!
A música popular como veículo de crítica e resistência às ditaduras militares não foi importante apenas no Brasil. Além de estarem ligadas aos movimentos de esquerda que defendiam mudanças na América Latina, a canção engajada foi um importante foco de resistência depois dos golpes de Estado. Genericamente conhecida como “nueva canción”, a canção engajada denunciava as mazelas sociais, mobilizava as paixões políticas, elogiava os heróis individuais e coletivos que lutaram (no passado longínquo) e ainda continuavam lutando nos idos dos anos 1960 e 1970 por uma nova realidade na América Latina.
A inspiração ideológica da “nueva canción” vinha tanto das lutas nacionalistas contra o imperialismo, quanto das lutas socialistas pela emancipação das classes populares, historicamente reprimidas e excluídas da vida política na maioria dos países latino-americanos. Ambos eram fortemente temperados pela busca de uma unidade cultural latino-americana, sonhada desde o século XIX, mas que entre os anos 1950 e 1970 do século XX, voltava a motivar os movimentos revolucionários que fervilharam pelo continente.
O nacionalismo anti-imperialista que se generalizou nos anos 1950, a Revolução Boliviana de 1952, a Revolução Cubana de 1959 e a experiência socialista chilena no começo dos anos 1970 foram os principais movimentos que inspiraram as novas canções. Os artistas engajados defendiam a busca de uma cultura “popular e autêntica” que fosse alternativa à massificação cultural do cinema e do rádio, e à entrada maciça de produtos culturais estadunidenses. Para os artistas e intelectuais que defendiam este projeto, o rico folclore das massas camponesas era uma das fontes de inspiração.
Mas não bastava se inspirar no folclore para entrar para o clube da “nueva canción”. A música comercial de vários países latino-americanos já se influenciava pelo folclore nacional desde meados dos anos 1950 e nem por isso era sinônimo de engajamento. As bases da “nueva canción” foram lançadas no momento em que o interesse pelo folclore se encontrou com uma nova postura política diante dos problemas e dilemas dos países latino-americanos, resultando em um projeto de dimensões estéticas e ideológicas bem delimitadas, ainda que muito plural em seus estilos e estéticas.
O ano de 1963 marca o início desse engajamento. Naquele ano, divulgou-se em Mendoza o “Manifiesto del Nuevo Cancionero”, que sistematizou as diretrizes da “nueva canción” argentina, enquanto, no Uruguai, era lançado o primeiro disco do uruguaio Daniel Viglietti, marco fonográfico da “canción protesta” latino-americana, como também seria conhecido aquele novo movimento cultural.
O “Manifiesto” foi escrito pelo poeta e radialista Armando Tejada Gomez, assinado por 14 artistas entre os quais Mercedes Sosa, que se tornaria a intérprete mais conhecida da canção engajada latino-americana. O texto dizia: “A busca por uma música nacional de conteúdo popular tem sido e é um dos mais caros objetivos do povo argentino”. Lançado dentro de um contexto de governo militar instaurado em 1962, com a deposição do presidente Arturo Frondizi, o “Manifiesto” aglutinou um sentimento nacionalista, libertário e de oposição às elites oligárquicas tradicionais, à medida que defendia a música popular como veículo de identidade cultural e política dos excluídos, valorizando regionalismos, promovendo a produção independente e resistindo à imitação musical de obras estrangeiras.
O Uruguai foi outro polo importante da “nueva canción”. Em 1963, seria lançado o disco “Canciones folklóricas y seis impresiones para canto y guitarra”, daquele que viria a ser o maior embaixador da música de protesto do Uruguai: o compositor, cantor e violonista Daniel Viglietti. Ao incluir no disco duas canções do argentino Atahualpa Yupanqui e um poema do cubano Nicolás Guillén, Viglietti contribuiu muito para a integração cultural das esquerdas latino-americanas, fazendo inclusive sucesso no exterior, como na França.
O Chile também passava por um importante processo de renovação musical. Desde os anos 1950, Violeta Parra percorria os mais longínquos rincões do país para recolher materiais folclóricos. Ela se tornaria uma grande compositora da “Nueva Canción Chilena”, movimento que explode em 1965, e que tinha como epicentro a “Peña” (uma espécie de taberna musical) dos seus dois filhos, Ángel e Isabel. O movimento musical chileno foi ganhando novos membros, quase todos jovens engajados oriundos das universidades, como Victor Jara, Rolando Alarcón e os lendários grupos Quilapayún e Inti-Illimani.
Finalmente, veio de Cuba, primeiro país latino-americano a formar um governo socialista, a quarta grande “coluna” musical alinhada com o novo cancioneiro latino-americano. Batizado de “nueva trova cubana“, tal movimento teve nos cantores e compositores Silvio Rodríguez e Pablo Milanés seus grandes representantes.
Em todos estes países, particularmente no Chile e em Cuba, a “nueva canción” foi além do folclorismo ou das baladas com letras diretas e engajadas, uma vez que criou novas formas poéticas e arranjos musicais sofisticados, em alguns casos inspirados no jazz e no rock, embora o violão e os instrumentos de percussão e corda tradicionais dessem o tom.
Em 1967, aconteceu o 1º Encuentro de la Canción Protesta, em Havana, ocasião em que os principais nomes da música engajada se mostraram dispostos a radicalizar sua atividade e trocar figurinhas sobre os rumos da nova canção. Naquele momento, em Cuba e no Cone Sul, a polarização da Guerra Fria e a euforia com a Revolução Cubana promoviam a emergência de temas contemporâneos cada vez mais presentes nas canções de protesto. Os ideais revolucionários, o anti-imperialismo, a crítica à guerra do Vietnã, e a defesa da reforma agrária na América Latina eram alguns deles. Estiveram no evento os chilenos Ángel Parra e Rolando Alarcón, e os uruguaios Alfredo Zitarrosa, Daniel Viglietti e Los Olimareños, entre outros.
A experiência socialista no Chile governado pela Unidad Popular (1970-1973) e os movimentos de guerrilha anti-imperialistas e socialistas que se disseminaram pelo continente entre o fim dos anos 1960 e começo dos anos 1970, foram embalados pela trilha sonora da “nueva canción”. Não por acaso, os principais compositores tiveram que se exilar depois dos golpes de Estado que instauraram ditaduras militares. No Chile, tal era a identificação da “Nueva Canción Chilena” com o governo deposto da Unidad Popular, que o general Pinochet proibiu os instrumentos típicos deste movimento, como a charango e a zampoña.
Ao longo das décadas de 1970 e 1980, enquanto durou a ditadura militar no Brasil, canções de Violeta Parra, Sílvio Rodríguez e Pablo Milanés foram largamente executadas e regravadas no país, em especial por Milton Nascimento (“Volver a los 17″, em 1976, “Canción por la Unidad Latino-Americana”, em 1978, “Sueño con Serpientes”, em 1980) e Chico Buarque (“Pequeña Serenata Diurna”, em 1978, “Supõe”, em 1982, “Iolanda” e “Como se fosse a primavera”, em 1984). Artistas que, à sua maneira, faziam canções de protesto e se esforçavam para promover o diálogo com os países vizinhos.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
GOMES, Caio de Souza. Quando um muro separa, uma ponte une: conexões transnacionais na canção engajada na América Latina (anos 1960/70). São Paulo: Alameda, 2015.
Aqueles anos de chumbo foram cheios de intolerância e radicalização estética e política. Disputas insufladas nos festivais migravam para as gravadoras, os canais de TV, a vida pessoal. Na Copa de 1970, enquanto a seleção conquistava o tricampeonato no México, a linha dura do regime institucionalizava a tortura como método de repressão e fazia disparar as estatísticas (não computadas, não divulgadas) de mortes e desparecimentos políticos.
A oposição ao governo inflamava-se de tal maneira que surgiu a patrulha ideológica de esquerda que apontava o dedo para todos aqueles que ousavam gravar canções ufanistas e que revelassem amor pelo país, o que bastava para ser acusado de conivência com o sistema.
Dom & Ravel e Os Incríveis faziam canções ufanistas e tornaram-se queridinhos dos militares com “Eu te Amo Meu Brasil”. Nem “País Tropical”, de Jorge Ben (depois Benjor), escapou.
Enquanto as polarizações permaneciam — entre acústicos e plugados, engajados e desbundados, “comprometidos” e “traidores” — a maioria dos ouvintes de música popular brasileira queria mesmo era se divertir com o soul dançante de Simonal e Jorge Ben e, principalmente, com o pop-cafona de Odair José, Waldik Soriano e Agnaldo Timóteo, na época ídolos da música brega. Odair José, um dos artistas mais represtativos do período do regime militar, é o autor da canção “Uma Vida Só (Pare de Tomar a Pílula)”, censurada, como tantas outras de sua autoria, não por ideologia política stricto sensu, mas por atentar contra os bons costumes.
Enquanto isso, o samba pedia passagem com Clara Nunes, a primeira mulher a vender mais de 100 mil cópias de um LP, Paulinho da Viola, Alcione, Martinho da Vila, Beth Carvalho, Paulo César Pinheiro e, diretamente de São Paulo, o macarrônico Adoniran Barbosa, entre outros.
A música sertaneja avançava com Tião Carreiro & Pardinho, Milionário & Zé Rico, Chitãozinho & Xororó, Sérgio Reis, apresentando os primeiros indícios do fenômeno de massa que seria consolidado nos anos 1990, com canções como “Estrada da Vida”, de Milionário & Zé Rico.