Novo Cinema Latino-Americano

Até o surgimento do Novo Cinema Latino-Americano, a região produzia filmes inspirados no neorrealismo italiano, com a intenção de promover alguma crítica social. Um de seus principais expoentes foi Emilio Fernandez, autor de obras como Maria Candelária (1943). Nesse filme, Dolores Del Rio é uma índia segregada do convívio com seus pares, por ser a filha de uma mulher assassinada pela comunidade local pela forma como ganha a vida. O longa explora, pela primeira vez, elementos melodramáticos que vão fundar a base para o que hoje se vê nas populares novelas produzidas no México.

Já nas décadas de 1960 e 1970, período de extrema restrição das liberdades individuais e coletivas, essa busca por identidade perde espaço. O objetivo do Novo Cinema Latino-Americano (NCLA) é fazer da atividade cinematográfica um instrumento de emancipação, uma frente de luta contra o imperialismo estadunidense. No lugar de um cinema para o entretenimento, entra em cena a valorização da cultura e da tradição – a língua, as locações, os personagens, as vestimentas, as músicas – com foco nas classes populares e na revolução. Para além da pobreza e da desigualdade, os cineastas atuavam de olho na censura e na repressão. Dentre seus autores, reunidos em grupos ou individualmente, destacam-se:

::. Grupo Cine Liberación (Argentina): Nascido no fim dos anos 1960, como braço cinematográfico do general Juan Domingo Perón, que à época vivia exilado na Espanha de Francisco Franco. Tendo como principais expoentes Fernando Birri, Fernando Solanas e Octavio Getino, pretendia produzir obras abertas, capazes de despertar a consciência do espectador, em oposição ao cinema catártico de Hollywood.

::. Grupo Ukamau (Bolívia): De Jorge Ruiz e Jorge Sanjinés, dedicado a produzir um cinema de baixo custo, filmado em espaços reais, não cenários, permitindo o improviso, e comprometido com a realidade social e a identidade cultural do seu povo.

::. Cinema Novo (Brasil): De Glauber Rocha e Nelson Pereira dos Santos, comprometido em fazer um cinema autoral, sincero, criativo, voltado para a realidade social e econômica do Brasil. Um cinema capaz de comunicar o povo ao povo, e de provocar a revolução nacional e popular necessária para a superação das desigualdades.

::. Cinemateca del Tercer Mundo (Uruguai): Nela, o cineasta Mario Handler conseguiu apoio para produzir dois documentários, Liber Arce, Liberarse (acompanhando o cortejo do primeiro estudante morto pela polícia em 1969) e El problema de la carne (sobre a greve geral dos trabalhadores de um matadouro). Em 1972, dois de seus diretores foram presos, torturados e mantidos incomunicáveis. Walter Achugar permaneceu dois meses em cativeiro. Já Eduardo Terra foi libertado apenas quatro anos depois. Durante os anos 1980, entretanto, a Cinemateca se reergueu: arregimentou 10 mil filiados, estruturou uma biblioteca, editou um periódico e livros específicos sobre a produção cinematográfica do país, e estimulou a execução de novos títulos.

Outros nomes representantes do Novo Cinema Latino-Americano:

::. Raúl Ruiz, Miguel Littín, Lautaro Murúa e Aldo Francia (Chile);
::. Julio García Espinoza, Tomás Gutiérrez-Alea e Santiago Álvarez (Cuba);
::. Margot Benacerraf, Mauricio Walerstein e Román Chalbaud (Venezuela).

Com o fim da Embrafilme, fechada pelo governo Fernando Collor em 1990 em nome da austeridade de gastos do Estado e da valorização do livre mercado, o cinema brasileiro virtualmente acabou. Não se trata apenas de força de expressão, e sim de um fato estatístico incontestável. Em 1992, apenas um filme brasileiro de longa metragem estreou no mercado.

Com a queda do governo Collor, a partir de um grande movimento político e social contra a corrupção, a situação do cinema começou a melhorar. O governo Fernando Henrique Cardoso criou leis de incentivo e captação de recursos para viabilizar o cinema, estimulando o patrocínio privado à base de renúncia fiscal para produzir filmes brasileiros.

Iniciou-se o chamado “cinema da retomada”, depois de anos de crise. O ritmo de produções ficcionais e documentais aumentou, estabelecendo, em muitos casos, parcerias com as grandes emissoras de televisão, sobretudo a Rede Globo. Mesmo sem atingir os níveis de público dos anos 1970, quando esteve no auge da popularidade, o cinema brasileiro renascia das cinzas.

Nos anos 1970, o cinema brasileiro vivenciou um paradoxo. Era apoiado financeiramente pelo mesmo Estado autoritário que praticava a censura. Como se explica esse paradoxo? Qual o legado do cinema brasileiro moderno que se fortaleceu durante a ditadura militar? Como os filmes ajudaram a fixar, na memória e no debate cultural, certas imagens sobre a ditadura e seus opositores?

O aparato de repressão montado pela ditadura civil-militar de 1964, como se sabe, foi dirigido, explícita e predominantemente, contra os “subversivos” e “comunistas”. Mas os golpistas foram além! Montaram também um aparato de controle moral contra os comportamentos sexuais, tidos como “desviantes”. Assim, homossexuais, travestis, prostitutas e outras pessoas consideradas “perversas”, ou “anormais”, foram alvo de perseguições, detenções arbitrárias, expurgos de cargos públicos, censura e outras formas de violência.

À forte repressão sofrida, a comunidade LGBTs respondeu com a criação e o fortalecimento de movimentos de resistência inspirados nas organizações de luta por direitos de homossexuais, surgidas no contexto internacional. No fim dos anos 1970, diversos grupos começaram a se mobilizar e formar coletivos de enfrentamento à opressão do Estado, e ao preconceito contra a população LGBT, em defesa de seu reconhecimento e de seus direitos. A perseguição aos homossexuais no período da ditadura foi mais um capítulo na história de violência de que são alvos pessoas e organizações LGBTs. Por isso, a sua luta continua necessária e atual no Brasil e no mundo.

O regime militar brasileiro implementou o Plano de Integração Nacional (PIN), gestado desde o governo Castelo Branco, para expandir as fronteiras internas do Brasil, criando cidades, ampliando os negócios, as rodovias e o escoamento de matérias-primas. Essa expansão significou assassinato individual e coletivo, perseguição, criminalização, prisão e tortura de lideranças indígenas que lutavam por seus territórios ou que tivessem comportamento considerado inadequado frente à política de desenvolvimento do governo.

A imprensa alternativa foi um espaço importante de crítica ao regime militar, de divulgação de denúncias, e de debate das organizações de esquerda. Por meio do humor, da análise política ou da informação, esses jornais e revistas alternativos cumpriram um papel fundamental de oposição e resistência à ditadura no Brasil.

Até bem pouco tempo atrás, a autoimagem do Brasil era a de uma “democracia racial”. Um país que se orgulhava de não ter leis segregacionistas, de ter ídolos negros, de ter convívio social aberto a todos. Será que essa autoimagem não ignora um racismo velado no dia-a-dia? Será que leva em conta os inúmeros casos de racismo declarado em vários ambientes sociais? O que a percepção de que não somos um país racista tem a ver com a experiência do autoritarismo no regime militar?

A Igreja Católica desempenhou papéis contraditórios durante a ditadura militar no Brasil. Por um lado, contribuiu para o clima de desestabilização nos meses que antecederam o golpe e apoiou os militares num primeiro momento, especialmente a cúpula da Igreja Católica. Por outro, é preciso destacar a postura de alguns setores dessa instituição religiosa na resistência ao regime autoritário nos anos posteriores a 1964.

A ditadura reprimiu fortemente o movimento operário: sindicatos sofreram intervenção estatal, lideranças foram presas e torturadas, a imprensa operária e sindical foi proibida. Mas as greves de proporções históricas organizadas pelo movimento operário, principalmente a partir de 1978, com destaque para os metalúrgicos do ABC paulista, contribuíram significativamente para o crescimento das forças de oposição ao regime e para a mudança do cenário político nacional.

Antes do golpe, os trabalhadores rurais estavam num processo crescente de luta pela reforma agrária e por direitos sociais. Com a ditadura, a repressão conjunta de militares e latifundiários se abateu pesadamente sobre eles. Muitos foram presos e outros tantos assassinados. Mas, quando se fala sobre repressão e resistência nessa época, muitas vezes as lutas e as violações de direitos humanos ocorridas nas zonas rurais são esquecidas.