Regimes ditatoriais favorecem a corrupção

A corrupção no Brasil é um tema bastante complexo, ainda que nos últimos anos tenha se transformado numa espécie de luta dos bons contra os maus. Corrupto é sempre o outro. Mas, na verdade, mesmo sem admitir, um cidadão comum pode fazer parte da rede de corrupção se subornar um guarda, comprar o resultado de um concurso, negociar com um fiscal para escapar de alguma lei. Para existir o corrupto, é preciso existir o corruptor. Só que, nos tempos da ditadura, nem sempre era fácil identificar e punir um e outro, sobretudo quando envolvia importantes autoridades públicas.

Os nostálgicos da ditadura, tanto os oportunistas quanto os desavisados de hoje, gostam de dizer que “no tempo dos militares não havia corrupção”. Bem, corrupção havia, mas como também havia censura, muitos escândalos sequer chegavam aos jornais. Mas alguns foram publicados por jornais que não podiam ser acusados de “subversivos” ou “comunistas”. Alguns deles até tinham apoiado o golpe militar.

Na democracia, é possível saber quem corrompe e quem é corrompido, pois o sistema judiciário tem mais independência em relação ao Poder Executivo, a imprensa pode investigar livremente casos de corrupção, e o cidadão se sente mais à vontade para fazer denúncias que envolvam autoridades. Nas ditaduras, tudo isso fica mais difícil.

Os militares não tinham interesse em deixar vazar casos de corrupção que envolviam seus aliados ou colegas de farda, justamente para não estimular a descrença nas autoridades e no poder de Estado. Impedir a publicação de notícias sobre a corrupção era parte da estratégia de segurança nacional.

Mesmo assim, alguns casos se tornaram notórios e fartamente documentados, e até foram investigados oficialmente. Superfaturamento, desvio de verbas, desvio de função, abuso de autoridade, tráfico de influências. Tudo isso já era bem conhecido no Brasil da ditadura.

O Ato Institucional Nº 5 (AI-5) prometia dureza contra os corruptos. Os militares anunciavam um reino de terror contra os opositores e de virtudes públicas. Alguns até acreditaram nisso. Mais de 1.100 processos foram instaurados pela Comissão Geral de Investigações, ligada ao Ministério da Justiça, mas desse montante apenas 99 casos chegaram a algum termo, como confisco de bens dos envolvidos.

O próprio Geisel utilizou a “corrupção das Forças Armadas” como uma das justificativas para iniciar a “abertura” política e afastar os militares dos encantos e armadilhas do poder de Estado. Embora não haja nenhuma denúncia de corrupção envolvendo diretamente os generais-presidentes, muitos outros militares e civis foram alvo de denúncias durante o regime militar.

O futebol não está isolado do restante da sociedade. Como parte dela, reflete as mesmas contradições, interesses e tensões. Influencia e é influenciado. Usa e é usado. Joga e deixa jogar. Na noite que durou 21 anos, a bola não parou de rolar no Brasil. O futebol se modernizou, fomos tricampeões mundiais, grandes estádios foram construídos, o campeonato nacional nasceu. Por outro lado, vozes aqui e ali tentaram dizer que alguma coisa não ia bem. Como em outros campos da sociedade, o futebol brasileiro durante a ditadura militar foi espaço de conivência e atrito, submissão e tensionamento, propaganda e resistência.

Selecionamos 50 histórias que refletem essa relação entre o futebol e a ditadura militar no Brasil. Não são todas as histórias do período, claro, mas uma boa síntese dos usos do futebol pela ditadura, das tensões entre personagens e o regime, dos espaços de resistência e das vezes em que futebol e ditadura apenas se cruzaram no caminho.

(Textos de Daniel Cassol e Leandro Stein, publicados nos sites Impedimento e Trivela, em 04/04/2014)

A ditadura militar no Brasil passou por três fases diferentes ao longo de seus 21 anos de duração. A primeira foi de legalização do regime autoritário, por meio de decretos-lei e de uma nova constituição. A segunda, de recrudescimento da repressão e da violência estatal contra os opositores da ditadura. E a terceira, de reabertura política, com a Lei da Anistia e o movimento pelas eleições diretas para presidente.

Quando o presidente João Goulart anunciou que iria colocar em prática as Reformas de Base, com objetivo de reduzir a concentração da renda e da terra no país, milhares de pessoas saíram às ruas para defende-las e aprofundá-las. Contudo, apesar do forte apoio popular às mudanças anunciadas, os setores da sociedade ligados ao pensamento conservador protestaram contra o governo, considerado por eles uma porta de entrada para o comunismo no Brasil. Isso animou os golpistas, que perceberam uma importante disposição de setores das classes médias para sustentar a derrubada do presidente por quaisquer meios.

A partir de 1976, o presidente Ernesto Geisel decidiu controlar de maneira mais direta os “porões da repressão”, dentro da estratégia de preparar o regime para uma futura transição para um governo civil. Mas, durante esse período chamado de “abertura”, registrou-se uma atividade terrorista de direita. Uma sequência de atentados à bomba contra pessoas, órgãos da imprensa, livrarias, universidades e instituições identificadas com a oposição, marcaram a escalada de violência de direita.

Os militares no poder procuraram sempre atuar a partir de uma “legalidade autoritária”. Mas para combater qualquer um que contestasse o regime mais diretamente, os chamados “subversivos”, não deveria haver limite jurídico, ético ou moral. Assim, principalmente a partir de 1968, o Estado brasileiro patrocinou uma repressão ao mesmo tempo legal e ilegal, baseada em censura, vigilância, tortura sistemática, prisões ilegais e desaparecimentos.

O sucesso da Revolução Cubana e a aproximação do país com a União Soviética acirraram a luta dos Estados Unidos contra o comunismo na América Latina, resultando em golpes militares em diversos países. Para integrar a repressão a movimentos guerrilheiros e a opositores das ditaduras em geral, foi criada a Operação Condor, que aprofundou a cooperação entre as forças de segurança das várias ditaduras latino-americanas, entre elas, Brasil, Argentina, Uruguai, Chile e Paraguai.

Já imaginou viver num mundo bipolar, dividido entre países capitalistas e comunistas, em constante disputa entre eles? Pois saiba que já foi assim, e não faz muito tempo. E isso teve muita influência sobre o golpe militar e a ditadura no Brasil (e em outros países da América do Sul). Os Estados Unidos apoiaram golpes contra governos eleitos pelo voto e também pressionaram os países a lutar contra o comunismo na região.