Filiação

Antonieta e José Martins Filho

Data e Local de Morte

7/10/1963, Ipatinga (MG)

Eliane Martins

Eliane Martins
Eliane Martins morreu em 7 de outubro de 1963, no episódio conhecido como “Massacre de Ipatinga”, operação policial realizada contra uma multidão de trabalhadores grevistas, formada por mais de cinco mil metalúrgicos e operários da construção civil, que protestavam contra as condições indignas de trabalho impostas pela empresa siderúrgica Usiminas. Sabe-se que ao menos 8 pessoas morreram e 90 ficaram feridas. A Usiminas foi inaugurada no dia 16 de outubro de 1962, como parte do projeto de industrialização previsto pelo Plano de Metas do governo Juscelino Kubitschek (1956- 1961). A construção da siderúrgica no pequeno município mineiro de Coronel Fabriciano, do qual o distrito de Ipatinga fazia parte à época [i], iniciou-se em 1958 e gerou significativos impactos para sua população que, na década de 1950, era cerca de trezentos habitantes. Se inicialmente a empresa foi vista como um espaço de novas oportunidades e um vetor para o desenvolvimento da região, a realidade logo expôs uma série de problemas, frutos da explosão demográfica e da ausência de investimentos sociais necessários para suprir a falta de infraestrutura local. As condições de vida dos trabalhadores, vindos de todo o Brasil, eram marcadas pelas precárias condições de trabalho, pelos baixos salários e pela constante repressão policial. Os alojamentos destinados aos operários eram pequenos e apertados. O transporte e a alimentação eram igualmente ruins. Os trabalhadores viajavam em caminhões sempre lotados e suas refeições eram de péssima qualidade. Eram ainda recorrentes casos de abusos de autoridade e de violência física contra os trabalhadores por parte da Polícia Militar, presença constante na porta da empresa. As dificuldades impostas pela Usiminas para a sindicalização dos trabalhadores e o tratamento diferenciado dado a chefes, engenheiros e policiais militares também contribuíam para aumentar o clima de revolta dos trabalhadores. O contexto de generalizada insatisfação foi agravado, quando na noite do dia 6 de outubro de 1963, ao final do expediente, os operários foram submetidos a uma dura e humilhante revista. Enquanto os caminhões responsáveis pelo transporte dos trabalhadores para suas residências apressavam a saída diante da forte chuva que caía, os trabalhadores foram obrigados a permanecer em fila indiana e esperar por um longo tempo para que pudessem, um a um, serem revistados antes de deixarem a empresa. Segundo relatos, os vigilantes instruídos pela direção da empresa teriam armado a situação como represália à primeira assembleia dos trabalhadores da Usiminas, realizada naquela tarde, sob a coordenação do Sindicato dos Metalúrgicos de Coronel Fabriciano (METASITA). Durante a reunião, foram feitas muitas críticas à administração local da empresa, cujo responsável era Gil Guatimosin Júnior, diretor de relações exteriores da siderúrgica. As circunstâncias da revista acirraram os ânimos dos operários que, receosos de perderem a condução, tentaram forçar a saída. Foram imediatamente reprimidos de forma violenta por policiais do Regimento da Cavalaria de Ipatinga, que se encontravam próximos ao local, já de prontidão. Houve um princípio de confusão, os policiais armados agiram com violência, desferindo chutes e jogando os cavalos para cima dos trabalhadores. Após a normalização da situação na porta da empresa, a Polícia decidiu realizar ações de patrulhamento em alguns alojamentos. Inicialmente, os policiais seguiram para o alojamento localizado no bairro de Santa Mônica. Como o local só tinha uma entrada, os trabalhadores, percebendo a chegada da tropa, bloquearam a passagem com móveis e tonéis e quebraram as lâmpadas para dificultar a ação policial. A tropa recuou e deslocou-se para o alojamento da Chicago Bridge, empreiteira que prestava serviços à Usiminas. Lá, cerca de trezentos trabalhadores foram humilhados, presos e levados para a delegacia, onde foram colocados em um pátio, debaixo de chuva e espancados. A notícia das prisões espalhouse, alimentando o clima de enfrentamento. Diante da situação, o Comandante da Polícia Militar do Destacamento de Ipatinga, Robson Zamprogno, ordenou o recuo das forças policiais e solicitou que a negociação com os trabalhadores fosse feita pelo padre Avelino Marques, pároco da Igreja do bairro do Horto. Por seu intermédio, foi possível alcançar um acordo momentâneo que assegurava que os trezentos trabalhadores detidos fossem soltos e que, no dia seguinte, seria realizada uma reunião entre os representantes dos trabalhadores e da Usiminas. No início do dia 7 de outubro de 1963, os trabalhadores, movidos pela indignação dos acontecimentos da véspera, organizaram um protesto pacífico em frente ao portão principal da empresa. Por volta das 8 horas da manhã, já havia mais de 5 mil trabalhadores reunidos. Desde cedo, a tropa da Polícia Militar de Minas Gerais encontrava-se de prontidão no local, mas apenas haviam sido mobilizados doze policias. Posteriormente, a tropa recebeu reforços, totalizando dezenove policiais, que portavam pistolas e uma metralhadora giratória em cima de um caminhão. Temendo o início de um confronto, lideranças dos trabalhadores, juntamente com o padre Avelino, negociaram com os representantes da Usiminas a retirada da tropa policial do local. Após longa negociação, com a presença do diretor da empresa, Gil Guatimosin Júnior, o capitão Robson Zamprogno aceitou a retirada, sob a condição de que a polícia não fosse vaiada. Ficou decidido que tanto os policiais quanto os empregados iriam se dispersar simultaneamente. Por volta das 10 horas da manhã, o caminhão que levava os policiais preparava-se para partir, quando enguiçou. A situação acirrou ainda mais a tensão entre a polícia e os trabalhadores, gerando um princípio de confusão. Nesse momento, o 2o Tenente do Regimento da Cavalaria Militar, Jurandir Gomes de Carvalho, comandante da tropa, deu um tiro para o alto, buscando intimidar a multidão de grevistas. Quando finalmente o caminhão andou, a tropa disparou tiros indiscriminadamente em direção aos trabalhadores, utilizando-se de uma metralhadora giratória. Entre as vítimas identificadas no Massacre de Ipatinga estão: Eliane Martins, Aides Dias de Carcvalho; Alvino Ferreira Felipe; Antônio José dos Reis; Geraldo da Rocha Gualberto; Gilson Miranda; José Isabel Nascimento; e Sebastião Tomé da Silva. Depoimentos prestados à CNV apontaram para a possibilidade de um número de vítimas fatais maior do que o oficial. Gerulino França de Souza, João Flávio Neto e Fábio Rodrigues de Souza seriam possíveis casos de desaparecimento ligados ao episódio. Logo após o massacre, as autoridades prometeram realizar uma rigorosa investigação sobre os fatos. Contudo, com o golpe militar de abril de 1964, a apuração das responsabilidades pelas mortes no massacre foi interrompida e todos os policiais militares envolvidos no episódio foram absolvidos pela Justiça Militar no dia 17 de setembro de 1965. A partir de então, foi imposto um duradouro silêncio sobre o episódio. Mais recentemente, em 2004, a CEMDP apreciou e aprovou, por unanimidade, o caso de cinco das oitos vítimas fatais do Massacre de Ipatinga. Os familiares de três vítimas (Aides Dias de Carvalho, Eliane Martins e Gilson Miranda) não apresentaram demanda perante a comissão. Em suas análises, os relatores entenderam que, com as alterações introduzidas pela Lei nº 10.875/2004, que estabeleceu duas novas possibilidades de indenização (morte por suicídio cometido na iminência da prisão ou em decorrência de tortura; e mortes em passeatas e manifestações reprimidas pela polícia), não importava, para fins de reconhecimento da responsabilidade do Estado, saber quem determinou ou como se iniciou o conflito. Com efeito, “a ação ou reação policial de disparar contra uma multidão desarmada não poderia ter outra consequência senão as várias mortes e inúmeros feridos”.
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