Atuação Profissional

estudante e tipógrafo

Organização

Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8)

Filiação

Maria Ferreira Santa Bárbara e Deraldino Santa Bárbara

Data e Local de Nascimento

8/12/1946, Inhambupe (BA)

Data e Local de Morte

28/8/1971, Fazenda Buriti, Brotas de Macaúbas (BA)

Luís Antônio Santa Bárbara

Luís Antônio Santa Bárbara
Luiz Antonio Santa Bárbara foi morto por agentes do Estado brasileiro no dia 28 de agosto de 1971, em Brotas de Macaúbas, sertão da Bahia, durante a operação militar e policial que ficou conhecida como Pajussara. A localização de Lamarca naquela região envolveu colaboração do CIE e do CISA, conforme depoimento do brigadeiro João Paulo Moreira Burnier.iii A pacata população rural de Brotas de Macaúbas teve sua rotina alterada com a chegada de helicópteros e várias equipes de militares e policiais civis à região. O barulho das rajadas de metralhadoras, cenas como a de Olderico Barreto, irmão de Zequinha Barreto, e seu pai, José de Araújo Barreto, sendo torturados na frente de vizinhos e o sobrevoo de helicópteros com os mortos pendurados, para todos verem. Do cerco e investida sobre a casa da família Barreto, em Buriti Cristalino, na data de 28 de agosto de 1971, coordenados pelo Centro de Operações de Defesa Interna (CODI) da 6ª Região Militar – que matou os militantes Otoniel Campos Barreto e Luiz Antônio Santa Bárbara –, participaram as equipes OSCAR (do Departamento de Ordem Política e Social – DOPS de SP, tendo à frente o delegado Sérgio Paranhos Fleury), LIMA (CIE), MIKE (Cisa), FOX-TROT (CIE), HOTEL (Cisa) E CINÓFILAS (PM da Bahia). Os helicópteros permaneceram em Oliveira dos Brejinhos e foram acionados quando se rompeu o silêncio com o tiroteio na fazenda. Em depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV) e à Comissão Estadual da Verdade “Rubens Paiva” de São Paulo (CEVSP), em 15 de julho de 2014, Olderico Barreto contou que: No dia 28 de agosto de 71 a gente amanheceu com nossa casa cercada. […] Eles chegaram de helicóptero, eles vieram de madrugada, a cavalo, à pé [ao povoado de Buriti Cristalino]. Esses que cercaram a nossa casa é que são responsáveis pela morte de Otoniel e Santa Bárbara. […] então quando eu sou preso, passo a ser torturado no pé de um morango, onde eles me misturavam com estrume de animal, e me reviravam e davam chutes na região dos rins, pra lá e pra cá, eles me quebraram neste dia [de forma] que eu tive muita dificuldade no dia seguinte de levantar sozinho, de entrar em um carro, de me curvar. […] eu vi meu pai, eles pondo o velho no pau-de-arara à noite. […] eles me vendaram os olhos e me pisavam, inclusive para descansar eles ficavam em cima do meu tórax. Em documento do Serviço Nacional de Informações (SNI), de 16 de setembro de 1971, localizado no Arquivo Nacional pela CNV, consta: No dia 31 de agosto 71 foi passado o seguinte telex […], informo CODI-6 apoiado elementos CIE, CISA e CENIMAR prossegue buscas agora área Brotas, Oliveira dos Brejinhos, Ibotirama, interior Bahia. Dia 28 agosto estourou aparelho rural sendo morto Luiz Antônio Santa Bárbara, codinomes „Ramos‟ e „Merenda‟ e Otoniel Campos Barreto, e ferido Aldemar Campos Barreto que reagiram [à] prisão. Dois últimos são irmãos [de] Jessé Campos Barreto, ainda foragido. Lamarca não foi visto, havendo indícios [de] sua presença. A versão apresentada à época pelos órgãos de repressão seria de que Luiz Antônio teria se suicidado com um tiro no próprio ouvido durante o cerco da polícia à Fazenda Buriti, quando soube da morte de seu companheiro Otoniel Barreto. Outra versão divulgada pelos órgãos de repressão é a de que ele teria morrido em um tiroteio, quando as forças policiais ainda não haviam assumido o controle total da área. No laudo de necropsia, de 29 de agosto de 1971, consta que o jovem foi “abatido quando reagira à bala contra a equipe encarregada de capturá-lo […], em operação realizada sob a coordenação CODI/6, conforme ofício […] produzido pelo Departamento de Polícia Federal”. Essa informação, registrando a falsa versão de morte em troca de tiros, conforme notícia publicada na Folha de S. Paulo em 15 de julho de 1996, já constava de documento assinado pelo coronel Luiz Arthur de Carvalho, então diretor da Polícia Federal na Bahia e integrante do Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) da 6ª Região Militar, que encaminhou os corpos à perícia no Instituto Médico-Legal (IML). No laudo de necropsia, os peritos concluíram que Luiz Antônio “falecera em consequência de ruptura do cérebro por projétil de arma de fogo” e que “o agente quis o resultado”. Sabe-se, no entanto, que a Operação Pajussara foi de grande porte, impossibilitando resistência por parte dos moradores. O próprio relatório da Pajussara evidencia que a operação contou com diversos serviços de informações do Exército, da Marinha, da Aeronáutica, Polícias Militares, Polícia Federal e Polícias Civis, constituindo-se em uma operação de guerra que esperava encontrar na região um foco de guerrilha coordenado pelo ex-capitão Carlos Lamarca. O transporte das forças policiais e militares contou com a cooperação da Companhia Mineradora Boquira, que cedeu um avião e viaturas, garantindo o deslocamento aéreo e terrestre e permitindo a infiltração das equipes na área. Na avaliação do Exército, durante a operação houve um “perfeito entrosamento” entre “as Agências Centrais de Informações, Elementos Civis de São Paulo e Guanabara, Centro de Operações de Defesa Interna (CODI/2)”. O povoado de Buriti Cristalino foi ocupado por mais de cem homens armados – várias equipes, de militares e policiais civis – com metralhadoras e fuzis, além de helicópteros que sobrevoavam a casa. Segundo o relatório da operação, “como armamento, a metralhadora ou FAL foram usados ostensivamente, por ser impositivo, face ao inimigo. Este armamento é contra indicado apenas na fase de busca de informes, quando as equipes usam Revólver ou Pistola”. A primeira fase da operação, desenvolvida durante a madrugada, encontrou seis pessoas dormindo na casa da família Campos Barreto. O primeiro a ser morto foi Otoniel, atingido ao tentar impedir que seu pai, José de Araújo Barreto, de 64 anos, continuasse a ser torturado pelos policiais. Depois, Luiz Antônio Santa Bárbara foi assassinado dentro da casa da família Barreto. Olival Barreto, que à época tinha 11 anos, escondeu-se debaixo da cama do quarto junto com Jorge Tadeu, 16 anos, quando da invasão dos agentes à sua casa. De lá, escondido, presenciou a morte de Luiz Antônio Santa Bárbara, que caiu no chão, ao lado das crianças. Olival relembra o que presenciou: Nós dormíamos juntos, no mesmo quarto, porque a gente era como irmãos, ele tinha o dobro da minha idade, ele era da idade do Zequinha, ele era meu professor. Então a gente dividia o quarto. Só que esta noite, quando eu deitei, ele não estava. Aí quando foi tarde da noite, por volta de meia-noite, uma hora da manhã, ele chegou. […] Só que quando estava clareando, o José Tadeu, que era um primo que morava ao lado, ele viu a polícia chegando, muita gente montada a cavalo, fazendo o cerco ali, e ele conseguiu entrar na nossa casa antes que a polícia. […] O Tadeu devia ter uns 15 anos para 16. Ele acordou o Olderico e o Otoniel e foi lá para o quarto da varanda, onde eu estava com o Santa Bárbara e acordou a gente. Aí ele disse assim: “Roberto, a rua aí está cheia de polícia e eles estão perguntando onde está Zequinha”. Só que neste momento, já começou um tiroteio nos fundos da casa. E Roberto pegou um revólver que ele tinha escondido em uma mesinha e foi para o lado dos fundos da casa. […] Tinha muita fumaça, por causa dos tiros, estava aquele fumaceiro que a gente não enxergava nada. [Então] o Roberto voltou. Esse meu primo José Tadeu entrou debaixo da cama, a gente não tinha para onde ir. Aí eu tive a idéia de entrar atrás dele. O Santa Bárbara voltou e ficou em pé atrás da porta. Eu, como estava debaixo da cama, via o Santa Bárbara da cintura para baixo. […] Aí vieram umas pisadas, de um coturno, […] na direção do corredor até a porta do quarto, que estava semi-aberta. Aí ele deu um chute na porta, eu via o policial com a boca da metralhadora, e o via também só da cintura para baixo. Quando ele chutou a porta, já deu aquela explosão de tiro. Só que esse tiro não saiu daquela arma que estava apontada para mim. O tiro não foi do policial que arrombou a porta, saiu de outra arma. Neste momento, o Santa Bárbara caiu no chão. Ele caiu do meu lado, assim, me sujou de sangue. Aí o policial me viu e ordenou: “sai daí garoto”. Eu saí e o José Tadeu também saiu. A investida sobre Brotas de Macaúbas, a invasão da casa da família Barreto e a morte de Luiz Antônio Santa Bárbara são lembradas por um agente que participou da operação. Em depoimento à CNV, o coronel reformado Lúcio Valle Barroso, que era capitão da Aeronáutica à época da Operação Pajussara, disse que: [Em Brotas de Macaúbas] tinha um campo de pouso que os caras me deixaram lá com uns vinte soldados, um monte de cabos, soldados, sargentos. E nós fomos incorporados e o comando era do [major Nilton Albuquerque] Cerqueira. E nós fomos até a mata, a gente já tinha alguma informação. (…) a gente sabia o que a gente procurava. Nós começamos a fechar, fechar, fechar. Todo mundo à paisana, né? Lúcio Valle Barroso relata como foi a invasão da casa e a morte de Santa Bárbara: Quando nós chegamos lá na coisa, nós cercamos, era uma casa de esquina assim, então nós cercamos e chegamos perto, os caras pressentiram a chegada, então houve o tiroteio e tinha uma porta aqui pra trás e tinha uma janela aqui [faz gestos para mostrar onde estava em relação à casa]. Eu fui para essa janela aqui. Eu ia para essa porta, quando o sargento disse: “Capitão!”, aí me voltei e ele atirou. Atirou e como a casa era de adobe e esse fuzil nosso vara adobe fácil, matou o cara do outro lado. Aí eu fui pra cá, abri a janela, olhei e vi o outro cara lá, esse eu sei o nome, Santa Bárbara… (…) aí esse cara levou um tiro. Quando eu arrombei a porta, tirei a granada pra jogar, eu vi o cara levar o tiro e aí eu coloquei a granada. (…) O mais chato foi que quando eu arrombei a porta e fiquei olhando, e ele levou o tiro, quando eu cheguei em cima vi que tinha uma cama e debaixo da cama tinham crianças. Se eu jogasse a granada, eu matava as crianças. Felizmente isso não aconteceu. Depois que os corpos de Otoniel e de Luiz Antônio foram levados de helicóptero para Salvador (BA), os agentes policiais permaneceram instalados na propriedade, transformando a área em verdadeiro quartel-general das ações para a captura de Lamarca e Zequinha. Entre 1969 e 1971, os pais de Luiz Antônio haviam ficado sem notícias do filho primogênito. Em agosto daquele ano, receberam, pela imprensa – como o Jornal da Tarde, entre outros –, a informação de que o filho havia sido morto na Fazenda Buriti Cristalino, em Brotas de Macaúbas. Depois de muita insistência, conseguiram autorização para ver o corpo do filho. Em depoimento, Maria descreveu que Luiz Antônio tinha a mão perfurada à bala e disse não acreditar na versão oficial sobre suicídio. O pai, Deraldino, ao ver o corpo, disse: “Olha, meu filho ou […] foi assassinado de surpresa ou ele se rendeu, porque a perfuração da bala foi de frente pra trás, entrou na palma da mão e saiu nas costas da mão”. De acordo com o depoimento de Paulo Roberto Silva Lima, amigo da vítima, na data de 17 de julho de 1996, o pai de Luiz Antônio tinha percebido que “quando uma bala penetra em algum local, o furo é pequeno, quando ela sai o furo é bem maior”. Como registrado no banco de dados do jornal Folha de S. Paulo, o deputado Nilmário Miranda, representante da Câmara na CEMDP, apontou inconsistências na versão oficial sobre as mortes de Otoniel e de Luiz Antônio. O depoimento do policial federal Emanuel Cerqueira Campos à Auditoria Militar também contestou a versão oficial apresentada pelo Exército. Segundo ele, a arma encontrada com Luiz Antônio era um revólver calibre 32 e, conforme informações do coronel Luiz Arthur de Carvalho, a bala que o atingiu era calibre 38. Os restos mortais de Luiz Antônio Santa Bárbara foram enterrados no cemitério Piedade, em Feira de Santana (BA).
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