Atuação Profissional
estudante universitárioOrganização
Ação Popular (AP), Ação Popular Marxista-Leninista (APML)Filiação
Justa Garcia Macedo Lacerda e Agostinho Nunes LacerdaData e Local de Nascimento
8/7/1949, Ituiutaba (MG)Data e Local de Morte
Desaparecimento em 28/10/1973, Recife (PE)Gildo Macedo Lacerda foi morto por agentes do DOI-CODI/IV, em 28 de outubro de 1973, junto com o companheiro de militância na APML, José Carlos Novaes da Mata Machado.Os dois tinham sido presos em dias e locais distintos – Mata Machado no dia 19 de outubro, em São Paulo, e Gildo no dia 22 de outubro, em Salvador – e transferidos para Recife, onde foram mortos sob tortura.
A versão oficial veiculada em jornais da época informava que Gildo Macedo Lacerda teria morrido junto com José Carlos da Mata Machado em um tiroteio provocado por outro colega de militância chamado “Antônio”. Segundo a nota oficial, os dois militantes da APML tinham sido presos e tinham confessado um encontro com esse terceiro colega na Avenida Caxangá, em Recife, no dia 28 de outubro de 1973.
Acompanhando as forças de segurança ao ponto de encontro para que fosse efetuada a prisão do suposto companheiro de organização, os dois militantes teriam sido baleados: “Antônio” teria percebido a presença dos policiais à paisana e disparado contra Gildo e José Carlos, conseguindo fugir na sequência. Anos mais tarde, em 1993, o Ministério da Aeronáutica enviou um relatório ao então ministro da Justiça, Maurício Correa, prestando explicações sobre alguns desaparecidos políticos.
Sobre Gildo, o relatório informava que é “dado como desaparecido pelos familiares, pela imprensa e por defensores dos Direitos Humanos e Assistência Judiciária da OAB/RJ”, mas reiterava que foi morto em tiroteio no dia 28 de outubro de 1973, junto com José Carlos da Mata Machado, reforçando a versão oficial. Essa versão buscou encobrir não só a morte de Gildo e de José Carlos, mas também o desaparecimento de Paulo Stuart Wright, que seria o “Antônio” mencionado na história, codinome usado pelo militante que acabou se tornando mais um desaparecido político da Ditadura Militar.
Essa tentativa de encobrir a morte dos militantes ficou conhecida como “Teatro de Caxangá”, em alusão ao caráter fantasioso do episódio. Em oposição à versão oficial, a CEMDP conseguiu reunir depoimentos de ex-presos políticos que viram os dois militantes no DOI-CODI de Recife sendo vítimas de torturas brutais, às quais não resistiram. Em declarações prestadas, Carlúcio de Souza Júnior afirmou que tanto Gildo como José Carlos chegaram às dependências do DOI-CODI de Recife quando ele se encontrava preso e que os dois ficaram na sala de interrogatório, onde foram submetidos a torturas, sendo possível ouvir seus gritos a noite inteira.
Segundo o depoente, na madrugada do dia 27 de outubro de 1973, quando foi levado para a sala de interrogatório, sentiu o cheiro forte de vômito, fezes e sangue, assim como pôde ouvir os gemidos de Gildo e de José Carlos. No dia seguinte, Carlúcio foi informado pelo companheiro de cela, Rubens Lemos, que os dois militantes não tinham resistido às torturas.
Gildo tinha sido preso em Salvador junto com a sua esposa Mariluci, no dia 22 de outubro de 1973, e já tinha sofrido torturas no Quartel do Barbalho, onde permaneceu até o dia 25, segundo o depoimento de Oldack de Miranda, que estava preso no mesmo órgão. Foi então transferido para o DOI-CODI do IV Exército, em Recife, onde, junto com José Carlos da Mata Machado, foi morto sob tortura no dia 28 de outubro de 1973.
Na época, os integrantes da APML vinham sendo rastreados por agentes da repressão com auxílio das informações fornecidas por Gilberto Prata Soares, ex-membro da AP e cunhado de José Carlos da Mata Machado, que trabalhou como informante para o Centro de Informações do Exército (CIE) a partir de março de 1973, identificando os militantes da Ação Popular. Foi instaurado, na época, um inquérito policial na Delegacia de Segurança Social de Pernambuco para apurar a morte dos militantes, mas acabou sendo arquivado em janeiro de 1974, por alegada ausência de elementos para o oferecimento de denúncia.
O relatório do inquérito policial, datado do dia 29 de novembro de 1973, registra que os corpos dos dois militantes foram levados ao Instituto Médico-Legal (IML) pelos sargentos José Mario dos Santos e Francisco de Azevedo Barbosa. Posteriormente, em 1995, o delegado Jorge Tasso de Souza, que assinou o ofício de encaminhamento dos corpos para o IML, declarou que estranhou o fato de os corpos terem sido conduzidos por militares do Exército e de não ter sido solicitada a presença de autoridades policiais.
Não foi emitida, na época, nenhuma certidão de óbito explicando a causa das mortes, e os corpos dos dois militantes não foram entregues às famílias. Tanto Gildo como José Carlos foram enterrados como indigentes no Cemitério da Várzea, em caixão de madeira sem tampa.
A família de José Carlos da Mata Machado conseguiu recuperar o seu corpo e sepultá-lo, algumas semanas após a morte. Por sua vez, os restos mortais de Gildo não foram, até o momento, localizados e identificados.
Diante das investigações realizadas, conclui-se que Gildo Macedo Lacerda foi preso e morto sob tortura por agentes do Estado brasileiro, restando desconstruída a versão oficial de tiroteio divulgada à época dos fatos. Essa ação foi cometida em contexto de sistemáticas violações de direitos humanos promovidas pela ditadura militar, instaurada no país em abril de 1964.
Recomenda-se a emissão da certidão de óbito de Gildo Macedo Lacerda, assim como a continuidade das investigações sobre as circunstâncias do caso, para a localização de seus restos mortais, identificação e responsabilização dos demais agentes envolvidos.
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