Depoimentos de militantes políticos afirmaram que José Raimundo da Costa foi preso em São Paulo (SP) e conduzido ao Rio de Janeiro (RJ). Entretanto, na falsa versão divulgada à época, José Raimundo teria morrido após reagir a elementos do Serviço de Segurança do Exército, no dia 5/8/1971, no Rio de Janeiro (RJ). Em um documento do DOPS, produzido no dia 05/08/1971, o comissário Jayme Nascimento, do DOPS/RJii, descreveu a falsa versão de tiroteio para a morte de José Raimundo da Costa, registrada como “Encontro de Cadáver de elemento subversivo. Morte por reação à prisão”, e informou que em uma travessa próxima à Rua Otacílio Nunes, em Pilares (RJ), [….] havia sido morto um elemento subversivo de nome José Raimundo da Costa, vulgo Moisés, quando reagiu à prisão numa diligencia efetuada por elementos pertencentes ao Serviço de Segurança do Ministério do Exército. Essa versão, no entanto, revelou-se falsa, após ser confrontada com documentos oficiais, a exemplo do registro de entrada do IML de José Raimundo e da perícia de local do ICE/RJ, além do depoimento de Inês Etienne Romeu, ex-presa política, sobre sua prisão na “Casa da Morte de Petrópolis”. A Certidão de Óbito registra a falsa versão de morte em tiroteioiii . Nesse sentido, há uma ficha dactiloscópicaiv , de 5 de agosto de 1971, que registra a entrada corpo de José Raimundo no IML/RJ com o nome de Odwaldo Clóvis da Silva. A despeito de já ter sido identificado e conhecerem o seu nome verdadeiro, a necropsia também foi lavrada com essa falsa identidade pelos legistas Hygino de Carvalho Hercules e Ivan Nogueira Bastos, que deram aval à falsa versão dos fatosv . No quesito do documento, em que consta pergunta se a morte teria ocorrido por meio de veneno, fogo, explosivo, asfixia ou tortura, ou por outro meio insidioso ou cruel, os legistas responderam que o item estava “prejudicado”. Os peritos que examinaram o local de morte registraram que os pulsos da vitima apresentavam hematomas. As marcas das algemas que prenderam seus pulsos são evidentes mesmo ao examinar-se a foto. Em 9 de setembro de 1971, José Raimundo foi enterrado como indigente no Cemitério de Ricardo de Albuquerque, no Rio de Janeiro, em seguida, seus restos mortais foram transferidos para um ossuário geral e, posteriormente, para uma vala clandestina, que seria descoberta nesse cemitério em 1990. Inês Etienne Romeuvi afirmou ter ouvido o torturador Laurindo informar aos torturadores Dr. Bruno e Dr. César, que José Raimundo havia sido preso. Dr. Pepe, outro torturador da “Casa da Morte” de Petrópolis disse a Etienne que José Raimundo havia morrido vinte quatro horas após a prisão. José Raimundo foi uma das vítimas do policial infiltrado José Anselmo dos Santos, o “Cabo Anselmo”, que narrou em documentos localizados no DOPS/SP o contato com o dirigente da VPR. Anselmo tinha interesse na eliminação de José Raimundo para, na sequência, assumir posição de dirigente na VPR, e assim controlar os demais militantes. O denominado “Relatório de Paquera”, elaborado por Anselmo, descreveu o contato prévio que teve com vítimas que seriam, posteriormente, executadasvii . O contato de “Cabo Anselmo” com José Raimundo foi uma das ações do agente infiltrado relacionadas à eliminação de membros da VPR, que culminariam na “Chacina da Chácara São Bento”, em Pernambuco, em 1973. O parecer da relatora do caso na CEMDPviii, Suzana Keniger Lisboa, considerou como prova da falsificação da versão de morte o depoimento da ex-presa política Inês Etienne Romeu, as marcas de algemas nos pulsos, o laudo com nome falso seguido do sepultamento como indigente e o contato e a delação do ex-cabo Anselmo. A falsa versão de tiroteio, portanto, teve o objetivo de omitir a morte sob torturas de José Raimundo.
Diante das circunstâncias do caso e das investigações realizadas, conclui-se que José Raimundo da Costa foi morto e vítima de desaparecimento em decorrência de torturas praticadas por agentes do Estado brasileiro, restando desconstruída a versão oficial de tiroteio divulgada à época dos fatos. Essa ação foi cometida em um contexto de sistemáticas violações de direitos humanos perpetradas pela Ditadura Militar instaurada no Brasil a partir de abril de 1964. Recomenda-se a retificação do atestado de óbito de José Raimundo da Costa, explicitando a morte decorrente de torturas praticadas por agentes do Estado brasileiro, assim como a continuidade das investigações sobre as circunstâncias do caso, para a identificação e responsabilização dos demais agentes envolvidos nas torturas e morte do militante político e a localização de seus restos mortais.