Atuação Profissional
jornalista, dirigente do Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR)Organização
Partido Comunista Brasileiro (PCB) e Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR)Filiação
Julieta Alves de Souza Vieira e Romualdo Leal VieiraData e Local de Nascimento
14/6/1923, Sento Sé (BA)Data e Local de Morte
17/1/1970, Rio de Janeiro (RJ)Mário Alves de Souza Vieira, um dos fundadores e secretário-geral do PCBR, foi perseguido e monitorado por órgãos de informação e repressão do Estado brasileiro em virtude de sua militância política. No dia 16 de janeiro de 1970, por volta das 20 horas, saiu de sua casa no subúrbio carioca de Abolição e nunca mais retornou. Foi sequestrado, preso ilegalmente e torturado por agentes do Estado nas dependências do Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna no Rio de Janeiro (DOI-CODI-RJ). As bárbaras torturas sofridas por ele foram testemunhadas por vários presos políticos, entre os quais René Carvalho, Antônio Carlos de Carvalho, e o advogado Raimundo Teixeira Mendes.
Raimundo narra alguns momentos de tortura sofridos por Mário Alves: […] que o preso [Mário Alves] não respondia às perguntas, que ouviram bater, que normalmente batiam com cassetete e “maricota”, tubo de borracha com furos; que falaram e o colocaram no “pau-de-arara” com choques elétricos, que houve um silêncio e, pela fresta, viu Mário Alves pendurado no “pau-de-arara” e como estava sem o capuz o reconheceu (…) que houve sessão de afogamento que havia ameaças de assassiná-lo caso não falasse, que poderiam sumir com ele, pois ninguém havia assistido a prisão; que pela manhã a gritaria se encerrou. Em ação movida pela família, a União foi responsabilizada pela prisão, tortura e morte, mas o corpo não foi entregue.
O martírio do dirigente comunista foi descrito na obra A Ditadura Escancarada, de Élio Gaspari, em trecho reproduzido no livro-relatório Direito à Memória e à Verdade, da CEMDP: Mário Alves ficou oito horas na Sala Roxa [onde ocorriam as torturas]. No início da manhã seguinte, o cabo da guarda chamou quatro prisioneiros para limpá-la. Num canto, havia um homem ferido. Sangrava pelo nariz e pela boca. Tinha sido empalado com um cassetete. Dois outros presos, militantes do PCBR, reconheceram-no, deram-lhe de beber e limparam-lhe o rosto. A mulher de Mário Alves, Dilma Borges Vieira, empreendeu uma peregrinação sem trégua para tentar obter alguma informação sobre o paradeiro do marido. Tornou-se uma das precursoras do movimento dos familiares de mortos e desaparecidos políticos.
No mesmo ano da morte de seu companheiro, em 1970, ela escreveu uma carta à esposa do cônsul brasileiro sequestrado no Uruguai, Aparecida Gomide, em que denunciou o assassinato de Mário Alves. Seguem alguns trechos: Todos conhecem o seu sofrimento, a sua angústia. A imprensa falada e escrita focaliza diariamente o seu drama. Mas do meu sofrimento, da minha angústia, ninguém fala. Choro sozinha. Não tenho os meus recursos para me fazer ouvir, para dizer também que “tenho o coração partido‟, que quero meu marido de volta. O seu marido está vivo, bem tratado, vai voltar. O meu foi trucidado, morto sob tortura, pelo 1º Exército, foi executado sem processo, sem julgamento. Reclamo o seu corpo. Nem a Comissão de Direitos da Pessoa Humana me atendeu. Não sei o que fizeram dele, onde o jogaram. Ele era Mário Alves de Souza Vieira, jornalista. Foi preso no dia 16 de janeiro do corrente, na Guanabara, pela polícia do 1º Exército e levado para o quartel da P.E., sendo espancado barbaramente de noite, empalado com um cassetete dentado, o corpo todo esfolado por escova de arame, por se recusar a prestar informações exigidas pelos torturadores do 1º Exército e do DOPS.
Alguns presos, levados à sala de torturas para limpar o chão sujo de sangue e de fezes, viram meu marido moribundo, sangrando pela boca e pelo nariz, nu, jogado no chão, arquejante, pedindo água, e os militares torturadores em volta, rindo, não permitindo que lhe fosse prestado nenhum socorro. Sei que a sra. não tem condições de avaliar meu sofrimento, porque a dor de cada um é sempre maior do que a dos outros. Mas espero que compreenda que as condições que levaram meu marido a ser torturado até a morte e o seu sequestrado não são as mesmas; que é importante saber que a violência-fome, violência-miséria, violência-opressão, violência-atraso, violência-terrorismo, violência-guerrilha; que é muito importante saber quem pratica a violência – os que criam a miséria ou os que lutam contra ela.
Mesmo com o reconhecimento da responsabilidade do Estado no desaparecimento e morte de Mário Alves de Souza Vieira, seu corpo nunca foi encontrado.
Diante das circunstâncias do caso e das investigações realizadas, a Comissão Nacional da Verdade conclui que Mário Alves de Souza Vieira foi privado de sua liberdade, por meio de prisão ilegal, e submetido a brutais torturas físicas e psicológicas, levadas a cabo por agentes do Estado brasileiro, as quais provocaram a sua morte. Essas ações foram perpetradas por agentes do Estado em um contexto de sistemáticas violações de Direitos Humanos, promovidas pela ditadura implantada no país a partir de 1º de abril de 1964.
Recomenda-se a localização dos restos mortais, a continuidade das investigações sobre as circunstâncias do caso para a identificação e responsabilização dos demais agentes envolvidos.
O Estado brasileiro utilizou uma série de mecanismos para amedrontar a população, sobretudo aqueles que não estivessem de acordo com as medidas ditatoriais. Conheça os reflexos do aparato repressivo e os focos de resistência na sociedade.