Atuação Profissional

estudante

Organização

Ação Libertadora Nacional (ALN)

Filiação

Beatriz Abi Eçab e João Abi Eçab

Data e Local de Nascimento

4/6/1943, São Paulo (SP)

Data e Local de Morte

8/11/1968, Vassouras (RJ)

João Antônio Abi-Eçab

João Antônio Abi-Eçab

João Antonio Santos Abi Eçab morreu no dia 8 de novembro de 1968, em um acidente automobilístico na rodovia BR 116, Km 69, na altura da cidade de Vassouras, Rio de Janeiro, quando seu carro colidiu contra a traseira de um caminhão. Sua esposa, Catarina Helena Abi Eçab, que encontrava-se com ele no veículo, também faleceu.

 

De acordo com testemunhas, João Antonio foi retirado do carro ainda com vida e morreu logo em seguida. O episódio que resultou na morte do casal ainda não foi plenamente esclarecido. A versão oficial, divulgada à época dos fatos, sustentava que o casal teria morrido em um acidente de carro. No veículo, teriam sido encontrados uma metralhadora, munição, dinheiro, livros e documentos pessoais das vítimas.

Consta no boletim de ocorrência que “foi dado ciência à Polícia às 20 horas de 8/11/68. Três policias se dirigiram ao local constatando que na altura do km 69 da BR-116, o VW 349884-SP dirigido por seu proprietário João Antonio dos Santos Abi Eçab, tendo como passageira sua esposa Catarina Helena Xavier Pereira (nome de solteira), havia colidido com a traseira do caminhão de marca De Soto, placa 431152-RJ, dirigido por Geraldo Dias da Silva, que não foi encontrado. O casal de ocupantes do VW faleceu no local. Após os exames de praxe, os cadáveres foram encaminhados ao necrotério local”.

A versão noticiada pela imprensa afirmava ainda que o acidente teria se dado durante viagem de lua de mel do casal. As investigações empreendidas assinalaram, contudo, a existência de uma série de indícios que apontam a improcedência da versão oficial, segundo a qual a morte do casal teria ocorrido sem a participação de agentes do Estado.

No dia 20 de novembro de 1968, o jornal Última Hora divulgou trechos do depoimento de testemunhas do acidente que colocavam em cheque a versão dos órgãos estatais. Em matéria intitulada “Marighella: Polícia procura casal de estudantes” uma testemunha, que manteve sigilo de sua identidade, revelou que o carro do casal estava sendo perseguido na estrada antes de colidir. Nos dias seguintes, o mesmo jornal publicou “Esta confusa história da metralhadora”. O texto que segue à manchete traz o depoimento do investigador da Delegacia de Vassouras, segundo o qual seria muito difícil um acidente ocorrer naquela altura da rodovia, uma vez que se tratava de um percurso reto de quatros quilômetros.

Outra testemunha ouvida pelo jornal, Júlio Hofgeker, além de reiterar a impossibilidade de acidente naquele trecho da estrada, relatou ter observado várias balas de revólver pelo chão. Júlio, que era constantemente chamado para auxiliar a polícia fotografando acidentes e outras ocorrências, foi impedido, na ocasião, de registrar fotograficamente as sacolas supostamente encontradas com o casal no local do acidente. Posteriormente, em abril de 2001, denúncias feitas pelo jornalista Caco Barcellos levantaram a hipótese de que Catarina e João teriam sido executados com tiros na cabeça. O jornalista entrevistara o ex-soldado, Waldemar Martins de Oliveira, que relatou ter visto o casal ser levado para um imóvel em São João do Meriti, pertencente a um oficial, onde teriam sido torturados e executados.

Segundo essa versão, o acidente não passaria de uma farsa para esconder a prática de tortura a qual Catarina e João Antonio teriam sido submetidos. Com base nesse relato, a família de Catarina concordou em exumar seus restos mortais. O laudo da exumação, elaborado pela Polícia Técnico Científica de São Paulo, contradisse a versão oficial e concluiu que sua morte foi consequência de “traumatismo crânio-encefálico” causado por “ação vulnerante de projétil de arma de fogo”.

Mais recentemente, em depoimento perante a CNV e a Comissão Rubens Paiva, Waldemar Martins de Oliveira afirmou que teriam participado da ação a equipe de Fred Perdigão e de outro agente chamado Miro, a quem não atribui identificação exata. A CEMDP, ao analisar o caso, no ano de 2005, concluiu que ambas as versões – a que sustenta que o acidente teria sido causado por perseguição ao veículo; e a que afirma que o acidente teria sido forjado para encobrir a prisão, tortura e execução do casal – eram verossímeis e indicavam que a morte de João Antonio e Catarina tinha ocorrido por ação de agentes do Estado brasileiro.

Belizardo dos Santos Jr, relator do caso na CEMDP, em testemunho dado à CNV e à Comissão da Verdade do estado de São Paulo Rubens Paiva, destacou que à época a polícia política foi a primeira a chegar ao local do acidente. Afirmou ainda que não houve perícia de local e nem mesmo laudo necroscópico. Frente a esses fatos, levantou a possiblidade de que as armas encontradas no carro tenham sido, na verdade, ‘plantadas’ no local para justificar a morte dos militantes e afastar a suspeita de participação do Estado no óbito.

Em 2014, a CNV elaborou um Laudo Pericial Indireto sobre o caso. As conclusões apontaram para a veracidade do acidente, ainda que não seja possível precisar com exatidão se houve perseguição ao carro. Apesar da colisão de fato ter ocorrido, o laudo pericial afirma, baseado no laudo de exumação anterior, que Catarina, que ocupava o banco passageiro, veio a óbito por conta de um projétil de arma de fogo, com o qual foi alvejada. Não foi possível, porém, aferir o momento da ocorrência do tiro ou de onde foi disparado.

O corpo de João Antonio, por sua vez, que guiava o carro no momento do acidente, não passou por exumação e perícia. Segundo a análise feita pelo Núcleo de Perícia da CNV, a partir dos documentos produzidos à época, o corpo de João apresentava lesões típicas de uma vítima que sofreu acidente de carro, como as “diversas lesões contundentes, impregnadas de sangue” nas “regiões frontal, orbital e nasal”. Para além desses fatos, as marcas de frenagem desenhadas no asfalto pelo Volkswagen ocupado pelo casal também indica a ocorrência da colisão, a qual tentou-se evitar acionando o sistema de freios.

O laudo concluiu que a causa de morte de João Antonio foi a colisão, ainda que não seja possível apontar para interferências externas que possam ter influenciado o acidente. Tal conclusão deriva da constatação de que a vítima “apresentava lesões produzidas quando em vida, resultantes daquelas típicas de colisão entre veículos”. Cabe ressaltar que, de acordo com o referido laudo pericial, as condições em que o casal viajava era ideal. O trecho onde ocorreu o acidente era reto (cerca de quatro quilômetros), asfaltado, possuía mão dupla, pista “delimitada por acostamento seguido de margens composta de vegetação rasteira”, estava seca no momento da batida e “sem quaisquer irregularidades ou deformações”.

Soma-se às condições da pista apresentadas no laudo o fato de os automóveis também estarem em perfeito estado: “os freios funcionavam de forma satisfatória, haja vista que foi constatada duas marcas pneumáticas de frenagem, de coloração escuro, retilínea”. A análise questiona, portanto, a ocorrência de um acidente comum e abre a possibilidade de interpretações que levem em consideração a participação do estado na ação, na tentativa de eliminar os militantes. Os restos mortais de João Antonio Santos Abi Eçab foram enterrados no Cemitério do Araçá, em São Paulo.

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