Segundo o livro “Dossiê Ditadura”, a comissão de familiares, os representantes de entidades de Direitos Humanos e parlamentares que visitou Xambioá, em abril de 1991, encontraram um processo policial arquivado na cidade – nº 105/90 de 17 de setembro de 1990 -, registrando a prisão de Lourival pelo exército, em 18 de maio de 1972. De acordo com o relatório da CEMDP, Lourival foi interrogado sob suspeita de subversão, na base militar de Xambioá (TO), torturado, levado à delegacia de polícia da cidade e, lá, encontrado enforcado em 21 de maio de 1972. O processo relata que ele “teria se suicidado com a corda da rede de dormir que o filho lhe trouxera. Era delegado em Xambioá, à época, Carlos Teixeira Marra, 2o Sargento da PM, e carcereiro, Salomão Pereira de Souza. Assina o laudo necroscópico o médico Manoel Fabiano Cardoso da Costa – CRM 267/AM.”. Em 17/09/1990, o Juiz de Araguaína (GO) Gilberto Lourenço Ozelane arquivou a investigação. Esta versão, do suicídio em 21 de maio, é registrada também pelo Relatório da Manobra Araguaia, de 30 de outubro de 1972, citado pelo livro da CEMDP e pelo relatório sobre o evento produzido pelo delegado de Xambioá, Carlos Teixeira Marra, sargento da PM em 25 de maio de 1972 destinado ao Juiz de Direito da Comarca de Araguaína de Goias, Dr. Victor Barbosa Lenza. iv O Encaminhamento no 212/ABS/SNI/1972 do Serviço Nacional de Informações v relata data diversa para a morte de Lourival, afirmando que suicidou-se em 28/05/1972, e o relatório do CIE, Ministério do Exército, vi também coloca esta data. O último documento, em página diversa – p. 32 – registra que ele teria morrido por afogamento. No Relatório do Ministério da Aeronáutica entregue em 1993 ao Ministro da Justiça consta que Lourival era militante do PC do B e guerrilheiro no Araguaia. vii Contudo, o processo de reparação movido pelo filho, Ruiderval Miranda Moura, perante à CEMDP viii registra depoimento do próprio Ruiderval à OAB/SP, em 25 de julho de 1991, negando estas versões. Ele relata que, em maio de 1972, seu pai foi preso em Marabá, transferido ao “tiro de guerra” – centro clandestino de tortura também conhecido como Casa Azul – em seguida, levado ao Pelotão de Investigações Criminais do Exército, em Brasília, e por fim até Xambioá. Ruiderval testemunha que foi informado do suicídio pelo Capitão Magalhães e pelo Sargento Marra e, chegando na cela do seu pai na delegacia de Xambioá, deparou-se com Lourival despido e com marcas vermelhas pelo corpo. Havia uma corda fina atada ao seu pescoço e presa a um gancho da parede a um metro do chão e esta corda não seria a mesma levada anteriormente por Ruiderval para pendurar a rede na cela. Em depoimento à Justiça Militar, em 16 de julho de 1973, também anexado aos autos do processo da CEMDP, ix o ex-preso político José Genoíno Neto narra que: “quando estava o interrogando na cadeia de Xambioá, na cela ao seu lado, foi enforcado um lavrador que se chamava Lourival Paulino”. Em entrevista ao jornalista Klester Cavalcanti, no livro O Nome da Morte, citado pelo livro da CEMDP, o ex-mateiro do exército Júlio Santana, declarou que Lourival foi torturado durante dois dias pelo delegado Carlos Marra e por militares do Exército antes de aparecer enforcado na delegacia. O livro Dossiê Ditadura afirma que, em maio de 1996, a CEMDP descobriu que o corpo de Lourival teria sido sepultado em Marabá (PA) pela sua filha Maria da Conceição Mota da Silva.
As circunstâncias da morte de Lourival Moura Paulino destoam da versão oficial do Estado de que teria se suicidado. O arquivamento do processo 105/90 – que apurava o ocorrido na delegacia de Xambioá –, sem uma fundamentação adequada, indica a falta de uma investigação diligente dos fatos. Conforme o exposto no parágrafo n o 128 da Sentença da Corte Interamericana no Caso Gomes Lund e outros: O Tribunal reitera que a obrigação de investigar violações de direitos humanos encontra-se dentro das medidas positivas que os Estados devem adotar para garantir os direitos reconhecidos na Convenção. O dever de investigar é uma obrigação de meios e não de resultado, que deve ser assumida pelo Estado como um dever jurídico próprio e não como uma simples formalidade, condenada de antemão a ser infrutífera, ou como mera gestão de interesses particulares, que dependa da iniciativa processual das vítimas, de seus familiares ou da contribuição privada de elementos probatórios. À luz desse dever, uma vez que as autoridades estatais tenham conhecimento do fato, devem iniciar, ex officio e sem demora, uma investigação séria, imparcial e efetiva. Essa investigação deve ser realizada por todos os meios legais disponíveis e deve estar orientada à determinação da verdade. Assim, recomenda-se a investigação das circunstâncias da morte de Lourival Moura Paulino e identificação e responsabilização dos demais agentes envolvidos, conforme sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos que obriga o Estado Brasileiro “a investigar os fatos, julgar e, se for o caso, punir os responsáveis e de determinar o paradeiro das vítimas”. Ainda, conforme resultado das investigações, retificar a causa mortis na certidão de óbito.