Era um período de reanimação geral dos movimentos políticos e das lutas sociais pelo país afora. Após a anistia, reorganizavam-se os partidos, surgia o Partido dos Trabalhadores (PT) e era fundada a Central Única dos Trabalhadores (CUT). A campanha salarial de 1980 dos metalúrgicos de São Bernardo foi preparada com centenas de reuniões e assembleias de até 100 mil pessoas. Foi organizado um Fundo de Greve para receber recursos e, em apoio, muitos setores da sociedade, em especial os estudantes, contribuíram nessa campanha.
![Cartaz da Central Única dos Trabalhadores de 1983](https://memoriasdaditadura.org.br/wp-content/uploads/2023/12/Cartaz-da-Central-Única-dos-Trabalhadores-de-1983-1024x695.jpg)
Os trabalhadores tinham uma lista de reivindicações: reposição da inflação, 15% de produtividade, piso salarial de Cr$12 mil (doze mil cruzeiros, a moeda brasileira na época), estabilidade no emprego, reajuste trimestral, jornada de 40 horas semanais, adicional de 100% nas horas extras, entre outras. Os empresários da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) responderam apenas com 3,5% de produtividade e piso inferior a CR$6 mil.
Em março, uma assembleia declarou a greve que começou sem a necessidade de piquetes, isto é, sem precisar que os trabalhadores que aderiram ao movimento impedissem a entrada dos demais colegas nas fábricas. A greve se estendeu por todo o ABC e por mais 17 cidades do interior de São Paulo.
O governo do general Figueiredo não aceitou a situação e se sobrepôs ao governador Paulo Maluf e à Fiesp, impondo uma intervenção em São Paulo. A ação de repressão chegou a contar com 8 mil soldados, 40 viaturas e 3 helicópteros do Exército, que faziam frequentes voos rasantes sobre as assembleias. O Tribunal Regional do Trabalho, pressionado pelo governo federal, decretou a ilegalidade da greve.
![Capa do Jornal da Vila, de abril de 1980, que afirma que a greve deve seguir mesmo sem a presença de Lula.](https://memoriasdaditadura.org.br/wp-content/uploads/2022/10/CEDEM_JORNAL_DA_VILA_ABRIL_DE_1980_N_24_001-755x1024.jpg)
Estava dado o pretexto para a escalada da repressão. Os sindicatos sofreram intervenção e 14 líderes dos trabalhadores foram presos, entre eles Lula, numa ação conjunta entre DOI-Codi, DOPS, Polícia Militar e Polícia Federal. Nos dias seguintes, mais prisões. O estádio da Vila Euclides e a Praça do Paço Municipal foram interditados pelas tropas. Os operários se reuniram na praça da igreja matriz, cercados por PMs armados de fuzis e metralhadoras. Eclodiram choques nas ruas. O governo instruiu a Fiesp a recusar qualquer negociação. A grande imprensa fez uma cobertura hostil e deformada da greve.
No final de abril, a paralisação era de 90% dos trabalhadores em São Bernardo (“furar a greve é trair Lula e os outros companheiros presos”, defendiam).
O Fundo de Greve recebia crescente solidariedade, na medida em que a greve se tornava um confronto da classe operária contra a ditadura. O bispo de Santo André, dom Cláudio Hummes, apoiava a greve e coordenava a ajuda dos católicos. Parlamentares formaram uma delegação que fez uma visita de apoio aos grevistas.
O 1º de maio de 1980 se tornou um verdadeiro dia de luta para os trabalhadores. Mais de 100 mil pessoas foram ao largo da matriz, furando o bloqueio policial. Sob grande tensão, os grevistas e seus apoiadores conquistaram a reabertura do estádio e para lá se dirigiram em massa. Após 41 dias, a greve não tinha mais como se sustentar. Apesar dos apoios, faltava comida nas casas dos operários e eles voltaram ao trabalho, prometendo continuar a resistir dentro das fábricas. Lula e seus companheiros deixaram a prisão.
Depois de quase quinze anos de crescimento acelerado, a economia do país recuou: o desemprego rondava a casa dos 7%, em 1983 e 1984, um recorde histórico. Só em janeiro e fevereiro, a indústria paulista havia demitido mais de 47 mil trabalhadores.
Em 1983, ocorreram novas tensões no setor trabalhista, com o aumento do desemprego. O descontentamento social era grande e já em abril ocorreram manifestações nos Estados governados pela oposição.
Em São Paulo, uma passeata de desempregados no bairro de Santo Amaro gerou saques e depredações em várias regiões da cidade, os quais ficariam depois conhecidos como os “saques de abril”. Os tumultos se repetiram por três dias e chegaram ao Palácio dos Bandeirantes, a sede do governo estadual, que teve sua grade derrubada e seus jardins invadidos. O governador Franco Montoro recebeu líderes dos manifestantes e prometeu adotar medidas contra o desemprego.
No Rio de Janeiro, nos mesmos dias, supermercados, lojas e caminhões foram saqueados e ônibus, apedrejados em bairros diferentes. Ao longo do ano, outras manifestações pontuais desse tipo se repetiram.
Em julho do mesmo ano, uma greve geral contra o arrocho salarial foi organizada e paralisou cerca de três milhões de trabalhadores em todo o Brasil, das mais variadas categorias. Era a primeira greve geral em 19 anos. O governo militar reprimiu duramente o movimento, intervindo em sindicatos, cassando dirigentes e prendendo trabalhadores.
As greves do movimento operário haviam produzido uma vitória política irreversível: a mudança do cenário político nacional, já que as forças de oposição cresceram e a ditadura ficou sem condições de levar adiante seu projeto de institucionalização do regime. As eleições de 1982, com importantes vitórias da oposição, já refletiram essa nova correlação de forças.