Atuação Profissional
jornalista e professorOrganização
Movimento de Libertação Popular (Molipo)Filiação
Giulietta Sguazzardo Benetazzo e Pietro BenetazzoData e Local de Nascimento
1º/11/1941, Verona (Itália)Data e Local de Morte
30/10/1972, São Paulo (SP)Antônio Benetazzo completaria 31 anos de idade quando foi morto por agentes do Estado brasileiro. A versão divulgada por comunicado dos órgãos de segurança, cinco dias após a morte, informava que ele teria sido detido e, depois de conduzir os policiais para um suposto “ponto” na rua João Boemer, no Brás, teria se jogado sob as rodas de um caminhão, cometendo suicídio.
Essa versão foi parcialmente reproduzida na edição do Diário da Noite, de 2 de novembro de 1972: “(…) os órgãos responsáveis pela segurança interna conseguiram localizar, no último sábado, um ‘aparelho terrorista’ pertencente ao Molipo (Movimento de Libertação Popular), prendendo o subversivo Antônio Benetazzo. Durante o interrogatório, Benetazzo indicou que teria um encontro com um companheiro de sua organização na segunda-feira seguinte, dia 30 às 15 horas, na rua João Boemer, no Brás. Na hora aprazada, compareceram ao local o terrorista preso e os agentes de segurança, oportunidade em que Benetazzo, conseguindo se desvencilhar das autoridades, tentou empreender fuga, atravessando, em desabalada carreira, a rua João Boemer, foi colhido pelas rodas de um caminhão marca Scania Vabis, que não conseguiu frear a tempo. Caiu mortalmente ferido, falecendo a caminho do pronto socorro. Ainda durante o interrogatório a que foi submetido, Benetazzo forneceu às autoridades o endereço de outro membro do Molipo. Perto das 20 horas da última segunda-feira, os agentes perceberam que dois homens entraram na casa tendo sido perseguidos pelas autoridades. Houve violenta troca de tiros e um dos terroristas caiu morto, mais tarde identificado como João Carlos Cavalcante Reis enquanto que o segundo, ferido na perna, conseguiu fugir (…)”.
Em documento do arquivo do antigo Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo (DOPS/SP), marcado como “secreto”, é confirmada a versão de suicídio, assim como os relatórios dos ministérios da Marinha e da Aeronáutica encaminhados ao ministro da Justiça Maurício Corrêa, em 1993. Passados mais de 40 anos, as investigações sobre esse caso revelaram, entretanto, que a versão divulgada à época não se sustenta. Investigações dos familiares de Benetazzo confirmaram que não teria ocorrido nenhum acidente na região naquele dia.
De fato, conforme consta no requerimento de indenização da família à Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, sua prisão teria ocorrido no dia 28 de outubro de 1972, ao entrar na casa do operário e militante político Rubens Carlos Costa, na Vila Carrão, zona leste de São Paulo (SP), onde teria sido surpreendido com a presença de policiais que o levaram detido para a sede do Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna, DOI-CODI do II Exército, em São Paulo, onde permaneceu até ser morto sob tortura. Dois dias antes da sua morte se tornar conhecida publicamente, Benezatto já havia sido enterrado como indigente no Cemitério D. Bosco, em Perus.
O corpo de Benetazzo teria sido visto, ainda, no Instituto Médico-Legal de São Paulo (IML/SP) por familiares de outro militante político morto pela repressão, João Carlos Cavalcanti Reis, quando estiveram no local. Confirmando a versão dos órgãos da repressão, o laudo dos legistas Isaac Abramovitc e Orlando José Bastos Brandão relata a versão de morte por atropelamento no Exame Necroscópico. Em audiência sobre o caso, realizada pela Comissão da Verdade de estado de São Paulo Rubens Paiva (CEV-RP) em 12 de agosto de 2013, Renan Quinalha afirma que “legistas fizeram observações sobre o laudo de necropsia sobre Antônio Benetazzo na segunda metade da década de 1990”.
A análise concluiu que o exame necroscópico foi acusado de imprecisão, inclusive, de ausência de nomenclatura técnica adequada. Os médicos responsáveis por reanalisarem o exame apontaram que as lesões apresentadas no corpo não condiziam com a versão do atropelamento. Assim, ao avaliar fotos no arquivo do DOPS/SP, identificou-se que alguns ferimentos foram ignorados no laudo da época da morte, a exemplo de um ferimento à bala que teria provocado lesões no rosto, o qual sugeria que a morte não teria sido provocada por atropelamento e sim por esse ferimento, causado por arma de fogo, que teria sido disparada, quando se encontrava encostada ao crânio.
Durante a mesma audiência em homenagem a Antônio Benetazzo, Amélia Teles, que esteve detida com Rubens Carlos no DOPS/SP, em 1973, relatou que o corpo dele trazia marcas de graves queimaduras. Ao ser indagado sobre a causa, Rubens Carlos respondeu que, em um ato de desespero para salvar a vida do amigo, tinha tentado incendiar a casa em que estava para avisar o companheiro Benetazzo que um cerco policial o esperava no local. Infelizmente, o cerco do DOI-CODI contava com um efetivo dentro e fora da casa, o que resultou na prisão de Benetazzo. Na mesma audiência pública da CEV-RP, Alípio Freire, ex-militante da Ala Vermelha, fez questão de relembrar os graves impactos que a repressão política teve na vida familiar de todos os perseguidos.
No caso de Antônio Benetazzo, a prisão arbitrária e a morte sob torturas o impediram de conhecer sua filha, que ainda estava sendo gestada por sua companheira, Maria Aparecida Horta, em 1972. O corpo de Antônio Benetazzo teria sido enterrado como indigente, no Cemitério de Perus, no dia 31 de outubro de 1972, dois dias antes da divulgação da sua morte. Apesar de ter sido vítima de desaparecimento, posteriormente seus familiares conseguiram que seus restos mortais fossem trasladados.
Diante das investigações realizadas, concluiu-se que Antônio Benetazzo foi morto por agentes do Estado, em contexto de sistemáticas violações dos direitos humanos promovidas pela Ditadura Militar implantada em abril de 1964.
Recomenda-se a retificação da certidão de óbito de Antônio Benetazzo, assim como a continuidade das investigações sobre as circunstâncias do caso, para a identificação e responsabilização dos demais agentes envolvidos.
O Estado brasileiro utilizou uma série de mecanismos para amedrontar a população, sobretudo aqueles que não estivessem de acordo com as medidas ditatoriais. Conheça os reflexos do aparato repressivo e os focos de resistência na sociedade.