Cara a cara - 2 - jul. a dez. 78

Atuação Profissional

advogado

Organização

Movimento de Libertação Popular (Molipo)

Filiação

Paulina Back e Edmundo Preis

Data e Local de Nascimento

8/7/1934, Forquilhinha (SC)

Data e Local de Morte

15/2/1972, Paraíso do Norte (GO, hoje TO)

Arno Preis

Arno Preis

Arno Preis morreu em 15 de fevereiro de 1972 por ação dos órgãos de repressão na cidade de Paraíso do Norte (atual Paraíso do Tocantins), à época pertencente ao estado de Goiás, hoje Tocantins.

 

Documentos oficiais provenientes do Departamento de Ordem Social e Política de São Paulo (DOPS-SP) apontam que, naquele período, havia no interior do Movimento de Libertação Popular (Molipo) um agente da repressão infiltrado. Um indicativo que comprova tal fato são as inúmeras prisões e mortes de militantes desta organização a partir de novembro de 1971. Outra evidência desse contexto de perseguição organizada foi a presença ostensiva de diferentes órgãos da repressão na região, ocasião em que ocorreram as mortes e os desaparecimentos.

 

A versão oficial sobre sua morte foi veiculada em jornais de grande circulação. Matéria da Folha de S. Paulo, de 22 de março, apontou que Arno teria sido morto ao reagir a uma abordagem policial. Segundo essa versão, no dia 15 de março, noite de carnaval, Arno estaria no Bar São José, sede do Clube Social de Paraíso do Norte, quando em um dado momento, teria sido abordado por agentes da repressão. O policial militar Luzimar Machado de Oliveira teria lhe pedido que se identificasse, ao que Arno teria informado o nome falso que usava, Patrick McBurdy Cormick. Na mesma situação, o militante teria solicitado informações acerca de um local para dormir, recebendo como resposta que a única possibilidade que ficava a dois quilômetros do lugar em que se encontravam, tendo o policial apontado para um senhor, também chamado Luzimar, que seria motorista de táxi.

 

O policial Luzimar, na sequência, pediu a Arno que apresentasse seu porte de arma, já que aparentava levar um revólver. Em resposta, a vítima teria dito não possuir porte, o que fez com que os policiais o convidassem a comparecer à Delegacia de Polícia. Naquele momento, recusando-se a acompanhar os agentes da repressão, teria sacado o revólver e disparado contra dois policiais e, em seguida, corrido rumo a um terreno baldio próximo. Outro policial, Benedito Luiz Paiva, do DOPS-GO, em depoimento, assumiu que atirou em Arno, atingindo-o em uma das pernas quando este fugia da primeira abordagem e que, posteriormente, encontrou-o atrás de uma árvore.

 

Todos os policiais que falaram sobre o caso confirmaram em depoimento que Arno foi cercado e morto a tiros, contudo, além das dúvidas acerca da veracidade da versão oficial apresentada, não mencionaram os inúmeros ferimentos à faca ou à baioneta que Arno apresentava em seu corpo. De acordo com o relato de Ivo Sooma, amigo de Arno, o policial Luzimar sacou sua arma e, em seguida, buscando se proteger, a vítima atirou nele e em Gentil da Costa Mano, o outro policial militar presente na situação, correndo em seguida. Enquanto corria, foi atingido na perna por um tiro disparado por Benedito.

 

O laudo de necropsia, registrado com seu codinome, Patrick, apresenta de maneira genérica a causa da morte como decorrente de “hemorragia interna, possivelmente produzida por projétil de arma de fogo” e considerável quantidade de orifícios que se assemelhavam a tiros, provavelmente de calibre 38. Mesmo sendo vago, o documento traz indícios de que Arno poderia não ter morrido em tiroteio, diante da presença de extensas feridas produzidas por instrumento cortante, que seria faca ou baioneta.

 

A Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos (CEMDP), logo após a descoberta de seus restos mortais, solicitou parecer do perito Celso Nenevê, que elaborou um laudo sobre o caso. O referido levantamento reforçou a suspeita de que Arno talvez ainda estivesse vivo e imobilizado quando foi cortado por um destes instrumentos pérfuro-cortantes. Posteriormente, o jornalista Luiz Maklouf Carvalho revelou a participação do então coronel do Exército Lício Augusto Ribeiro Maciel na morte de Arno, o que colaborou na desconstrução da versão oficial de morte em tiroteio decorrente de encontro casual com os agentes da repressão. Maklouf, ao se dirigir ao então ministro Nilmário Miranda, apresentou trechos da entrevista realizada com o coronel, na qual ele confirma que Arno foi “eliminado” quando estava “acuado num matagal às margens da rodovia”. Como o militante não se entregou, de acordo com Lício, ele foi alvejado pelos militares que, se utilizando de faróis de caminhões, conseguiram iluminar a área para evitar a fuga. Ainda de acordo o coronel: “foi preparada uma cortina de chumbo quente e ele que escolheu”.

 

O corpo de Arno foi entregue ao coveiro Milton Gomes, que trabalhava no cemitério de Paraíso do Norte, no mesmo dia de sua morte, sem identificação e atestado de óbito e com a recomendação de que fosse enterrado imediatamente e de “qualquer jeito” já que se tratava de um “porco”. O coveiro não questionou a determinação policial naquele momento mas, ao observar aquele corpo, disse a si próprio: “Isso não é um porco, este é um homem. Alguém um dia virá procurar por ele”. Neste instante, tomou a decisão de construir uma pirâmide de pedra e colocar uma cruz de madeira sobre a sepultura para delimitar o local.

 

Arno foi enterrado com o nome de Patrick McBurdy Cormik. De acordo com Milton, aproximadamente dez dias depois, o cemitério foi cercado por grande aparato policial. Os agentes policiais ordenaram, então, que o cadáver fosse desenterrado e as mãos fossem amputadas, fato confirmado posteriormente pela exumação. A atitude do coveiro em identificar o jazigo de Arno foi decisiva para que, 21 anos depois, seu corpo fosse localizado. A localização de seus restos mortais ocorreu apenas em 1993, após longas e difíceis buscas realizadas por seu amigo Ivo Sooma. Com o apoio da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos e da Comissão de Representação Externa da Câmara Federal, foram feitas a exumação e a identificação da ossada, esta última realizada pelo Instituto Médico-Legal do Distrito Federal, que confirmou se tratar mesmo de Arno.

 

A Comissão Estadual da Verdade Tereza Urban, do Estado do Paraná, realizou, em 5 de agosto de 2014, audiência pública sobre o caso de Arno e outros militantes políticos mortos e desaparecidos, da qual participaram seus irmãos João e Helga Preis. Arno foi sepultado, à época dos fatos, no cemitério de Paraíso de Tocantins, estado de Tocantins. Posteriormente, após a descoberta de seus restos mortais, e depois de ser homenageado na Faculdade de Direito da USP e na Assembleia Legislativa de Santa Catarina, foi levado para Forquilhinha (SC), cidade onde nasceu, e enterrado em 3 de maio de 1994, no cemitério da cidade.

 

A Comissão Nacional da Verdade localizou documento que reforça a versão de perseguição e execução premeditada de Arno Preis. Trata-se de documento produzido pela agência de Brasília do Serviço Nacional de Informações (SNI), produzido em 2 de maio de 1972, dois meses e meio após a morte de Arno. Por meio do documento, a Agência Brasília do Serviço Nacional de Informações encaminhou à Presidência da República um relatório, produzido pelo DOI-CODI do Comando Militar do Planalto, DOI/3a Brigada de Infantaria e CIE, tratando da Operação Ilha, cujo objetivo foi “localizar e desbaratar núcleos terroristas instalados no Norte do Estado de Goiás, constituídos por elementos da Aliança [sic] Libertadora Nacional (ALN), procedentes de Cuba”.

 

Em que pese o documento não fazer referência nominal a Arno Preis, ele é bastante claro acerca da operação de perseguição montada no norte do estado de Goiás, onde Arno foi localizado e morto. O documento sobre a Operação Ilha faz referência nominal aos seguintes militantes do Molipo: Jeová de Assis Gomes, apontado como o chefe do grupo; Boanerges de Souza Massa; Ruy Carlos Vieira Berbert; Sergio Capozzi; Jane Vanine e Otávio Ângelo.

Sobre
Saiba mais sobre o projeto, realizadores e seus objetivos.
Apoio ao Educador
Aplique o conteúdo sobre a ditadura no Brasil na sala de aula para ampliar o estudo da História do Brasil e a formação da cidadania com o suporte de sequências didáticas e a promoção do protagonismo dos alunos. Consulte sequências didáticas que poderão auxiliar os educadores a trabalharem o tema da ditadura militar brasileira em sala de aula.
Projetos
Visite a galeria de projetos especiais realizados pelo Instituto Vladimir Herzog na promoção da Memória, Verdade e Justiça no Brasil, e na difusão de histórias inspiradoras de luta.
Acervo
Explore uma diversidade de conteúdos relacionados ao período da ditadura militar brasileira que ocorreu entre 1964 e 1985.
Memória Verdade e Justiça
Os direitos da Justiça de Transição promovem o reconhecimento e lidam com o legado de atrocidades de um passado violento e de um presente e futuro que precisam ser diferentes, para que se possa dizer: “nunca mais!”. Conheça algumas medidas tomadas pelo Estado e sociedade brasileiros para lidar com o que restou da ditadura de 1964.
Cultura e Sociedade
Apesar do conservadorismo e da violência do regime, a produção cultural brasileira durante a ditadura militar se notabilizou pelo engajamento político e desejo de mudança. Conheça um pouco mais sobre as influências do período em diversos setores da sociedade.
Repressão e Resistência

O Estado brasileiro utilizou uma série de mecanismos para amedrontar a população, sobretudo aqueles que não estivessem de acordo com as medidas ditatoriais. Conheça os reflexos do aparato repressivo e os focos de resistência na sociedade.