Na tarde do dia 13 ou 14 de setembro de 1973 – poucos dias após o golpe de estado que derrubou o presidente Allende – encontravam-se no apartamento de Luiz Carlos três casais: Luiz Carlos e sua companheira Linovita Nogueira Magalhães, que chegara do Brasil na véspera do golpe; João Antonio Arnoud Herédia e Maria Lucia Wendel de Cerqueira Leite, que para lá se dirigiram depois do golpe por entender que o local era mais seguro que a própria residência, perto do Palácio La Moneda; Carmen Fischer, que residia no Chile desde março daquele ano, e seu marido Luiz Carlos de Almeida Vieira que chegara alguns dias antes para encontrá-la. Por volta das 18h, quando João Herédia havia saído um instante, militares chilenos – não se sabe de que Força – invadiram o apartamento e ordenaram aos presentes que ficassem com as mãos contra a parede enquanto revistaram o apartamento, levando consigo livros, jornais e documentos políticos, envoltos em lençóis arrancados das camas. Luiz Carlos de Almeida e Luiz Carlos de Almeida Vieira foram levados para a delegacia do bairro, onde foram somente identificados e aguardaram em uma cela por algumas horas, até serem levados para o Estádio Nacional, transformado naqueles dias em centro de detenção. O relato que se segue é do próprio Luiz Carlos Vieira: O estádio parecia estar iluminado para uma noite de futebol. Ainda não sabíamos que o haviam transformado em uma enorme sala de tortura, humilhação e morte. Passamos por uma fileira de soldados. Logo seguimos por um longo corredor cujas paredes eram formadas por corpos humanos, os braços estendidos para o ar, os rostos voltados para as paredes de pedra do corredor do estádio. Chegamos ao que parecia ter sido um dos vestuários, agora transformado em sala de tortura. Um militante uruguaio acabava de ser castigado. Um oficial veio recolher nossos documentos de identificação. A sessão de tortura iniciou-se. O interrogatório girava em torno de um suposto esconderijo de armas, o qual era completamente desconhecido para nós. Diante da resposta negativa, o oficial decidiu que, juntamente com o militante uruguaio, devíamos deixar o estádio. Todas essas viagens foram feitas em uma camioneta, onde íamos acompanhados de dois ou três soldados armados, sempre seguidos de perto por um caminhão com mais soldados. A última viagem levou-nos às margens do rio Mapocho. Os soldados mostravam-se nervosos e agiam com violência. Já não havia dúvida sobre qual seria o nosso destino. Luiz Carlos tentou argumentar com os soldados, mostrando-lhes o absurdo e o inumano de tal situação. Mas naquele momento já não regia nenhuma lei, nem a dos homens nem a de Deus. O uruguaio encaminhou-se para a beira do rio e jogou-se nas águas, sendo imediatamente metralhado por um soldado. O oficial mandou Luiz Carlos fazer o mesmo. Um soldado seguiuo e disparou demoradamente. Depois foi a minha vez. Das três balas que me atingiram, uma pegou de raspão na cabeça, fazendo-me perder os sentidos por algum momento. Quando recuperei a consciência, senti-me levado pela leve correnteza do rio, ouvi as vozes dos soldados, vi as luzes dos caminhões refletirem-se nas águas do rio, iluminando os corpos inertes de meus companheiros. Era o único sobrevivente. Luiz Carlos Vieira, ferido, foi resgatado por religiosos e acolhido na Embaixada da Suécia, de onde partiu para aquele país, no qual fixou residência. O corpo de Luiz Carlos de Almeida teria sido visto por vizinhos, às margens do Mapocho, no dia seguinte ao fuzilamento. Não há registro de sua prisão, que não foi oficializada, nem de seu óbito. Não se sabe que destino tiveram seus restos mortais. Em 1993, o deputado Nilmário Miranda, que presidia a Comissão Externa sobre Desaparecidos da Câmara Federal, denunciou o desaparecimento de Luiz Carlos à Corporação Nacional de Reparação e Reconciliação (CNRR), que deu seguimento, no Chile, aos trabalhos da Comissão de Verdade e Reconciliação (Comissão Rettig). A Comissão Externa esforçou-se por reunir informações e obter depoimentos de testemunhas do seqüestro de Luiz Carlos para subsidiar a apreciação do caso pela CNRR, que em 10/12/93 reconheceu oficialmente sua condição de detido-desaparecido, nos seguintes termos: “Considerando os antecedentes reunidos e a investigação realizada por esta Corporação, o Conselho Superior chegou à convicção de que Luiz Carlos de Almeida foi detido e desaparecido por agentes do Estado enquanto era mantido privado de liberdade. Por tal razão, declarou-o vítima de violação de direitos humanos”. Em dezembro de 2012 foi instaurado perante a Corte de Apelações de Santiago, pelo Ministério do Interior do Chile (Programa Continuación de la Ley n°19.123), o processo criminal Rol no 368-2012, distribuído ao 34o Juzgado del Crimen, para investigar e apurar responsabilidades no sequestro e homicídio qualificados de Luiz Carlos de Almeida. A CNV teve acesso aos autos judiciais, colaborou com os dados de que dispunha e transmitiu cópia dos autos ao Ministério Público Federal, para facilitar o acompanhamento e o assessoramento cabível aos responsáveis pelo processo no Chile. A Comissão Estadual da Verdade do Estado de São Paulo realizou no dia 29/8/2013 audiência pública sobre o caso de Luiz Carlos Almeida, mas nada de novo logrou apurar.
Diante das circunstâncias do caso, a Corporação Nacional de Reparação e Reconciliação do Chile declarou expressamente haver convicção de que Luiz Carlos de Almeida foi detido por agentes do Estado chileno que o fizeram desaparecer enquanto era mantido privado de liberdade. Até hoje, não foi possível identificar os autores de seu sequestro e morte, e as investigações prosseguem naquele país. Seu corpo nunca foi localizado. Recomenda-se prestar a assistência cabível aos trabalhos de investigação levados a efeito no Chile, para o esclarecimento das circunstâncias do desaparecimento de Luiz Carlos de Almeida, a localização de seus restos mortais e identificação e responsabilização dos agentes envolvidos.