Atuação Profissional
vendedorFiliação
Mon Serrat Nuet e Miguel Sabat NuetData e Local de Nascimento
12/3/1923, Barcelona (Espanha)Data e Local de Morte
30/11/1973, Departamento de Ordem Política e Social, São Paulo (SP)Segundo os órgãos da repressão, Miguel Sabat Nuet foi encontrado morto em uma cela do Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo (DOPS/SP) no dia 30 de novembro de 1973. Conforme versão divulgada pelos órgãos da repressão, ele teria cometido suicídio. Na documentação referente ao caso, encontrada pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos nos arquivos do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS/SP), em 1992, há um relato das circunstâncias e dos responsáveis pela detenção de Miguel Sabat Nuet.
Relata-se que uma mala fora abandonada em um trem, por um passageiro, muito agitado e nervoso, que desceu do veículo em movimento na estação Barra Funda, em São Paulo (SP). No informe, consta a descrição física do passageiro e a anotação: “passado telex nº 23509 para capturar o Miguel Sabat Nuet.” Na mala que Miguel carregava, foram encontrados documentos pessoais, tais como recortes de jornais, revistas, anotações em cadernos, fotografias, informações pessoais e cartas escritas a próprio punho que comprovavam a perseguição política ao militante. Um ofício do delegado do DOPS, Adolpho Magalhães Lopes, encaminhado ao DOI/CODI de São Paulo, revela que Miguel foi abordado por agentes policiais no referido dia às 16h30 e, posteriormente, encaminhado ao DOPS, às 19h30 para inspeção.
A documentação contém igualmente indícios que permitem considerar que houve interesse em alterar as circunstâncias de morte de Miguel Nuet, já que, conforme consta no Dossiê Ditadura: Mortos e Desaparecidos Políticos no Brasil (1964-1985), a requisição de exame ao IML foi marcada com a anotação “T” – referência feita àqueles considerados “terroristas” pelos agentes da repressão.
Dos documentos constam, ademais, a relação de 19 presos, datada de 12 de dezembro de 1973, assinada por José Aírton Bastos e Manoel Nascimento da Silva, em que constam informações de alguns estrangeiros, “presos à disposição das autoridades”, que estavam em situação irregular ou que aguardavam para serem expulsos do país. Contudo, o seu caso estava sujeito às decisões do departamento de “ordem social”, tal como apontado pelo documento. Após sua morte, o exame necroscópico atestou que ele teria se enforcado na própria carceragem do DOPS/SP, em 30 de novembro de 1973. Seu corpo chegou ao cemitério Dom Bosco, em Perus, São Paulo, no mesmo dia em que os corpos de Antônio Carlos Bicalho Lana e Sônia Maria de Moraes Angel Jones. Teriam, portanto, sido sepultados juntos. Com a descoberta da Vala de Perus, em 1989, a ossada de Miguel foi encontrada, embora somente em 2008 tenha sido possível o reconhecimento de seus restos mortais.
Após descobertas feitas sobre a “Operação Condor”, e em decorrência de constantes averiguações feitas pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos e pelo jornalista da Folha de S.Paulo, Rubens Valente, os familiares de Miguel Sabat Nuet foram identificados na Espanha e na Venezuela. A partir de então, o Ministério Público Federal (MPF) de São Paulo instaurou ação para localizar seus parentes, a fim de ser realizada a coleta de sangue para reconhecimento da ossada. Em 1º de abril de 2008, seus restos mortais foram exumados e, no dia 28 de agosto de 2008, a imprensa divulgou que o laboratório Genomic Engenharia Molecular havia comprovado que a ossada realmente referia-se a ele. A matéria intitulada “Família quer apurar morte de espanhol durante a ditadura”, de 20 de janeiro de 2008, da Folha de S.Paulo, afirma que Miguel Sabat foi preso no dia 9 de outubro de 1973 pelo DOPS, para “averiguação de subversão” e, após um mês e meio, foi encontrado morto na cela, num suposto caso de suicídio.
Explica-se que, durante 13 anos, não se pôde averiguar o caso porque a família de Nuet não havia sido encontrada para obter a identificação e exumação dos restos mortais. Menciona-se também que a guia de enterro foi emitida pelo Serviço Funerário indicando que havia sido sepultado no terreno 485 da quadra 7 do Cemitério Dom Bosco, no mesmo dia e ao lado dos militantes da ALN Sônia Maria Moraes Angel Jones e Antonio Carlos Bicalho Lana, em 1º de dezembro de 1973.
Na matéria “Filha quer exumação do corpo para saber o que aconteceu”, da Folha de S.Paulo, de 20 de janeiro de 2008, Maria del Carmen e Minerva Sabat, com quem Miguel manteve contato durante seus 23 anos de vida na Venezuela, afirmaram: “nunca acreditamos em suicídio, mesmo porque, em um dos documentos que vimos na embaixada brasileira em Caracas, constava que ele tinha fraturas. Para nós, Miguel foi torturado até a morte”. Outra matéria do mesmo jornal, intitulada “Procuradoria quer localizar corpo de espanhol morto” e datada no dia 22 de janeiro de 2008, menciona que o MPF entrou com ação para tentar localizar a sepultura de Miguel Nuet, sendo que a procuradora da República Eugênia Favero relatou dificuldades para localizar o corpo, em virtude da desorganização do cemitério de Perus e mudança na numeração dos locais onde estariam os corpos.
O jornal traz, também, importante depoimento da Sônia Miriam Draibe, que ficou presa no DOPS, no mesmo período em que Miguel. Na matéria intitulada “Ex-militante se lembra de gritos de ajuda em espanhol vindos da pior cela do DOPS”, ela afirma ter ouvido Nuet gritar da cela “conhecida como “fundão‟ ou “forninho”, pedindo por ajuda. Segundo sua descrição: “Sempre ouvimos descrições horrorosas sobre aquela cela. Isolavam a pessoa com uma punição. Era uma tortura. (…) Lembro bem dos gritos, duravam o dia todo. Ele repetia brados, gritos e invocações. Dizia: “Maria, Socorro, Maria del Socorro‟, “Santa Maria‟, “Ajuda-me‟, recordou-se Sônia.” Sônia afirma que o argentino era a única pessoa presa do DOPS entre os dias 23 a 26 daquele mês, sendo transferida para o DOI-CODI após essa data. Aborda, ainda, que o delegado Sérgio Fernando Paranhos Fleury era o responsável pelos interrogatórios na delegacia.
O parecer do conselheiro Augustino Pedro Veit, de 15 de outubro de 2008, anexado aos autos do dossiê da CEMDP, foi favorável ao reconhecimento de Miguel Sabat como militante político, sob o argumento de que os documentos apresentados retratam a perseguição sofrida, com posterior prisão no DOPS/SP, e seu sepultamento como indigente em Perus, com indícios de que teria sido torturado até a morte. O ofício n°200/AT-GAB.PREF/2008, expedido em 15 de outubro de 2008, em nome do prefeito de São Paulo, comunica ao presidente da CEMDP, Marco Antonio Rodrigues Barbosa, que os restos mortais de Miguel Sabat haviam sido localizados no Cemitério de Perus.
Decreto expedido pelo Presidente da República, em julho de 2009, concedeu indenizações à família de Miguel Sabat Nuet, considerando-o como morto em razão da participação ou acusação de participação de atividades políticas, assim como tipifica o art.4°, I, alínea, b, com base na Lei nº 9.140/1995. Em 12 de dezembro de 2011, em cerimônia realizada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), a Ministra de Estado Chefe da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário Nunes, oficializou a entrega dos restos mortais aos filhos de Miguel Sabat, Maria Del Carmen, Miguel e Lorenzo.
Diante das circunstâncias do caso e das investigações realizadas, conclui-se Miguel Sabat Nuet foi preso e, após sua morte, teve seu corpo sepultado por agentes do Estado brasileiro de forma a prejudicar sua localização.
Os crimes praticados contra Miguel Sabat Nuet ocorreram em contexto de sistemáticas violações de direitos humanos promovidas pela ditadura implantada no país a partir de abril de 1964.
Recomenda-se a continuidade das investigações sobre as circunstâncias do caso, para apuração das reais circunstâncias de morte, bem como para identificação e responsabilização dos demais agentes envolvidos.
O Estado brasileiro utilizou uma série de mecanismos para amedrontar a população, sobretudo aqueles que não estivessem de acordo com as medidas ditatoriais. Conheça os reflexos do aparato repressivo e os focos de resistência na sociedade.