Atuação Profissional

estudante universitário

Filiação

Maria Corina Abreu Lima da Rosa e Arcy Cattani da Rosa

Data e Local de Nascimento

28/5/1949, Porto Alegre (RS)

Data e Local de Morte

28/10/1970, Canoas (RS)

Ary Abreu Lima da Rosa

Ary Abreu Lima da Rosa

Ary Abreu Lima da Rosa morreu no dia 28 de outubro de 1970, em Canoas (RS). Foi preso em 1969, com seu companheiro Paulo Walter Radke, militante do Partido Operário Comunista (POC), por distribuírem panfletos aos candidatos ao vestibular na frente da Faculdade de Farmácia da UFRGS.

 

O relatório do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) aponta que ambos os estudantes, ao serem detidos, “tinham em seu poder grande número de panfletos que foram apreendidos (…) que criticam a política educacional do Governo Federal de maneira áspera e incita os vestibulandos a se unirem com os estudantes e lutar contra o inimigo comum”. Os panfletos apresentam uma crítica à política educacional de nível superior, mostrando que universidades foram criadas “sem qualquer levantamento preliminar das necessidades e possibilidades materiais e humanas”.

 

No material divulgado, os estudantes defendiam o Movimento pela Universidade Crítica (MUC), denunciando a falta de vagas, criticando o ensino universitário, o regime ditatorial-militar, defendendo a legalização da União Nacional dos Estudantes (UNE) e conclamando os estudantes a participar das eleições para o Diretório Central (DCE). Em virtude das panfletagens, Ary e Paulo foram enquadrados no artigo 38-II da Lei de Segurança Nacional em 28 de março de 1969. O Decreto 314/1967 punia por atos, palavras e opiniões consideradas contrárias ao regime militar. Os estudantes foram soltos algum tempo depois, mas o processo teve continuidade. Por esse motivo, decidiram passar à clandestinidade e mudar-se para São Paulo.

 

Não tendo se adaptado à vida clandestina em São Paulo, Ary voltou a Porto Alegre. No dia 1o de setembro de 1969 Ary Abreu e Paulo Radke foram condenados a seis meses de reclusão por crime “contra a segurança nacional” pelos juízes Rubens Medeiros e Raul Germano da Silva e pelos capitães Arnaldo de Souza Leão, Aldo Luís Ramos e Luís Ferreira dos Santos Filho. Por opção de seu pai, político influente da Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e crítico à participação do filho no movimento estudantil, Ary foi internado numa clínica psiquiátrica.

 

Permaneceu no Sanatório São José do dia 2 de setembro de 1969 ao dia 1o de setembro de 1970, submetido a tratamento farmacológico e psicoterapia de apoio. De acordo com diagnóstico do paciente no Sanatório, assinado pelo médico José Godoy Gavioli na data de saída da instituição, Ary teria apresentado “reação esquizofreniforme, com ideias de conteúdo paranoide. Sentia-se desadaptado no ambiente sociofamiliar com ideias de referência e de que não era benquisto pelos que o cercavam. Em junho de 1968, abandonou os estudos na faculdade como decorrência de seu baixo rendimento intelectual, consequência do estado emocional de então. Passou a apresentar ideias reformistas, principalmente de natureza materialista, identificando-se com princípios esquerdistas, socialismo ou mesmo, comunismo. Deixou crescer barba e cabelo como um ‘protesto ao mundo capitalista’. (…) Tendo em vista ter realmente se envolvido em política estudantil de esquerda, onde procurava, dentro de sua psicopatologia esquizoparanóide, pôr em prática aspectos quase delirantes das concepções que morbidamente defende, sugerimos a baixa, que foi aceita pelo paciente”.

 

No dia 2 de setembro de 1969 foi transferido para o hospital da Base Aérea de Canoas (RS), local onde veio a falecer cerca de dois meses depois. Segundo o auto de necropsia, Ary foi encontrado morto às 11h, no interior de um banheiro do referido hospital. O exame histopatológico de 18 de novembro de 1970 apresentou como causas “edema cerebral”, “congestão no rim” e “edema pulmonar” em virtude de “suicídio”. O documento conclui que Ary teria cortado as próprias veias e morrido de “hemorragia externa, consecutiva a ferimento inciso”. No Inquérito Policial Militar (IPM), o Comandante do Quartel General da 5a Zona Aérea afirma que “não houve nenhuma interferência do pessoal do Hospital da Aeronáutica de Canoas no ato de suicídio cometido por Ary de Abreu Lima da Costa”. Lá, ele só teria recebido “atenção e dedicação por parte de todos que com ele tinham contato”. O IPM ainda responsabiliza a visita da namorada, seguida pelo término do namoro, pelo agravamento da situação de fragilidade psicológica do rapaz e pelo suposto suicídio, tendo Ary deixado um bilhete de despedida aos seus familiares.

 

As providências para o sepultamento foram tomadas em sigilo, por solicitação dos pais. A causa da morte apresentada pelo IPM contém fragilidades. Primeiramente porque o diagnóstico apresentado pelo médico do Sanatório expõe motivações políticas para a internação de Ary, associando sua opção política de esquerda a um adoecimento psíquico. A classificação de Ary como “doente mental” e sua transferência para o Hospital da Base Aérea, no dia seguinte em que recebeu alta no sanatório mostra-se bastante contraditório. Em depoimento à CEMDP, Raul Pont, colega de Ary, afirma que o jovem não pode ser considerado “doente mental”, mas sim militante do movimento estudantil gaúcho.

 

Em segundo lugar, a sugestão de agravamento da situação de Ary em função do término do namoro não pode ser comprovada, como consta no próprio documento: “não foi possível obter declarações da mesma para confirmar o rompimento do namoro que levou Ary ao ato extremo”. Em terceiro lugar, em relatório da Anistia Internacional de 1974, localizado e analisado pela CNV no acervo do SNI do Arquivo Nacional (RJ), consta o nome de Ary Abreu como membro da listagem de torturados e assassinados por perseguição política. O caso foi comunicado ao governo brasileiro pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) no dia 19 de dezembro de 1973.

 

Por fim, a relatora do caso na CEMDP, Suzana Keniger Lisboa, aponta mais uma contradição da versão oficial da morte, afirmando que se o jovem foi preso por problemas psíquicos, como poderia, no cumprimento de sua pena, ter entre seus pertences, instrumentos cortantes que permitissem o ferimento das veias do braço? O IPM não esclareceu a dúvida e não especificou o instrumento supostamente utilizado por Ary para suicidar-se. Após a morte, representantes de vários centros acadêmicos da UFRGS mandaram rezar uma missa em homenagem à Ary Abreu na Igreja do Rosário, em Porto Alegre. Na mesma época, foi elaborada uma nota assinada por vários presidentes de centros acadêmicos na qual denunciavam a morte por tortura de Ary Abreu, “informação esta que os jornais de Porto Alegre não se atreveram a dar por estarem censurados. (…) O universitário Ary Abreu foi visto entrar com vida no Quartel General da 5a Zona Aérea (…) de onde saiu morto”. Nessa ocasião, o estudante Renato Dagnino e outros que haviam assinado a nota foram expulsos por três anos da universidade com base no Decreto 477.

 

Não houve nenhum pronunciamento sobre a morte do estudante Ary por parte da Reitoria da UFRGS, do Diretor da Faculdade de Engenharia ou de outra autoridade pública. Para os representantes do DCE-UFRGS, isso teria representado uma tentativa “de abafar qualquer tentativa ou mesmo esboço de revolta do meio ao qual ele pertencia, contra a causa de sua morte”. O corpo de Ary Abreu Lima Rosa foi sepultado no cemitério da Irmandade Arcanjo São Miguel e Almas de Porto Alegre (RS).

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