Negra e nordestina, Damaris Lucena foi militante política na luta por direitos, memória viva e presente da resistência operária à ditadura militar. Companheira de Antônio Raymundo Lucena, militante político morto em 20 de fevereiro de 1970, em Atibaia, interior de São Paulo. Lucena foi assassinado em casa, na frente da família. Seu corpo permanece desaparecido. Damaris foi presa junto com os filhos, e torturada nas dependências da Oban.
Nascida em Codó, pequena cidade do norte do Maranhão, em 1927, Damaris teve a infância rodeada por miséria. Perdeu a mãe, dona Guilhermina, para a fome. Estudou apenas até o terceiro ano do antigo primário, quando começou a trabalhar como doméstica e babá. Aos 16 anos, mudou-se para uma cidade maior no Maranhão e virou operária. Aos 21, casou-se com Antônio. Em 1950, o casal migrou para São Paulo em busca de melhores condições de vida. Os dois passaram a trabalhar em uma fábrica têxtil, participando do movimento sindical. Damaris perdeu o primeiro filho, o único nascido no Maranhão, de sarampo. Teve outros quatro filhos: Ariston, Denise, Adilson e Telma.
Reconhecida como liderança entre as mulheres da fábrica, atuava negociando demandas com os patrões. Por articulação sua conseguiu, por exemplo, ampliar o tempo de amamentação a que as mulheres tinham direito. Na primeira greve que participou, foi levada para a delegacia. Liberada poucas horas depois, retornou no dia seguinte e acabou discursando para um estádio lotado de grevistas. Por conta de sua militância, foi demitida e nunca mais conseguiu trabalhar na indústria.
Voltou a trabalhar na limpeza de casas, depois como ajudante de cozinha e feirante. Em 1967, integrou a luta armada junto com o marido, na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). Com o AI-5, passaram a viver na clandestinidade e moraram em diversas cidades de São Paulo, do litoral ao interior. Com a morte de Antônio em 1970, Damaris foi presa e seus filhos mais novos levados a um orfanato. Levada ao centro clandestino de tortura da Oban, sofreu violências físicas por cerca de vinte dias. Seu filho mais velho, Ariston, também membro da VPR, foi capturado meses mais tarde e também torturado. Ficou preso por quase dez anos, saindo somente com a Lei da Anistia.
Uma operação organizada pela VPR conseguiu a libertação de Damaris em troca de Nobuo Okuchi, cônsul do Japão, que havia sido sequestrado pelo grupo. Reencontrou os filhos e foi levada ao México, onde denunciou a tortura que ocorria no Brasil para a imprensa internacional. De lá partiu para Cuba, onde Fidel Castro havia oferecido asilo para sua família. Na ilha, continuou os estudos e chegou a cursar dois anos de Jornalismo. Solidária, tornou-se mãe adotiva de Ñasaindy, filha da militante Soledad Barrett Viedma, assassinada em um dos mais trágicos episódios do regime militar, o Massacre da Chácara São Bento, em Recife. Damaris retornou ao Brasil somente com a promulgação da Lei da Anistia e desde então luta por Justiça pelo marido.