Em carta enviada ao Grupo Tortura Nunca Mais, em 1993, a esposa de Luiz Ghilardini, Orandina Ghilardini, narrou, que em 4 de janeiro de 1973, sua casa foi invadida por treze homens armados que encapuzaram e prenderam ela, Luiz, e seu filho de oito anos, Gino. Depois de serem espancados, os três foram levados em dois carros para um local, que ela presumia ser o DOI-CODI-RJ, onde as sevícias continuaram. Na última vez que Orandina viu seu marido, ele estava de costas, as mãos amarradas com uma borracha, com os braços roxos. Ela e seu filho foram conduzidos encapuzados, no mesmo dia, a um quartel, que ela acredita estar localizado no bairro de São Cristovão, no Rio de Janeiro. Depois de três dias mantidos em uma cela exposta ao sol, Orandina foi separada do filho, que foi conduzido ao Serviço de Assistência ao Menor. Dias depois, ela foi informada da morte de seu marido e, três meses mais tarde, libertada, quando pôde reunir-se com seu filho. Apesar de a família ter testemunhado a prisão de Luiz, os órgãos de segurança divulgaram outra versão. Documentos oficiais informam que Luiz foi morto no contexto de desarticulação do PCdoB empreendida pelo I Exército, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Segundo essa versão, os militares invadiram o comitê central do partido em Turiaçu (RJ) e prenderam ali o militante. Luiz teria pedido “que o carro parasse para ele descer” e em seguida agrediu o motorista e saltou do carro, que “se descontrolou e foi chocar-se com a calçada”. Para impedir a fuga, os militares teriam atirado em Luiz, que morreu na rua. A guia nº 14 do DOPS, sob o registro nº 23/73, indica o envio ao Instituto Médico Legal do Rio de Janeiro (IML-RJ) de um “homem desconhecido de cor branca aparentando 60 anos”. O corpo deu entrada no IML em 5 de janeiro de 1973, e o laudo indica que o corpo fora perfurado por seis projéteis de arma de fogo que atingiram a pálpebra, o globo ocular, pescoço, abdômen, coração e tórax.i Nos autos do caso, constam fotos de perícia de local do Instituto Carlos Éboli do Rio de Janeiro, nº 0078/73. O laudo de perícia do local (Ocorrência n.º 14/73) registrou não haver arma de fogo no local e que “[…] nos pulsos da vítima havia sinais recentes de ferimentos produzidos por algo que os prenderam. Os ferimentos, embora superficiais, faziam-se notar nitidamente”ii . As fotografias encontradas mostram o rosto de Luiz desfigurado. Foram emitidas duas certidões de óbito para o militante, com diferentes datas de morte: a primeira, de nº 17-117, de 6 de fevereiro de 1973, declara que ele morreu em 1 de janeiro daquele mesmo ano; a segunda, nº 17-119, de 23 de março de 1973, registra a morte em 4 de janeiro de 1973. As certidões estão assinadas pelo médico Rubens Macuco Janini e indicam como causa da morte “ferimento transfixiante do coração”iii . Mais tarde, em carta, seu filho Gino descreveu as circunstâncias da morte do pai. Relatou que sua mãe, ao deixar a prisão, procurou pelo marido no Instituto Médico Legal (IML), a partir de informação do Exército. Um funcionário do IML informou a Orandina que o corpo de Luiz havia chegado ao local em 4 de janeiro de 1973 e que permaneceu ali até o dia 5 de fevereiro, sendo depois enterrado como indigente no cemitério Ricardo de Albuquerque, no Rio de Janeiro. O funcionário alegou que nenhum parente compareceu para retirar o corpo, apesar de ter sido identificado em 5 de janeiro. Embora já tivesse sido devidamente identificado, o corpo de Luiz Ghilardini foi enterrado como indigente, no cemitério Ricardo de Albuquerque, no Rio de Janeiro (RJ), tendo sido transferido para um ossário-geral em 20 de março de 1978, e, entre 1980 e 1981, trasladado a uma vala clandestina com cerca de duas mil outras ossadas.
Diante das investigações realizadas, conclui-se que Luiz Ghilardini foi preso e morto sob torturas, em decorrência de ação perpetrada por agentes do Estado brasileiro, em contexto de sistemáticas violações de direitos humanos promovidas pela ditadura militar, implantada no país a partir de abril de 1964. Recomenda-se a retificação da certidão de óbito de Luiz Ghilardini, assim como a continuidade das investigações sobre as circunstâncias do caso, para a localização de seus restos mortais e identificação e responsabilização de todos os agentes envolvidos.