Atuação Profissional
estudanteOrganização
Ação Libertadora Nacional (ALN)Filiação
Zilda Xavier Pereira e João Baptista Xavier PereiraData e Local de Nascimento
9/8/1949, Rio de Janeiro (RJ)Data e Local de Morte
20/1/1972, São Paulo (SP)Alex de Paula Xavier Pereira morreu no dia 20 de janeiro de 1972 juntamente com seu companheiro de militância da Ação Libertadora Nacional (ALN), Gelson Reicher, em ação perpetrada por agentes do DOI-CODI do II Exército. A nota oficial fornecida pelos órgãos de segurança foi divulgada pela imprensa dois dias depois com a versão de que Alex e Gelson teriam sido mortos em confronto armado com as forças de segurança do Estado. A edição de 22 de janeiro de 1972, de O Estado de São Paulo, informava que “O volks de placa CK 4848 corre pela Avenida República do Líbano. Em um cruzamento, o motorista não respeita o sinal vermelho e quase atropela uma senhora que leva uma criança no colo. Pouco depois, o cabo Silas Bispo Feche, da PM, que participa de uma patrulha, manda o carro parar. Quando o volks pára, saem do carro o motorista e seu acompanhante atirando contra o cabo e seus companheiros; os policiais também atiram. Depois de alguns minutos três pessoas estão mortas e uma outra ferida. Os mortos são o cabo da Polícia Militar e os ocupantes do volks, terroristas Alex de Paula Xavier Pereira e Gelson Reicher”. Desde o início da década de 1970, Alex de Paula e Gelson Reicher eram acusados pelos órgãos de segurança de participação em diversas ações armadas. De acordo com documentos localizados no Arquivo Nacional, os agentes da repressão acusavam Alex de ter recebido treinamento de guerrilha em Cuba. Os dois guerrilheiros tinham suas fotos estampadas em cartazes que os identificavam como “Bandidos Terroristas Procurados” e o nome de Alex Xavier também foi citado em matérias do Jornal do Brasil como sendo procurado pelo Exército por ser acusado de assalto a bancos e quartéis. O trabalho de desvendamento das circunstâncias que culminaram nas mortes de Alex e Gelson ganhou impulso, contraditoriamente, a partir da nota produzida pelos órgãos de repressão e para simular a efetiva dinâmica dos fatos relacionados a essas mortes. Na nota distribuída à imprensa, havia a informação dos codinomes que os dois militantes utilizavam na clandestinidade. Foi com esses nomes que os agentes do Estado registraram a entrada dos corpos de Alex e Gelson no Instituto Médico Legal; Alex Xavier como “João Maria de Freitas” e Gelson Reicher como “Emiliano Sessa”. Com esses nomes falsos, enterraram os dois militantes como indigentes no cemitério de Dom Bosco, em Perus (SP); e a partir dessa informação, foi possível encontrar os corpos registrados com os nomes falsos. No caso de Alex, somente em 1979 seus familiares conseguiram localizar seus restos mortais. Passados mais de 40 anos as investigações sobre esse episódio, realizadas ao longo das últimas décadas, e as pesquisas e estudos realizados pela Comissão Nacional da Verdade (CNV) revelaram a existência de inúmeros elementos de convicção que permitem apontar que a versão divulgada à época não se sustenta. Desde a divulgação da nota oficial comunicando a morte de Alex e, sobretudo, a partir da descoberta de seus restos mortais em 1979, seus familiares questionavam o fato de que, apesar de conhecer a identidade de Alex, os órgãos de segurança o sepultaram como indigente e com nome falso, para impedir o acesso ao seu corpo. Quando os arquivos do Departamento de Ordem Política e Social de São Paulo (DOPS/SP) foram abertos, em 1992, foram localizadas fotos dos corpos de Alex e Gelson, demonstrando a visível presença de inúmeros hematomas e escoriações. Para avançar na elucidação das circunstâncias de morte dos militantes, a Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos encaminhou cópia das fotografias encontradas para o médico legista Nelson Massini e solicitou a realização de um parecer. O laudo elaborado pelo Dr. Massini, em 6 de março de 1996, atestou que Alex Xavier foi morto sob tortura. É possível concluir, de acordo com o Dr. Massini, “com absoluta convicção, que o Sr. Alex de Paula Xavier Pereira esteve dominado por seus agressores que produziram lesões vitais e não mortais anteriores àquelas fatais e posteriormente desferiram lesões mortais, sendo as primeiras absolutamente desnecessárias tendo contribuído apenas para aumento do sofrimento antes da morte configurando-se o verdadeiro processo de tortura”. As análises do Dr. Massini destacam ainda que o laudo do IML, assinado por Isaac Abramovitch e Abeylard de Queiroz Orsini, descreveu apenas os ferimentos produzidos por projétil de arma de fogo. Não foi registrada nenhuma referência às equimoses e escoriações que se faziam visíveis no corpo de Alex. Os mesmos legistas que fraudaram o laudo médico, em ação cooperativa e vinculada às práticas de graves violações de direitos humanos, iriam, cinco meses depois, cometer os mesmos crimes, ao falsificar o laudo de óbito de Iuri Xavier Pereira, irmão de Alex. O laudo do Dr. Massini, que atestava a prática de tortura, incitou novas pesquisas. A narrativa que havia sido apresentada pelos órgãos de segurança sustentava que o encontro entre os agentes da repressão e os militantes da ALN fora casual, culminando em troca de tiros e na morte de Alex e Gelson. Por intermédio de pesquisas realizadas nos arquivos do DOPS/SP foram localizados documentos que revelam aspectos que indicam a fragilidade da falsa versão. Essa evidência se relaciona ao fato de que os corpos de Alex e Gelson deram entrada no IML trajando apenas cuecas, o que sugere que os militantes, após o suposto confronto armado do dia 20 de janeiro de 1972, foram conduzidos para outro local, antes de ingressarem no necrotério. Também corrobora com a desconstrução da versão apresentada pela ditadura, o depoimento prestado à CNV pelo juiz auditor Nelson da Silva Machado Guimarães, no dia 30 de julho de 2014, quando foi indagado a respeito da ocultação dos cadáveres de Alex de Paula Xavier e Gelson Reicher, nos seguintes termos: CNV – É, Alex de Paula Xavier Pereira e Gelson Reicher. O senhor quis extinguir a punibilidade deles, para não aceitar uma denúncia e um processo contra pessoas que o senhor já tinha verificado que estavam mortas. Nelson da Silva Machado Guimarães – Mas em que eu me baseio aí? CNV – O senhor tem esse processo, e eu tenho aqui os documentos, que eu posso lhe passar daqui a pouco. Nesse processo, o senhor solicitou tanto à autoridade policial militar como à autoridade policial, ao DOPS, um delegado, o senhor solicitou o atestado… Nelson da Silva Machado Guimarães – De óbito. CNV – …de óbito. Esse atestado de óbito o senhor solicitou indicando o nome verdadeiro. Veio o atestado com o nome falso, que era como os atestados eram feitos, para viabilizar essa política de desaparecimento. O senhor extinguiu a punibilidade com base num atestado falso, e sabia que era falso. O senhor sabia que era falso, porque o senhor deu o nome verdadeiro dele, para pedir. Tem aqui a documentação. (…) Além de demonstrar a participação do Poder Judiciário no processo de ocultação de cadáver dos dois militantes, o depoimento confirma que os órgãos de segurança tinham conhecimento da verdadeira identidade dos militantes quando fizeram o sepultamento com os nomes falsos, demonstrando a ação deliberada que visava impedir ou dificultar fortemente que as famílias localizassem os corpos. Em 24 de fevereiro de 2014, a CNV realizou um laudo pericial sobre a morte de Alex de Paula Xavier Pereira. A equipe de peritos da CNV conduziu análises periciais comparativas valendo-se de novas tecnologias de análise pericial. As análises comparativas entre o laudo de necropsia realizado no IML de São Paulo em 1972 pelos legistas Isaac Abramovitch e Abeylard de Queiroz Orsini, e o laudo produzido por Nelson Massini em 1996, revelaram incontornáveis contradições. De acordo com o laudo da CNV, as lesões a tiros no corpo de Alex Xavier eram incompatíveis com as lesões que pessoas mortas em tiroteio apresentariam. A versão que foi apresentada para a morte de Alex de Paula Xavier Pereira consiste em mais um exemplo das farsas, que eram montadas por agentes da repressão, para encobrir ações ilegais. Os restos mortais de Alex de Paula Xavier Pereira foram enterrados como indigente no Cemitério Dom Bosco, em Perus (SP) e somente em 18 de outubro de 1982 foram trasladados para o Rio de Janeiro, após a ação de retificação dos registros de óbito, sepultados junto com os restos mortais de seu irmão, Iuri Xavier. Em 21 de março de 2014, o Instituto Nacional de Criminalística (INC) concluiu a análise pericial e produziu um laudo que atestou que os restos mortais encontrados são compatíveis com os de um filho biológico de Zilda Paula Xavier Pereira, o que permitiu a identificação plena dos restos mortais de Alex de Paula Xavier Pereira.
Diante das investigações realizadas, conclui-se que Alex de Paula Xavier Pereira morreu em decorrência de ação praticada por agentes do Estado brasileiro, em um contexto de sistemáticas violações de direitos humanos perpetradas pela Ditadura Militar, implantada no país a partir de abril de 1964. Recomenda-se a retificação da certidão de óbito de Alex de Paula Xavier Pereira, assim como a continuidade das investigações sobre as circunstâncias de sua morte, completa identificação e responsabilização dos agentes envolvidos.
O Estado brasileiro utilizou uma série de mecanismos para amedrontar a população, sobretudo aqueles que não estivessem de acordo com as medidas ditatoriais. Conheça os reflexos do aparato repressivo e os focos de resistência na sociedade.