Os apoios civis à ditadura militar
Em 31 de março de 1964, um golpe de Estado pôs fim à experiência democrática brasileira inaugurada em 1946 e instaurou uma ditadura militar que duraria 21 anos. De modo geral, tende-se a pensar nesses eventos a partir da responsabilidade militar, em função do protagonismo que as Forças Armadas exerceram durante a condução de todo o processo golpista e da própria ditadura.
Não obstante, se é difícil ignorar o protagonismo militar tanto nos eventos de 1964 quanto na ditadura que se seguiu, também não é possível imaginar que o golpe e a manutenção do regime por duas décadas tenham resultado exclusivamente da vontade das Forças Armadas. Nesse sentido, mais recentemente, historiadores têm buscado compreender os apoios recebidos pela ditadura em sua diversidade, estudando grupos e instituições da sociedade civil que manifestaram apoio aberto ao golpe, muitos dos quais se tornariam, mais tarde, importantes sustentáculos do regime.
Ao mesmo tempo, tais pesquisas chamam a atenção para a necessidade de compreender a sociedade em sua complexidade e, sob esse aspecto, demonstram como os comportamentos sociais e as formas de lidar com a ditadura variaram de maneira expressiva ao longo de todo o período.
Assim, da mesma forma que a ditadura não se constituiu como um bloco homogêneo e coeso, tendo se transformado ao longo do tempo, algo similar pode ser dito a respeito dos grupos, instituições e atores sociais que apoiaram o golpe e a ditadura. As formas de manifestar apoio raramente se mantiveram as mesmas do início ao fim. Muitos mudaram de posição, reorientaram caminhos, outros mantiveram firmes suas convicções e sua crença no regime instaurado em 1964. Houve ainda os que se acomodaram ou se adaptaram aos novos tempos. Em comum, partilhavam valores, sentimentos e uma cultura política marcada por forte sentido de conservação da ordem e pelo anticomunismo, muito próprio do contexto da Guerra Fria.
Nessa conjuntura, para muitos, a defesa da família, da religião e da propriedade era indissociável da luta contra a ameaça comunista que colocava em risco, de acordo com o imaginário anticomunista, todas essas instituições. Assim, desde o começo da década de 1960, a sociedade brasileira experimentou intenso processo de polarização política, resultando na organização de segmentos conservadores da sociedade em partidos, associações e instituições que desempenharam papel fundamental no processo de desestabilização do governo João Goulart (1961-1964), no golpe e, depois, na ditadura.