Foi em 1976 que o artista cubano lançou seu primeiro álbum comercial, intitulado Pablo Milanés, composto integralmente por canções suas. Antes, tinha produzido dois outros discos especiais, musicando versos dos maiores poetas de Cuba. O primeiro LP, de 1973, foi dedicado a José Martí, enquanto o segundo, de 1975, trouxe canções feitas a partir de 11 poemas de Nicolás Guillén.
No álbum de 1976, lançado em alguns países com o título La vida no vale nada, as canções são todas de Pablo, letra e música. Mostram-se alinhadas não apenas com os princípios da nueva trova cubana — movimento musical que ele tinha ajudado a criar sob influência da revolução castrista — mas também com a nueva canción chilena, uruguaia, argentina, e também com as canções de protesto do Brasil. Entre as faixas, destacam-se “Yo pisaré las calles nuevamente” e “Canción por la Unidad Latinoamericana”.
Na primeira, o autor evoca o golpe militar no Chile e o assassinato de Salvador Allende no Palácio de La Moneda, para afirmar sua previsão de que dias melhores viriam, com a deposição de Pinochet e o resgate da liberdade.
“Pisarei as ruas novamente/ do que foi Santiago ensanguentada/ e numa bela praça liberada/ me pegarei a chorar pelos ausentes/ (…) Voltarão os livros e as canções/ que as mãos assassinas queimaram./ Meu povo renascerá de sua ruína/ e os traidores pagarão.”
Na segunda, expõe sua incompreensão diante da lista de conflitos que, historicamente, separaram os povos latinos, propondo sua reaproximação: “Cumpriram a tarefa de desunir nossas mãos/ e, apesar de sermos irmãos, nos vemos com temor”, diz. Na última estrofe, Pablo Milanés registra claramente sua filiação ideológica: “Bolívar atirou uma estrela, que junto de Martí brilhou/ Fidel a dignificou para andar por essas terras.”
A arte de Pablo já era conhecida pelos cubanos muito antes desse álbum. Em 1967, quando Havana sediou o 1º Encuentro Internacional de la Canción Protesta, o jovem compositor, às voltas com o serviço militar, esteve presente, absorvendo as sonoridades e as realidades políticas de dezenas de países.
Já no ano seguinte, foi admitido no Centro de la Canción Protesta, estatal, de onde despontaram os três artistas que formaram o Grupo de Experimentación Sonora del ICAIC (Instituto Cubano de Arte e Indústria Cinematográfica), com a prerrogativa de criar trilhas sonoras para os filmes feitos na ilha: Pablo Milanés, Silvio Rodríguez e Noel Nicola. Na virada da década, esses mesmos artistas formulariam a nueva trova.
Par a par com Silvio Rodríguez, autor de “Pequeña Serenata Diurna”, Pablo Milanés se firmou como o maior nome da nueva trova e correu o mundo ao longo dos anos 1970 e 1980. Sua música se disseminou no Brasil, trazida pelas mãos de intérpretes como Chico Buarque e Milton Nascimento.
Já em 1978, “Canción por la Unidad Latinoamericana” foi gravada por Milton e Chico, em dueto, e incluída no LP Clube da Esquina 2, do lendário coletivo mineiro. Chico, que o conheceu em sua viagem a Cuba, em 1978, convidado pela Casa de las Americas para ser jurado num concurso literário, voltaria a gravar músicas de Pablo Milanés. Nesse sentido, destaca-se a gravação de “Como se Fosse a Primavera”, em espanhol e em português, com a participação do próprio Pablo, no LP de 1984, a partir da adaptação feita por Chico para “Canción (De que Callada Manera)”, de Milanés e Nicolas Guillén. Em 1986, repetiriam o dueto em “Yolanda”.