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Ernesta Zuchi Teixeira e Vivaldino do Amaral TeixeiraData e Local de Nascimento
6/2/1944, Marcelino Ramos (RS)Data e Local de Morte
3/7/1968, Francisco Beltrão (PR)Iguatemi Zuchi Teixeira morreu no dia 3 de julho de 1968 às 19h30, nas dependências do Quartel Militar de Francisco Beltrão (1º a 13º regimento), unidade do III Exército, 5ª Região Militar, 5ª Divisão de Infantaria, no município de Francisco Beltrão (PR).
Na madrugada do dia 1º de julho de 1968, dois dias antes da morte da vítima, soldados do Exército tentaram invadir à força o Bar e Pensão Estrela Dalva, onde Iguatemi morava e trabalhava, situado no bairro do Cango, no município de Francisco Beltrão (PR). De acordo com o relato presente no processo da CEMDP, naquela ocasião, o soldado Belarmino Pereira de Liz faleceu e o militar Mario Henrique Curzel saiu levemente ferido.
A responsabilidade pela agressão foi atribuída à Iguatemi Zuchi, que também apresentou ferimentos, mas foi preso em flagrante e encaminhado ao Comando do Exército Nacional a fim de “prestar declarações sigilosas”. Alegou-se que Iguatemi deveria permanecer naquele local por trinta dias para prestar esclarecimentos sobre o conflito havido entre ele e outros dois soldados militares. No entanto, dias depois, foi morto nas dependências do quartel por um soldado da escolta.
Após o pedido do delegado para que fosse divulgada a notícia de morte de Iguatemi, a emissora de Rádio Colmeia forneceu o seguinte ofício: “O comando do 1º/13º RI informa à população que foi morto, por um soldado da escolta, o civil Iguatemi Zuchi Teixeira, que se encontrava preso nessa unidade em virtude de ter sido instaurado IPM para apurar o fato de ter o mesmo assassinado, no dia 1º de julho, o soldado Belarmino Pereira de Liz.”
O Exército Nacional não se preocupou em explicar com maiores detalhes as causas da morte de Iguatemi para a autoridade policial, que acabou solicitando mais informações sobre o ocorrido, exigindo vistas do laudo de exame cadavérico da vítima. No referido documento, consta que a morte de Iguatemi teria sido produzida por “meio de veneno, fogo, explosivo, asfixia, ou tortura, ou por outro meio insidioso ou cruel devido ao número e ao tipo de lesões encontradas”.
Como causa da morte, foi apresentada “anemia aguda por hemorragia interna e externa provocada por ferimentos penetrantes de abdômen e tórax” e o meio que a produziu foi um “instrumento perfuro contundente”. O mesmo instrumento foi extraído do corpo e definido como “um flagelo de metal de cor amarela” pelos peritos.
O auto de prisão em flagrante descreve outra versão do caso. A análise dos documentos evidencia que, às 23h do dia 30 de junho de 1968, chegaram quatro pessoas no Bar Estrela Dalva, sendo dois civis e dois militares à paisana. Esses últimos tentaram adentrar as dependências da casa e foram barrados por Iguatemi, que afirmou que ali não havia mulheres e que eles não podiam invadir domicílio alheio.
De acordo com o relato, o soldado Belarmino sacou uma faca e bateu no balcão. O proprietário do local conseguiu, com muito custo, levar os militares até a porta do estabelecimento. Às 0h15, os dois soldados começaram a jogar pedras no telhado e tentaram arrombar a porta da frente. Diante disso, Iguatemi, que já estava deitado, saiu pela porta dos fundos e pediu que os soldados saíssem e parassem de danificar a propriedade.
Os militares teriam “investido contra Iguatemi”, obrigando-o a sacar seu revólver e a disparar o primeiro tiro no chão, para assustá-los. Mediante a insistência dos soldados em permanecer no local, Iguatemi disparou mais três tiros. O conflito desembocou em luta corporal e os militares acabaram sendo encaminhados ao hospital, transportados por uma Kombi que estava estacionada em frente ao bar desde a chegada dos soldados.
Na manhã do dia seguinte, a mando do capitão Sebastião Rodrigues de Moura, Iguatemi foi levado para o quartel do Exército com o objetivo de prestar declarações secretas às Forças Armadas. Determinou-se que Iguatemi deveria aguardar na cadeia para responder a processo civil. No dia 2 de julho de 1968, o soldado Belarmino faleceu devido aos ferimentos sofridos no bar.
O capitão solicitou ao comando da 1ª a 13ª RI o retorno do preso. No entanto, o Comando alegou que Iguatemi deveria permanecer no quartel por trinta dias. No dia 4 de julho de 1968, o capitão Sebastião Moura, ao ouvir as notícias pelo rádio, teve conhecimento que Iguatemi Teixeira havia sido morto por um soldado do próprio quartel. Quando solicitado o nome do soldado que matara o jovem no quartel, não houve resposta e não se sabe de fato quem foi o responsável pelo crime.
O auto da prisão sugere que o autor da execução tenha sido Mario Henrique Curzel, já que ele estava envolvido no Inquérito Policial Militar (IPM) e foi indiciado no processo civil. Por estar envolvido, não poderia ter cumprido serviço de escolta do preso na noite em que o mesmo foi executado. A liberação de um envolvido no processo para supervisionar o preso evidencia a negligência dos superiores do quartel com o caso, indicando a conivência das Forças Armadas com a possível execução de Iguatemi Teixeira.
Em relato direcionado ao delegado regional de polícia, no dia 5 de julho de 1968, a mãe de Iguatemi, Ernesta Zuchi Teixeira, afirmou que seu filho matou o soldado no bairro do Cango em legítima defesa; se apresentou à delegacia para ser julgado pela Justiça e terminou sendo morto no pátio do quartel de Francisco Beltrão por um soldado que havia atuado na invasão à casa de Iguatemi na madrugada do dia 30 de junho.
Ernesta também informou que Iguatemi sustentava a família com seu trabalho, e reivindicou que alguma providência fosse tomada. No dia 8 de novembro de 1968 o advogado de Iguatemi, Irineo Ruaro, prestou uma declaração ao delegado Carlos de Azevedo Monteiro na qual afirmou que fora informado pelos militares do quartel de que Iguatemi Zuchi era suspeito de “atividades contra a segurança nacional”.
O advogado reforçou ao militar, à época, a necessidade de assistência médica a seu cliente, visto que apresentava várias lesões na cabeça oriundas de agressões na prisão. No caminho da delegacia para o quartel, o próprio Iguatemi teria dito ao advogado, no dia 2 de julho: “Doutor, veja se me tira hoje mesmo de lá. Estão me surrando muito. Não aguento mais uma noite”.
A mãe da vítima já visitara três vezes o advogado solicitando providências para a soltura do filho, que estava apanhando muito e por isso, não permitiam mais que ela entrasse no quartel para vê-lo. Segundo o relato, quando o depoente elaborou o habeas corpus a ser entregue ao juiz da Comarca, o caso teve o trágico desfecho com o fuzilamento de seu cliente.
As folhas de alterações de Sebastião Rodrigues de Moura confirmam a lotação do então capitão em Francisco Beltrão (PR), onde assumiu funções de comando da guarnição e do 1º a 13º RI. Na data de 3 julho de 1968 a 5 de setembro de 1968, consta que estaria afastado das funções por encontrar-se no Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS).
Um ofício elaborado pelo comandante do Regimento de Infantaria afirmou que, em novembro de 1968, o soldado Mário Henrique Curzel, suposto assassino, se encontrava preso em Curitiba. O corpo de Iguatemi Zuchi Teixeira foi sepultado no cemitério municipal da cidade de Francisco Beltrão (PR).
Diante das investigações realizadas, conclui-se que Iguatemi Zuchi Teixeira morreu em decorrência de ação perpetrada por agentes do Estado brasileiro, em contexto de sistemáticas violações de direitos humanos promovidas pela ditadura militar, implantada no país a partir de abril de 1964.
Recomenda-se a retificação da certidão de óbito de Iguatemi Zuchi Teixeira, assim como a continuidade das investigações sobre as circunstâncias do caso, para a identificação e responsabilização dos demais agentes envolvidos.
O Estado brasileiro utilizou uma série de mecanismos para amedrontar a população, sobretudo aqueles que não estivessem de acordo com as medidas ditatoriais. Conheça os reflexos do aparato repressivo e os focos de resistência na sociedade.