Nascida Clarice Ribeiro Chaves, entrou para a história do Brasil como Clarice Herzog. Em 1975, seu marido, o jornalista Vladimir Herzog, foi preso, torturado e assassinado nas dependências do DOI-CODI em São Paulo, para onde havia ido voluntariamente prestar depoimentos. Desde então, Clarice tem travado uma luta contínua e permanente para esclarecer as circunstâncias e os responsáveis pela morte de Vlado.
Clarice graduou-se em Ciências Sociais na Universidade de São Paulo (USP), na década de 1960. Conheceu Vladimir Herzog, então estudante de Filosofia, em 1962 por meio de amigos em comum. Casaram no civil em fevereiro de 1964, a menos de dois meses do golpe apoiado por civis e praticado por militares contra o governo de João Goulart. O casal mudou-se para Londres, onde nasceram seus dois filhos, Ivo e André. Por lá, Clarice participou de um programa no Center of Information do Foreign and Commonwealth Office (FCO). Ela retornou ao Brasil em 1968 e deu início a uma carreira bem-sucedida com pesquisas de publicidade.
Viúva aos 34 anos, foi a primeira a romper o silêncio e dizer “Mataram o Vlado”. Clarice conduziu os dias seguintes à morte com intervenções que davam cada vez mais visibilidade ao que tinha acontecido. Dali pra frente, travou muitas lutas. A primeira contra a mentira forjada pelo Exército de que Vlado havia cometido suicídio. Pela tradição judaica, ele teria de ser enterrado junto aos muros do cemitério. No enterro, como ato de resistência, decidem colocá-lo na parte central, negando na prática a versão dos militares. Na missa ecumênica organizada na Catedral da Sé, mais de oito mil pessoas foram velar a morte de Herzog.
Ela não recuou diante de ameaças anônimas que recebeu por telefone, nem com a constante vigilância de policiais na porta de sua casa. Em plena ditadura, entrou na Justiça contra o Estado brasileiro com uma ação declaratória de culpa pela morte de Herzog. Em 1978, conseguiu uma sentença histórica do juiz Márcio José de Moraes que condenou o Estado, obrigando-o a indenizar a família do jornalista Vladimir Herzog por sua morte.
Em 2009, aceitou levar o Caso Herzog à Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA) com apoio do Centro pela Justiça e Direito Internacional (CEJIL), precedente importante para todas as famílias de mortos e desaparecidos políticos. Em 2018, conquistaram a condenação do Estado brasileiro pela omissão em elucidar o crime e punir os torturadores de Vlado. Pela primeira vez, um tribunal internacional concluiu que o Brasil cometeu crime contra a humanidade durante a ditadura militar.
Em 2013, 38 anos depois do crime, Clarice conseguiu a retificação do atestado de óbito de Herzog, não mais como suicida, mas como vítima da violência do Estado brasileiro. Por mais de quarenta anos, manteve-se incansável nas lutas pela democracia. Desde 2009, atua como presidente do Instituto Vladimir Herzog, organização da sociedade civil criada para manter viva a história e o legado de Vlado.