Consciência negra pós-ditadura

Consciência negra pós-ditadura

O adensamento da “consciência negra” durante o regime militar, bem como a conexão da questão social com a questão racial foram ganhos históricos importantes na luta contra o racismo e pela democratização efetiva da sociedade brasileira. Houve também conquistas simbólicas a partir de então, como a criação do “Dia da Consciência Negra” (20 de novembro). Uma data que propõe uma reflexão sobre o racismo e sobre a igualdade racial, aproveitando a antiga efeméride que comemorava o “Dia de Zumbi”, o líder da revolta do Quilombo de Palmares, no século XVII.

Outra conquista importante foi o reconhecimento do Estado redemocratizado, em seus diversos níveis federativos, do racismo e da necessidade de políticas públicas efetivas para superá-lo, nas quais os negros sejam protagonistas efetivos ao lado de outros atores comprometidos com essa luta secular. A cristalização de leis antirracistas na Constituição de 1988 também foi um avanço significativo.

Mais recentemente, a criação de “políticas de cotas sociorraciais” em vestibulares de algumas universidades e o reconhecimento do direito territorial dos quilombolas foram marcos importantes no fortalecimento do combate ao racismo, cada vez mais entendido como parte essencial da construção democrática. Trata-se de identificar a dívida histórica da sociedade e do Estado brasileiros perante a população negra, violentada por um sistema escravocrata durante quase quatro séculos. Isso implica em reconhecer que a situação de inferioridade social e econômica desses grupos em nada se deve à sua cor da pele, como insistem os racistas, mas às condições de exploração secular, às humilhações e às violências a que foram submetidos seus ancestrais escravizados, base do racismo perpetuado nas Américas.

Outro debate que encontrou mudanças está no plano das representações culturais, onde a população negra encontra novas oportunidades para deixar de ser uma personagem meramente “folclórica”, em figuras estereotipadas, tais como o “alegre sambista”, a “mulata sensual” ou o “jogador de futebol cheio de ginga”. Em filmes e novelas, passou a vislumbrar novas aberturas e deixou de ser somente o personagem secundário ou serviçal. As representações e papéis sociais que os negros ocupam têm aos poucos se tornado mais complexas e alcançam mais protagonismos do que alguns anos atrás.

Mas nem por isso se superou a discriminação no dia-a-dia e a desigualdade de origem racial. Longe disso, na verdade. A população negra ainda é mais excluída no campo da educação e do nível de renda do que os brancos; entre os pobres, os negros ainda são a grande maioria. A violência policial atinge os jovens negros em especial, numa mistura de políticas de segurança pública e de controle social que segue princípios racistas não declarados: a maior parte das vítimas de chacinas e violência policial ainda é de jovens negros. A luta contra a violência policial e o extermínio da juventude negra é uma das bandeiras atuais da luta contra o racismo no Brasil. Ainda hoje, em pleno século XXI, essas mazelas ainda desafiam a instável e contraditória democracia política brasileira.

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