Foi o maior movimento musical brasileiro do século XX. Tanto que virou sinônimo de música brasileira no mundo todo a partir de 1960, com dezenas de canções regravadas, em português ou em inglês, por músicos de jazz e big bands. Elevou-se, assim, à décima potência o poder de penetração demonstrado por Carmen Miranda décadas antes, quando o samba se firmava como marca nacional.
Surgido em 1958, o movimento da bossa nova, num primeiro momento, se restringia à Zona Sul do Rio de Janeiro. Sua missão era satisfazer uma demanda específica dos jovens de classe média e alta que frequentavam Copacabana e Ipanema, arranhavam o violão (inclusive nas praias), e não se identificavam com o que tocava nas rádios e nos discos.
Naquela época, a música brasileira era produzida quase sempre com arranjos carregados, cheios de instrumentos, e os cantores esbanjavam um vozeirão empostado de locutor. O modernismo que influenciava todas as artes era avesso a esses exageros. Em especial nas letras, quase sempre sofridas, que versavam sobre dor-de-cotovelo e traições, e transformavam a noite carioca num cenário de fossa.
Contra essa corrente, três artistas se destacaram. Tom Jobim, com formação erudita, criava harmonias complexas disfarçadas de coisa simples, como a arquitetura de Oscar Niemeyer. Vinícius de Moraes, poeta reconhecido e diplomata, adicionou versos prosaicos à harmonia do parceiro, compondo canções leves e risonhas que falavam sobre “peixinhos a nadar no mar” e “beijinhos que darei na sua boca”. Por fim, João Gilberto deu o golpe de mestre: gravou aquilo com uma voz suave, intimista, que em nada lembrava o vozeirão dos nossos astros, e resumiu todo o ritmo de uma bateria de escola de samba numa batida de violão. Tal cadência passou a definir o ritmo em oposição ao samba.
No mais, os bossa-novistas tinham entusiasmo o bastante para espalhar aquela batida pelos quatro cantos. Musa inspiradora do grupo, Nara Leão tinha pouco mais de 14 anos quando se matriculou na academia de violão de Carlos Lyra e Roberto Menescal. A partir de então, passou a abrir seu apartamento para reuniões às quais compareciam os principais nomes do movimento.
A bossa nova foi hegemônica como movimento apenas até 1962, quando dois de seus fundadores, Tom Jobim e João Gilberto, se mudaram para os Estados Unidos (antes de o golpe militar ser deflagrado). O patrimônio lançado nesses quatro anos, no entanto, serviu de pilar para a obra de muitos dos principais cantores e compositores que os sucederam e que foram os pioneiros dos movimentos seguintes. Desde a bossa nova engajada, variação liderada pelos músicos Carlos Lyra, Nara Leão, Sérgio Ricardo, Edu Lobo, Ruy Guerra e Geraldo Vandré, entre 1961 e 1965, até a Tropicália (Caetano Veloso diz que João Gilberto é seu maior ídolo), de 1967, passando pelo protesto de Chico Buarque, Milton Nascimento e outros.