Nos anos 1960, para uma parcela da juventude e da militância política de esquerda, pensar em luta armada como recurso para mudar a sociedade na direção do socialismo era uma opção real. Os governos ditatoriais capitalistas atuavam sem piedade com aqueles que se opunham a eles.
A crítica ferrenha ao capitalismo era completada pela crença de que o socialismo era um sistema que resolveria os problemas de injustiça social da humanidade. A violência, dizia parte da esquerda na época, era um mal necessário para libertar o homem da exploração pelo homem. Pela via das reformas políticas, a verdadeira transformação não aconteceria, uma vez que os capitalistas nunca iriam abrir mão de suas vantagens.
Além disso, as revoluções armadas contra governos considerados tirânicos, ilegítimos ou violentos contra a população sempre existiram ao longo da história. Não foi uma invenção da esquerda socialista. Antes da Revolução Francesa, populações inteiras já tinham se revoltado contra seus reis ou governantes. Países que eram submetidos à dominação de outros consideravam legítimo se rebelar para conquistar sua independência.
Nas chamadas “revoluções liberais”, que ameaçaram as monarquias no século XVIII, o direito à rebelião era considerado legítimo pela própria burguesia, até em nome da liberdade para fazer seus negócios, contra as amarras de um rei que queria controlar tudo. Nos movimentos de independência nacional, na América Latina, África e Ásia, apelou-se quase sempre para o levante armado contra as metrópoles europeias. Na primeira metade do século XX, a luta pelo socialismo e contra o nazifascismo também se fez através das armas, em nome da justiça social ou da liberdade.
No contexto da luta contra a ditadura militar no Brasil, golpistas e setores conservadores também apelavam para a violência armada contra movimentos sociais e grupos de oposição, mesmo que estes não utilizassem nem pregassem a violência. Portanto, na década de 1960, não só os jovens, mas também muitos líderes revolucionários mais maduros e politicamente experientes optaram pela luta armada para combater o capitalismo e as ditaduras. Eram convictos de que esse era o único caminho, era quase uma obrigação moral “pegar em armas” e ir para o combate.
As revoluções socialistas vitoriosas ao longo do século XX tinham fornecido modelos a serem seguidos. Os russos, que derrubaram o Czar através da ação dos Sovietes (conselhos) de operários, soldados e camponeses, capitalizada pelo Partido Bolchevique, centralizado e disciplinado. Os chineses, que fizeram sua revolução organizando um grande exército camponês que “liberava” regiões inteiras, implantando novas regras culturais, sociais e econômicas naquelas localidades, para depois chegar nas cidades e conquistar o Estado.
Os cubanos, que atuaram a partir de um grupo de revolucionários, cujos ícones foram Fidel Castro e Ernesto Che Guevara. Eles formavam um foco guerrilheiro e ganharam os corações e mentes dos cidadãos até derrubar o governo corrupto e tirânico de Fulgêncio Batista. E por fim, os vietnamitas, que lutaram pela independência nacional enfrentando com muita vitalidade os Estados Unidos, que tinham o melhor exército do mundo.
Parte da esquerda acreditava que a história estava do seu lado, e não podia ser detida pela força das armas. Os revolucionários que radicalizaram sua ação contra o capitalismo, na Europa e nas Américas dos anos 1960, pensavam assim. Eram apoiados por líderes mais experientes, vindos de partidos de esquerda diversos, de setores radicais da Igreja Católica, sensíveis à miséria humana causada pela exploração dos trabalhadores.
No Brasil, a vitória da Revolução Cubana de 1959, aliada à derrota da opção de reformas pela via pacífica, ensaiada pelo presidente João Goulart, parecia demonstrar que os militantes mais radicais da esquerda estavam certos. Era preciso pegar em armas para combater a ditadura e o “capitalismo selvagem” por ela protegido e estimulado.
O exemplo de Che Guevara, morto nas selvas da Bolívia em 1967, deveria ser seguido. Para muitos jovens nos anos 1960, atuar nas barricadas ou nas selvas, como revolucionário e guerrilheiro, mesmo correndo o risco de morrer, podia ser um ideal de vida. A vitória da revolução parecia possível. Mas a realidade no caso brasileiro foi bem diferente. O caminho para a revolução e para o socialismo era bem mais complicado, e a ditadura, mais forte e cruel do que muitos supunham.