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Passeata na cidade do Rio de Janeiro pela Anistia
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Abertura lenta e repressão contínua

Abertura lenta e repressão contínua

Conforme a periodização do regime militar brasileiro, os anos de chumbo, ou seja, os anos mais violentos da ditadura, coincidiram com o governo do general Emílio Garrastazu Médici (1969-1974). O governo do general Ernesto Geisel, que o sucedeu, é lembrado pela “abertura”.

Entretanto, o saldo do governo Geisel não possibilita falar em democratização ou sequer em “distensão”, pois durante seu governo houve 39 opositores desaparecidos e 42 mortos pela repressão. A censura à imprensa, às artes e ao lazer foi amplamente utilizada, abrandando-se somente em meados de 1976. O Congresso foi fechado durante 15 dias em 1977, com o governo impondo uma reforma constitucional pelo alto, mantendo as eleições indiretas para governadores de Estado e reformando o poder judiciário.

Como mencionado, a partir de 1976, Geisel adotou outra estratégia política, economizando a violência direta e abrindo novas possibilidades de legitimação institucional.

As promessas de distensão, o reconhecimento das eleições e o fim da censura prévia aos jornais podem parecer sinais de contradição do regime, mas, na verdade, revelam a estratégia da distensão, ao menos até meados de 1977. A estratégia consistia em abrir espaços institucionais e canais de diálogo com vozes seletivas e autorizadas, sem necessariamente abrandar a repressão à esquerda e aos movimentos sociais como um todo.

1975: um novo ciclo repressivo

Depois da surpreendente derrota eleitoral do partido do governo nas eleições legislativas de novembro de 1974, um novo ciclo repressivo foi instaurado no ano seguinte.

No começo de 1975, o ministro Armando Falcão anunciou a descoberta de uma gráfica clandestina do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Desde 1973, a “Operação Radar” vinha dizimando o PCB que, apesar de não ter aderido à luta armada, não foi poupado da repressão. Nesse ciclo repressivo, ocorreu a morte por tortura do respeitado jornalista Vladimir Herzog, após se apresentar voluntariamente ao DOI-Codi, ocasionando uma grande manifestação de descontentamento. A versão esdrúxula de suicídio, com uma foto plantada nos jornais, só revoltou a opinião pública. A Catedral da Sé, em São Paulo, foi o local do culto ecumênico pela morte de Herzog, celebrado por Dom Paulo Evaristo Arns, pelo Pastor Jaime Wright e pelo Rabino Henry Sobel, juntando uma multidão indignada que não se intimidou com o cerco policial no entorno da Catedral. O culto aconteceu sem nenhum confronto policial e nenhum ato de violência. A morte de Herzog passou a ser um marco do processo de redemocratização do país.

O presidente solicitou ao segundo comando do Exército que controlasse seus agentes. Mesmo assim, em janeiro de 1976, houve a morte do sindicalista Manoel Fiel Filho. O presidente, então, chegou à conclusão de que a linha de comando havia falhado. Naquele momento, vendo sua autoridade abalada, trocou sumariamente o comandante do Exército e nomeou o general Dilermando Gomes Monteiro, que atenuou o furor da repressão, submetendo-a à estratégia da “distensão” desenhada pelo governo Geisel.

A anistia aos presos políticos e o fim efetivo das prisões políticas ainda demorariam a se efetivar.

Terrorismo

Os porões da repressão continuaram ativos na era da “abertura”, passando à atividade terrorista. Em agosto de 1976, atentados da extrema direita contra a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) aprofundam a desconfiança dos liberais e da oposição como um todo na capacidade do governo em controlar a “linha dura”. A partir daí, uma sequência de atentados à bomba contra pessoas, órgãos da imprensa, livrarias, universidades e instituições identificadas com a oposição, marcaram a escalada de violência de direita que duraria até meados de 1981. Minas Gerais e Paraná concentraram os atentados de 1978. Entre abril e outubro daquele ano, foram 26 atentados e, entre julho de 1979 e abril de 1980, 25 atentados, conforme o jornal Em Tempo. O ano de 1980 concentrou o maior número de casos, começando pela bomba colocada no quarto de Leonel Brizola, recém-chegado do exílio, no Hotel Everest, no Rio de Janeiro.

Os atentados tinham intenção de criar pânico e enviar recados aos movimentos sociais e ao próprio governo, mas muitas vezes fizeram vítimas, algumas fatais ou seriamente feridas. Foi o caso das bombas enviadas à sede carioca da OAB, onde a secretária Lyda Monteiro veio a falecer, e à Câmara Municipal do Rio de Janeiro, onde o servente José Ribamar, atingido no atentado à Câmara, ficou cego e mutilado. Apesar da comoção pública, o governo Figueiredo pouco fez.

As bancas de jornal que vendiam veículos alternativos também foram alvos. Entre abril e setembro de 1980, dezenas de bancas em várias cidades brasileiras foram incendiadas durante a noite, provocando uma crise de distribuição dos jornais alternativos.

Os atentados à bomba continuaram em 1981, mas um acidente de trabalho expôs, involuntariamente, a base dos extremistas de direita. Na noite de 30 de abril de 1981, acontecia um show de MPB pelo 1º de maio. Enquanto milhares de jovens ouviam os artistas símbolo da oposição cultural ao regime, no estacionamento, dois homens preparavam um atentado à bomba. Conforme o plano, uma bomba deveria explodir na caixa de energia, cortando a luz do interior do pavilhão e a outra no estacionamento. Essas bombas deveriam causar pânico generalizado, pois no interior do pavilhão estavam 20 mil pessoas.

Depois de a primeira bomba explodir na caixa, mas sem conseguir cortar a luz interna, a segunda bomba explodiu dentro do carro, quando era preparada pelos dois extremistas. A polícia foi chamada. Não houve tempo de encobrir o caso, pois a imprensa chegou antes. Para surpresa, os dois homens que estavam preparando a bomba e foram atingidos dentro do carro eram agentes do DOI-Codi do Rio de Janeiro. O Exército teve que reconhecer a identidade dos dois agentes, mas o Inquérito Policial Militar chegou à conclusão de que integrantes da esquerda haviam colocado as bombas para matar os militares que estavam lá apenas para cumprir “missões rotineiras” de vigilância.

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