Refluxo do movimento estudantil
O Ato Institucional Nº 5 (AI-5), decretado em dezembro de 1968, foi um passo decisivo no endurecimento do regime militar e acabou por sufocar o movimento estudantil. Prisões, torturas e mortes se tornaram frequentes. Assim, a atuação política dos estudantes foi ficando cada vez mais inviável no país.
O AI-5 foi levado para dentro das escolas pelo Decreto-lei 477, que proibia, por três anos, a matrícula de 245 estudantes considerados subversivos e intimidou outros tantos. Os jovens organizados ofereciam uma grande ameaça à ditadura. Nesse período, o presidente da UNE, Jean Marc, foi preso e torturado no Centro de Informações da Marinha (Cenimar) e só foi libertado com outras 69 pessoas na troca pelo embaixador suíço sequestrado, em 1971, quando foi banido do país. Quem assumiu a presidência da entidade foi Honestino Guimarães, estudante de Geologia na Universidade de Brasília (UnB). Depois do AI-5, ele havia entrado para a clandestinidade e desde o início de 1969 vivia em São Paulo. Fazia parte da organização clandestina Ação Popular (AP) e já tinha sido preso algumas vezes desde que começara sua militância. Permaneceu como presidente interino da UNE até 1971, quando foi eleito presidente durante o congresso daquele ano, no Rio de Janeiro.
Em outubro de 1973, assim como Jean Marc, também foi preso por agentes do Cenimar, mas nunca mais foi visto. Honestino encontra-se até hoje na lista de desaparecidos políticos. Assim como ele, outros membros da diretoria foram presos e mortos nessa época. A possibilidade de atuação dos estudantes parecia ter se esgotado. Em 1973, a UNE resolveu suspender suas atividades por decisão de três diretores sobreviventes.
Nesse lamentável contexto, o movimento estudantil universitário buscou diferentes formas de atuação e de sobrevivência, a depender de cada realidade. Em muitos lugares, como na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), o Diretório Central dos Estudantes (DCE) e todos os centros acadêmicos (CA) foram fechados, restando aos estudantes somente as representações por turma. Na USP, o grande pilar do movimento durante esse tempo foi o Conselho dos Centros Acadêmicos.
Nesses anos de recrudescimento do regime militar, o movimento estudantil foi uma base de apoio à guerrilha urbana. Diversos militantes e líderes das entidades estudantis também faziam parte de grupos de luta armada como a Ação Popular , a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) e a Aliança Libertadora Nacional (ALN). Os estudantes continuaram sua luta de diversas formas, não apenas no movimento estudantil.
A repercussão da morte de Alexandre Vannucchi Leme
Era 1973 e, mesmo sob uma terrível repressão, os estudantes buscavam cautelosamente reorganizar suas entidades. Havia um grupo que buscava recompor o DCE da USP. Entre eles estava Alexandre Vannucchi Leme, conhecido como “Minhoca”, que cursava Geologia e era integrante do grupo de luta armada ALN. Ele foi preso, torturado e morto por agentes do DOI-Codi quando tinha apenas 22 anos. A versão oficial é de que morreu por atropelamento.
Sua morte teve enorme repercussão no país. Cerca de 5 mil pessoas, na maioria estudantes, compareceram à missa por sua morte sob tortura. Rezada por D. Paulo Evaristo Arns, foi a primeira manifestação de massas após o AI-5. Dias antes da missa, Gilberto Gil fez um show na Escola Politécnica da USP também em protesto contra o assassinato de Alexandre.
Shows e atividades culturais eram mais uma forma de expressão e protesto dos estudantes, não eram passeatas, mas eles estavam reunidos em protesto, ainda que de forma disfarçada, indireta. Nesse período, qualquer reunião era suspeita, por isso, os estudantes também aproveitavam os encontros anuais da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) para promover debates e fazer articulações clandestinas em nível nacional.
Em 1975, os estudantes começaram novamente a se articular e a organizar manifestações. Naquele ano, compareceram em grande número ao ato ecumênico na Catedral da Sé em memória do jornalista Vladimir Herzog, também assassinado no DOI-Codi paulista em outubro de 1975. Cerca de 8 mil pessoas estiveram lá, mesmo com a ostensiva presença da PM no entorno da catedral. Vários setores da sociedade estiveram presentes e o evento foi considerado um marco do início do processo de redemocratização.