Calcula-se que, no início do século XVI, época da chegada dos primeiros portugueses, a população indígena girava em torno de 5 milhões de pessoas, organizadas em mais de 2 mil povos, no território onde hoje se encontram os limites do Brasil. Na década de 1960, o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), órgão oficial do governo federal, estimou essa população em menos de 100 mil pessoas. Os dados mostram uma realidade inegável: houve um violento processo que por pouco não fez os indígenas desaparecerem do mapa.
Durante esses quase cinco séculos desde os primeiros contatos, as relações entre Estado, colonizadores e povos nativos resultaram em inúmeros conflitos, que não raro produziram genocídios, articulando expropriação de terras, confinamento e matanças sistemáticas. Sob a força da espada ou contaminadas por doenças, diversas sociedades, culturas, línguas e religiões que aqui existiam há centenas de milhares de anos foram completamente dizimadas.
A violência utilizada para colonizar o território brasileiro foi a base para garantir os ciclos econômicos de extração de recursos naturais, monoculturas e expansão da fronteira agrícola. Os indígenas tiveram suas terras roubadas pelos colonos, e foram utilizados como mão de obra escrava durante o período colonial, sobretudo nas regiões mais pobres, como a de São Paulo.
O Exército Brasileiro, na figura do marechal Cândido Rondon, foi um dos protagonistas históricos da política indigenista no país. Rondon era diretor do Serviço de Proteção ao Índio (SPI), cuja função, em princípio, era garantir a sobrevivência das populações indígenas remanescentes, incluindo a prestação de serviços básicos de saúde. Mas havia também outros objetivos: integrar os índios ao Estado-Nação, evitar que eles se percebessem como “não-brasileiros” e pacificar as tribos hostis ao contato com os “brancos”. Era uma mistura de política assistencialista com uma política de aculturação progressiva. Protegia-se, eventualmente, o indivíduo, mas matava-se, pouco a pouco, sua cultura.
Nos anos 1940 e 1950, antropólogos e sertanistas atuaram na criação de grandes reservas indígenas, como forma de proteger os povos originários das violências e regulamentar o uso de suas terras pelas várias etnias e povos. A Expedição Roncador-Xingu, liderada pelos irmãos Villas Boas nos anos 1940, culminou na criação do Parque Nacional do Xingu, em 1961. A história do mais famoso parque indígena do país expressa os dilemas e as contradições da política indigenista do Estado brasileiro. Em seus formuladores, notava-se uma mistura de autoritarismo e paternalismo. Ao mesmo tempo em que visava “proteger” o indígena do contato predatório com os brancos, preparava uma política de pacificação e confinamento dos povos indígenas, para abrir caminho para a interiorização do desenvolvimento capitalista.