O primeiro governo militar, do general Castelo Branco, priorizou as relações com os Estados Unidos, país pioneiro na implementação do novo regime. O dinheiro americano voltou a entrar no país, mas como contrapartida o Brasil teve que se engajar na luta contra o movimento comunista na América Latina, por exemplo, enviando soldados para intervir na República Dominicana, com o objetivo de afastar um governo nacionalista que desagradava Washington.
A América Latina ocupava naquele momento o primeiro plano da Guerra Fria, ao lado da África e da Ásia. O sonho de libertação dos países subdesenvolvidos, chamados de Terceiro Mundo, prometia um novo tipo de socialismo no qual o colonialismo e o imperialismo dos países capitalistas seria banido, e a miséria social seria superada pela distribuição das riquezas. Ernesto Che Guevara, um dos líderes da Revolução Cubana, que tinha se comprometido a espalhar a revolução pelo Terceiro Mundo, encarnava o ideal do guerrilheiro internacionalista. Sua morte nas selvas bolivianas, em outubro de 1967, abandonado pelos pobres que prometia libertar, não diminuiu em nada sua influência ideológica. O guevarismo, ou seja, a crença de que a ação do revolucionário organizado num foco guerrilheiro é suficiente para iniciar a revolução socialista, influenciou vários grupos armados na América Latina. Mas enquanto a esquerda sonhava com a revolução, a direita se armava e dominava cada vez mais os governos da região.
A ditadura brasileira aos poucos se consolidou e se institucionalizou, servindo de modelo a outros governos autoritários e anticomunistas latino-americanos. Embora o governo do general Costa e Silva defendesse oficialmente o princípio de não intervenção e o respeito à soberania dos povos, a ditadura brasileira trabalhou incessantemente para impedir experiências de esquerda nos países vizinhos. O principal temor era de que o sucesso da revolução e de governos de esquerda perto das fronteiras brasileiras pudesse estimular os grupos armados que já atuavam no país.
O governo Médici ofereceu aos opositores do general Juan José Torres, militar de esquerda à frente do governo na Bolívia, armas, aviões, e até mercenários, além da permissão de instalação de áreas de treinamento militar em locais próximos à fronteira. O Brasil deu apoio logístico ao golpe de Estado contra Torres, liderado pelo general Hugo Banzer. Depois, o regime militar se preparou para intervir no Uruguai, devido à possibilidade de o general Liber Seregni, candidato da Frente Ampla, formada por partidos de esquerda e centro-esquerda, ganhar a eleição. A vitória não veio, mas o governo brasileiro continuou a colaborar com o combate às organizações de esquerda, como os Tupamaros, e enviou ao exército uruguaio caminhões e carros como suporte ao golpe de 1973.
No mesmo ano, o Brasil apoiou decisivamente a deposição do presidente socialista chileno, Salvador Allende, pelo general Augusto Pinochet, em 11 de setembro. Após o golpe, o governo brasileiro reconheceu imediatamente o novo regime e passou a enviar, em aviões da Força Aérea Brasileira (FAB), mantimentos, remédios e, inclusive, oficiais das Forças Armadas, que treinaram os colegas chilenos nas técnicas de tortura.
Em 1976, com o golpe de Estado na Argentina, em nome da segurança nacional e da luta contra a “subversão comunista”, todo o Cone Sul estava dominado por ditaduras militares. Esses regimes autoritários eram vistos, por parte das elites econômicas nacionais e internacionais, como a única forma de conter o avanço comunista no continente. Nessa ótica, para se manter a liberdade de negócios, era preciso abrir mão das liberdades políticas. Contraditoriamente, para ter segurança nacional era necessário o terror de Estado, à base de sequestros, desaparecimentos e mortes de opositores. Para se manter uma democracia no futuro, era preciso uma ditadura no presente.