Paralelamente à criação da CNV, constituiu-se pelo Brasil afora uma verdadeira rede de cooperação para construção de memória, verdade e justiça. Em um país com as dimensões do nosso, a cooperação e a disseminação das comissões estaduais, municipais, universitárias e setoriais têm possibilitado a multiplicação de esforços que complementam e potencializam os trabalhos realizados pela CNV. Elas são mais de 120 espalhadas pelo território nacional. Algumas comissões – legislativas, estaduais, municipais, setoriais, de grupos e instituições específicas – realizaram importantes trabalhos e articulações.
São alguns dos exemplos de comissões estaduais a Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva (CEV – SP), a Comissão da Verdade do Rio (CEV – Rio) e a Comissão da Verdade do Rio Grande do Sul. Além de somar contribuições ao trabalho da CNV, tais comissões também puderam expandir suas coletas de testemunhos e investigações locais. Outras comissões que abordam a violação a grupos específicos, como a Comissão Camponesa da Verdade e a Comissão da Verdade da Escravidão, têm sido igualmente importantes para a constituição de verdade, memória e justiça em relação a grupos sociais marginalizados na história brasileira.
A instalação de comissões vinculadas aos municípios, como a Comissão Municipal da Verdade Vladimir Herzog, em 2012, a Comissão da Memória e Verdade da Prefeitura de São Paulo, em 2014, ou ligadas a instituições específicas, como a da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro, e a de universidades, como as da PUC-SP, da USP, da UNESP, da UNIFESP, e da UNICAMP, têm sido importante para a investigação das violações e das violências específicas que ocorreram por meio, ou no interior dessas instituições. O papel desempenhado pelas reitorias universitárias, os serviços funerários e os institutos médicos legais, entre outros órgãos da máquina opressora da ditadura, começam a vir à tona.
Um exemplo mais recente de organismo constituído para dar continuidade aos trabalhos da CNV é o Grupo de Trabalho “Ditadura e Repressão aos Trabalhadores e Trabalhadoras e o Movimento Sindical” criado, em março de 2016, pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social, pela Portaria n° 517 e que começou seus trabalhos em novembro de 2016.
As Comissões pós-ditadura
Ao lado das diversas comissões empenhadas em investigar os crimes cometidos na ditadura, surgiram aquelas que acompanham de perto as violações dos direitos humanos praticadas pelo Estado no período pós-ditadura. Essas comissões específicas têm cumprido um papel fundamental na expansão da luta por memória, verdade e justiça, reconhecendo que violações de direitos humanos praticadas pelo Estado seguem ocorrendo no período democrático.
Uma experiência pioneira foi a Comissão da Verdade da Democracia Mães de Maio (CVDMM). Resultado de solicitação do movimento Mães de Maio e da ação e construção de diversos movimentos sociais, a CVDMM foi criada em maio de 2014, pelo deputado Adriano Diogo, como uma subcomissão da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de São Paulo. Outro exemplo é o da Subcomissão da Verdade dos Tempos da Democracia – Mães de Acari, proposta pelo deputado Marcelo Freixo e instalada, em dezembro de 2015, na Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Ambas denunciam a permanência de práticas, desenvolvidas por instituições, e de legislações repressivas que continuam a violar os direitos humanos no presente. Também exigem modificações profundas e radicais no funcionamento do Estado, para que uma verdadeira transição democrática aconteça.