Até outubro de 1948, a nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) não passava de um anteprojeto que dormitava nas gavetas da presidência da República. Quando finalmente o presidente Dutra decidiu enviá-lo ao Congresso, os parlamentares não lhe deram atenção. Somente nove anos mais tarde, em dezembro de 1957, a LDB entrou na ordem do dia com a apresentação de um projeto substitutivo ao que havia sido encaminhado pelo presidente, de autoria do deputado liberal Carlos Lacerda, da UDN (União Democrática Nacional).
Começava aí uma intensa movimentação entre intelectuais, estudantes universitários, políticos e movimentos sociais em torno das diretrizes e bases da educação, que teve como ápice a Campanha em Defesa da Escola Pública, liderada por educadores, como Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo, Laerte Ramos de Carvalho, Roque Spencer Maciel de Barros e Florestan Fernandes.
Mobilizado em escolas, pelos jornais, junto aos deputados e em caravanas populares pelo país, o movimento levantou-se contra o caráter privatista do projeto de Lacerda, que atendia aos interesses de grupos confessionais e empresariais. Entre várias ações, em 1959 os intelectuais fizeram circular o manifesto “Mais uma vez convocados”, em referência à continuidade do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, de 1932. Nele, defendiam a escola pública gratuita e laica, como fator indispensável para a construção da sociedade democrática. Refutavam a acusação de que desejassem o “monopólio do ensino” pelo Estado e denunciavam que o termo “liberdade do ensino” escondia o desejo dos empresários pela “liberdade de comerciar à custa do ensino”.
Apesar das fortes mobilizações contrárias, o projeto de Carlos Lacerda foi vitorioso sem maiores alterações, firmando-se a LDB 4.024/61 e consagrando os interesses privatistas. Entre suas disposições, a lei declarou a educação como direito do cidadão, mas não assumiu o compromisso de provê-la a todos. Além disso, favoreceu a iniciativa privada por meio de subvenções e financiamento para a construção, reforma e aquisição de equipamentos para escolas.
Ignorando as pautas dos estudantes para a reforma do ensino superior, a lei estabeleceu como diretrizes a flexibilização dos cursos, a previsão de instalação de institutos de pesquisa, a autonomia universitária, a constituição das universidades públicas como autarquias ou fundações e das particulares como fundações ou associações.
O presidente João Goulart vetou parcialmente a lei, com destaque para dispositivos que considerava “inconstitucionais ou contrários aos interesses nacionais”. Os vetos de Jango deixavam claro, em especial, sua preocupação com as possíveis consequências negativas da aplicação da lei. Por exemplo, a que obrigaria as professoras do ensino primário a prestar exames para a aferição de suas competências.
O presidente Jango observou que a imposição do exame afastaria do magistério “as pessoas que não alcançam os níveis desejáveis de qualificação, mas são, muitas vezes, as únicas disponíveis”, levando ao agravamento do já deficiente atendimento do ensino primário. Em lugar de um exame de “qualificação”, sugeria a realização de programas de formação continuada do magistério em exercício, a elaboração e difusão de materiais de ensino, guias e instruções para apoiar a docência dos “professores improvisados”.