Historicamente, as escolas tradicionais brasileiras eram instituições conservadoras, que ensinavam a disciplina, a moral e a obediência. Nas décadas anteriores ao golpe, o debate sobre as finalidades filosóficas e éticas da educação havia gerado pedagogias alternativas. Todas elas, porém, foram rapidamente banidas do cenário educacional, na medida em que o autoritarismo do regime militar se apoderou das escolas. A pedagogia de Paulo Freire, por exemplo, que entendia a educação como um caminho para a emancipação social, foi imediatamente proibida.
Paulo Freire e aqueles que atuavam nos movimentos de alfabetização popular foram duramente perseguidos, e todas as ditaduras da América Latina tiveram essa preocupação. No Paraguai, por exemplo, o educador Martim Almada, que defendia as ideias de Freire, foi acusado de “terrorismo intelectual”.
Enquanto Paulo Freire falava em protagonismo popular e estudantil, a ditadura estimulava a autoridade inconteste do professor, uma figura que muitas vezes inspirava medo em seus alunos. Além disso, as direções escolares eram nomeadas pelos políticos locais, reforçando o controle ideológico sobre currículos e a vigilância contra professores.
No cotidiano das escolas, persistiam as práticas de violência física contra os alunos e uma série de outras arbitrariedades, como notas por “comportamento”, avaliações a partir de questionários decorados, “pontos extras” para alunos que participassem de atividades como o desfile cívico de 7 de setembro, além do estímulo à competição e à fiscalização entre os próprios alunos.
A entoação do hino e o hasteamento da bandeira tornaram-se obrigatórios. Nas escolas públicas e particulares, reproduzia-se uma ritualística militar desprovida de sentido para muitos jovens. Pelo menos uma vez por semana, crianças e adolescentes eram obrigados a marchar como soldados, bater continência e louvar um símbolo pátrio.
Muitas dessas práticas tornaram-se tão difundidas e naturalizadas, que permanecem até os dias atuais. Não é raro encontrarmos escolas que “incentivam” a participação estudantil nos desfiles de 7 de setembro por meio de aumentos nas notas. Da mesma forma, a distribuição de “pontos positivos” ou “negativos” por comportamento dos alunos ocupa parte quase inquestionável da cultura escolar brasileira.
Sem sombra de dúvida, toda a estrutura escolar redesenhada pelo regime ditatorial contribuiu para desestimular o senso crítico e inculcar valores como obediência, respeito à hierarquia e uma brutal domesticação dos corpos. Ao iniciarem os estudos, aos sete anos, as crianças eram obrigadas a conter a energia e a curiosidade próprias da infância. Deviam aprender a ficar quietas, caladas e sentadas. Paralelamente, os ideólogos do regime militar desenvolveram conteúdos legitimadores do regime, tais como as disciplinas de Educação Moral e Cívica (EMC) e de Organização Social e Política do Brasil (OSPB).