As políticas de memória e verdade no Brasil têm enfrentado avanços e retrocessos ao longo do tempo, dependendo do contexto político. Entre 2019 e 2022, houve uma série de medidas que impactaram negativamente essas políticas, como a descontinuidade dos trabalhos da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) e o elevado número de indeferimentos na Comissão de Anistia. Esse período também foi marcado por um enfraquecimento institucional das estruturas voltadas aos direitos humanos em geral.
A partir de 2023, com a reorganização do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, algumas dessas políticas passaram por reestruturações. A CEMDP foi recriada, e a Comissão de Anistia passou a adotar práticas inéditas, como o reconhecimento de anistias políticas coletivas. Entre os grupos reconhecidos estão os Povos Indígenas Guarani-Kaiowá e Krenak, comunidades camponesas e moradores de favelas. Foi também criada uma Assessoria Especial voltada à promoção da democracia, memória e verdade, com uma coordenação dedicada às Políticas de Memória e Verdade.
Nos últimos anos, a discussão sobre os lugares de memória passou a ganhar destaque e tem recebido atenção crescente da sociedade, que tem pleiteado a memorialização de inúmeros espaços, desenvolvido pesquisas e ações em a respeito da memória desses lugares. Um exemplo recente é a inclusão de uma seção específica sobre “Memória e Verdade” na plataforma do Observatório Nacional de Direitos Humanos (ObservaDH), que disponibiliza um mapa com locais relacionados à ditadura em todo o país, além de informações sobre a memória negra e africana no Brasil.
Nos últimos anos, o conceito de lugar de memória da ditadura no Brasil tem se ampliado. Já não se fala apenas dos espaços da repressão, mas também dos lugares da resistência: escolas, igrejas, sedes de movimentos sociais, espaços culturais, sindicatos, universidades, lugares de manifestação, terras indígenas e tantos outros onde pessoas se organizaram para se opor e lutar contra a ditadura. Esses lugares também precisam ser lembrados — porque contar a história da repressão sem contar a história da resistência é manter a narrativa do poder.
Além disso, cresce o reconhecimento de que a violência da ditadura afetou de formas diferentes os mais diversos grupos sociais. Povos indígenas, comunidades quilombolas, populações do campo, moradores das periferias urbanas, comunidade LGBTQIA+, dentre outros também foram duramente atingidos, muitas vezes de forma invisível. Hoje, há iniciativas para reconhecer os impactos da ditadura a esses territórios, comunidades e indivíduos, inclusive por meio do mapeamento participativo e da escuta das comunidades.
A preservação desses lugares é parte de um compromisso mais amplo com a democracia. Não se trata apenas de olhar para trás, mas de usar o passado como instrumento para transformar o presente e construir o futuro. Cada prédio, parede, documento, árvore ou pedaço de chão que carrega essa história tem o potencial de nos lembrar que os Direitos Humanos e a Democracia precisam ser defendidos todos os dias.
Lembrar é um ato político. Preservar a memória é uma forma de resistir. Por isso, os lugares de memória da ditadura não são apenas locais de lembrança: são espaços vivos de luta, reflexão e construção de um país mais justo.