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Mecanismos e Comitês de Prevenção à Tortura

Mecanismos e Comitês de Prevenção à Tortura

A recomendação se refere a uma ferramenta bastante específica e inovadora no campo dos direitos humanos, que são os Mecanismos Nacionais de Prevenção à Tortura (MNP), previstos no Protocolo Facultativo à Convenção Contra a Tortura da ONU (OPCAT). Os Mecanismos são organismos do Estado cuja missão primordial é monitorar espaços de privação de liberdade e produzir recomendações ao Estado, no sentido de erradicar a tortura. Até 2016, ao menos 83 países assinaram OPCAT e 64 designaram MNPs.

Os Mecanismos partem do entendimento de que as pessoas privadas de liberdade encontram-se em especial situação de vulnerabilidade, estando assim mais suscetíveis a serem torturadas. Desta forma, o trabalho que desenvolvem tem foco em monitorar o que ocorre dentro dessas instituições. Para tanto, entende-se como espaços de privação de liberdade qualquer estabelecimento em que se detenham pessoas, qualquer que seja a forma ou fundamento de detenção, aprisionamento, contenção ou colocação em estabelecimento público ou privado de controle, vigilância, internação, abrigo ou tratamento. Portanto, os MNPs podem inspecionar, a qualquer momento e sem aviso prévio, presídios, delegacias, unidades socioeducativas (para jovens em conflito com a lei), hospitais, hospitais psiquiátricos, abrigos, comunidades terapêuticas (centros de tratamento para dependentes químicos, com viés religioso) e, até mesmo camburões, os chamados caveirões e os blindados da polícia, entre outros exemplos onde pessoas estejam temporária ou permanentemente privadas de sua liberdade. Acima de tudo, esse é um trabalho que busca tirar da invisibilidade o que acontece dentro desses estabelecimentos.

O Brasil ratificou o OPCAT em 2007, assumindo diante da comunidade internacional o compromisso de criar Mecanismos Nacionais de Prevenção. No entanto, aprovação da Lei nº 12.847, que institui o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, se deu apenas em 2013 e o órgão passou a atuar efetivamente apenas em 2015. Portanto, no momento em que a CNV propôs tal recomendação, o Mecanismo Nacional ainda não estava em funcionamento.

Existem outros dois mecanismos que funcionam em âmbito estadual no Brasil. No Rio de Janeiro, um Mecanismo vinculado à Assembleia Legislativa foi criado em 2011, pela Lei Estadual n.º 5.778/10. Em Pernambuco, um Mecanismo vinculado ao governo do estado foi criado em 2014, pela Lei Estadual n.º 14.863. Todos eles seguem os parâmetros estabelecidos pelo OPCAT, de modo a realizar visitas regulares de monitoramento, estabelecer um amplo diálogo cooperativo por direitos humanos e conduzir um trabalho em rede, inserido em um sistema internacional de prevenção à tortura.

Três eixos de trabalho dos Mecanismos

As Visitas Regulares de Monitoramento são o propósito fundamental dos Mecanismos. É através das inspeções aos espaços de privação que se faz a “identificação do risco de tortura”, seguindo guias e práticas internacionais sobre monitoramento de espaços de detenção. A partir das inspeções, são produzidos relatórios circunstanciados para ouvir diversos profissionais, agentes, diretores e pessoas privadas de liberdade em determinado estabelecimento. Após identificar as condições de privação de liberdade, os relatórios oferecem recomendações às autoridades públicas, destinadas à prevenção e combate à tortura e outros tratamentos como penas cruéis, desumanas e degradantes. O Mecanismo Nacional publica seus relatórios de visitas de monitoramento em plataforma disponível online e podem ser acessados por qualquer pessoa.

Os Mecanismos cumprem também o papel de estabelecer um diálogo institucional e cooperativo por direitos humanos, com intuito de manter uma relação construtiva com autoridades públicas, com vistas a transformar a atual realidade de violência institucional dentro desses espaços. Para tanto, os Mecanismos podem se valer de reuniões, seminários, debates, audiências públicas, propostas legislativas e relatórios temáticos sobre os principais desafios para o enfrentamento à tortura. O Mecanismo do Rio de Janeiro, por exemplo, lançou em setembro de 2016 um relatório temático sobre presos provisórios, denominado “Quando a liberdade é exceção: a situação das pessoas presas sem condenação no Rio de Janeiro”. Em 2023 publicou o Mapeamento Nacional da Implementação de Mecanismos e Comitês de Prevenção e Combate à Tortura, documento nascido de uma articulação entre os Mecanismos de Prevenção e Combate à Tortura do Brasil em 2022, quando da visita do Subcomitê de Prevenção à Tortura da ONU (SPT) ao país.

A atuação dos Mecanismos não se dá de maneira isolada. Ao ratificar o OPCAT, os Estados passam a integrar um Sistema Internacional de Prevenção e Combate à Tortura. O sistema funciona como uma rede que, composta pelo Subcomitê da ONU contra a Tortura (SPT) e pelos Mecanismos Nacionais de diversos países, trocam informações e denúncias colhidas em inspeções a locais de privação de liberdade. No Brasil esse fenômeno ganha uma dimensão especial, visto que em âmbito nacional e estadual, a criação de Mecanismos tem se dado em conjunto com a criação de Comitês de Prevenção à Tortura. Esse modelo pode favorecer o protagonismo da sociedade civil no enfrentamento à tortura e o engajamento dos órgãos de controle do sistema de justiça. A articulação entre Mecanismos e Comitês tem potencializado esse trabalho no Brasil. Os Comitês são compostos de maneira paritária entre organizações de Estado e organizações da sociedade civil.

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